segunda-feira, 17 de julho de 2023

A Batalha de Adrianópolis





A Segunda Batalha de Adrianópolis (atualmente Edirne na Turquia) foi travada entre os romanos liderados pelo imperador Valente e tribos germânicas, em agosto de 378, em que os romanos saíram derrotados. Foi uma estrondosa derrota em que o próprio imperador Valente perdeu a vida numa província romana semiárida do Oriente, na Trácia. Este acontecimento encorajou os godos mais tarde, em 410, a saquearem Roma, prenunciando o colapso final do Império Romano do Ocidente.

Muitos historiadores concordam que boa parte da culpa pela trágica derrota se deveu à má liderança do imperador Valente, e não à inépcia do exército romano. Em sua História Romana, o historiador do século IV d.C. Amiano Marcelino disse: "Os anais não registam outro massacre em batalha como esse, à exceção daquele em Canas, embora mais de uma vez os romanos, enganados pelos ventos adversos da fortuna, tenham adentrado numa época de insucessos nas suas guerras...".

As hostilidades entre os godos e os romanos começaram de maneira bem inofensiva. À medida que os hunos se moviam pela Ásia em direção a Oeste causando destruição, os visigodos, que somavam mais de 200.000 indivíduos, saíram do atual território da Ucrânia em direção à fronteira do Império Romano e, em 376 d.C., cruzaram o rio Danúbio e se estabeleceram na Trácia. Como os hunos continuaram a avançar, as lideranças godas e romanas fizeram uma aliança, de modo que às tribos fosse, enfim, dada a permissão de aí se estabelecerem permanentemente. Era uma aliança impopular entre muitos romanos. No entanto, a permissão foi dada com uma condição: em troca de terras e provisões, os godos comprometiam-se a enviar soldados ao exército romano. Outras exigências foram feitas logo depois por inescrupulosos comandantes romanos (Lupicino e Máximo): enviar as crianças para trabalharem como escravos e entregar todas as armas.

Encarando as provisões inadequadas que levou à fome generalizada, os godos se insurgiram contra os romanos. Após a malograda tentativa de assassinar os líderes godos Fritigerno e Alavivo, o dito Fritigerno e seus companheiros tervíngios entregaram-se a pilhar os campos. Conforme as incursões continuavam, os romanos e os godos acabaram por se enfrentar na Batalha de Marcianópolis em 376 d.C. e na Batalha Ad Salices (ou Batalha dos Salgueiros) em 377 d.C. Em 378 d.C., os contínuos reveses se mostraram demasiado embaraçosos para os líderes romanos, em especial para o imperador Valente, que estava envolvido em batalhas mais a leste contra os persas. Porém, quando os godos se aproximaram de Constantinopla, Valente atendeu aos apelos desesperados dos seus cidadãos regressando à cidade para marchar contra Fritigerno.

A derrota em Adrianópolis viria a ser o capítulo final de um reinado turbulento. Em 364 d.C., o imperador romano Valentiniano I (r. 364-375 d.C.) havia indicado o seu irmão mais novo para ser imperador em dueto, e governar o Oriente em Constantinopla. A impopularidade de Valente advinha, sobretudo, do seu apoio aos cristãos arianos que enfureceu tanto os não cristãos como os cristãos tradicionais. Com a morte de Valentiniano em 375 d.C., quem lhe sucedeu foi Graciano, seu filho com 16 anos de idade. Embora fosse considerado de início muito jovem e inexperiente, Graciano provaria ser um líder hábil e, ao lado de hábeis comandantes, obteve considerável sucesso na Gália. Infelizmente para Valente, ele não conseguira enviar ajuda contra os godos em Adrianópolis.

Assim, convergiram para a derrota vários fatores entre os quais: baixo moral - o exército romano estava cansado, faminto e sedento quando chegou a Adrianópolis; reconhecimento insuficiente e inadequado - Valente não tinha qualquer apetência para avaliar o potencial dos 10.000 cavaleiros que se juntariam depois a Fritigerno; a inadequadamente treinada cavalaria romana - a cavalaria romana realizou uma série de ataques desorganizados e malogrados contra os godos. Esses ataques malogrados deixaram o flanco esquerdo romano desprotegido. Quando Fritigerno e seus homens atacaram os romanos pela frente e pelo lado, o caos se instalou. Os esmagadores números das forças dos godos fizeram com que os soldados romanos fugissem do campo de batalha. Valente foi deixado sozinho com apenas um punhado de homens; seu corpo jamais foi encontrado.

Em 382 d.C., o imperador Teodósio I e os godos acordaram a paz por meio de uma aliança que garantia terras em troca de soldados para servirem no exército romano. A derrota em Adrianópolis demonstrou a fraqueza militar dos romanos, de modo que nas décadas seguintes o Império Romano Ocidental prosseguiu numa espiral descendente até que Alarico, líder visigodo e ex-comandante romano, viu que tinha o caminho aberto para saquear Roma em 410 d.C. O último imperador do Ocidente, Rómulo Augusto, abriu mão do trono em 476 d.C. Mas o Império Oriental persistiu até ser tomado pelos turcos otomanos em 1453.

A partir do século III em diante Roma foi declinando lenta e progressivamente, de modo que o ano de 476 representa o epílogo de uma morte anunciada confirmada pelo último imperador ocidental, Rómulo Augusto. Para o dia-a-dia da maioria da população o evento em si teve pouco impacto. Os imperadores vinham perdendo o seu poder real. Este acontecimento do lado ocidental do império não pode ser o verdadeiro acontecimento responsável pelas grandes transformações que se verificaram no Império Romano a partir dessa data. Roma é saqueada pelos godos em 410 d.C., guerreiros germânicos que já tinham entrado no exército romano. De modo que o contexto era mais de uma guerra civil do que de uma invasão estrangeira. Durante o século V, as províncias ocidentais do império, como, por exemplo, a Britânia, já haviam seguido o seu próprio rumo. Ou foram invadidas e transformadas em reinos liderados por chefes guerreiros germânicos, muitos dos quais que tinham estado ao serviço de Roma. Dessa forma, foi assim que: os visigodos tomaram conta da Hispânia; os francos da Gália; os ostrogodos da Itália; os vândalos da Sicília e do Norte de África. Enquanto o Império Romano do Ocidente ruía, o do Oriente continuava com a sua capital em Constantinopla a administrar um território que incluía os Bálcãs, a Grécia, a Ásia Menor, o Egito e a Síria. De diversas maneiras, passava a ser uma unidade mais coerente.

O Império Romano do Oriente (normalmente chamado, pela convenção moderna, de Império Bizantino) veio a ter de novo a estabilidade política que faltara durante muito tempo. Por volta do século VI era raro que um imperador comandasse em pessoa uma campanha, e sua preocupação em outorgar o comando de seus exércitos a outros é uma indicação da maior segurança pessoal de que gozavam. As atividades dos generais eram observadas de perto em busca do menor sinal de deslealdade. Os imperadores orientais eram capazes de conduzir ativamente a guerra em mais de um palco simultaneamente, de uma maneira que dificilmente fora possível durante séculos.

Os recursos militares disponíveis tinham diminuído, mas ainda eram consideráveis. Em termos de território, o Império do Oriente era mais ou menos equivalente ao seu maior rival, a Pérsia sassânida, embora os romanos – pois era assim que os bizantinos se viam e se chamavam – fossem mais populosos e provavelmente mais ricos. A redução do seu território alterou a atitude dos imperadores romanos em relação ao mundo exterior, e havia certamente uma tendência a dirigirem-se ao rei persa como um igual. Tal disposição fazia contraste marcante com a diplomacia de séculos anteriores, a qual sempre buscara enfatizar a enorme superioridade de Roma sobre as outras nações. Contudo, pelo menos alguns imperadores orientais continuaram a nutrir a ambição de reviver o antigo poderio do império, e, durante o reinado de Justiniano (527-565 d.C.), um esforço concentrado foi feito no sentido de reconquistar os territórios perdidos no Mediterrâneo ocidental. O Norte de África, a Sicília e a Itália foram reconquistados numa série de campanhas, embora tais conquistas não tenham sido duradouras. Um dos comandantes mais proeminentes dessas operações foi Belisário, que teve a sua primeira experiência como general nas guerras da fronteira oriental.

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