quinta-feira, 18 de abril de 2024

O furor nos tempos da depressão entre as duas grandes guerras


Tal como nos anos 20 e 30 do século XX, poucas pessoas do dito “povo” se preocupam. Naquele tempo, em toda a Europa, bares, estádios de futebol, salões de baile e cinemas ficavam apinhados. Ainda se fazia a catarse da Depressão, da Guerra de 14-18, e da pandemia da gripe pneumónica. As pessoas procuravam aquilo que fizesse a vida valer a pena. Queriam divertir, procurando o que pudesse tornar a sua existência mais tolerável.




O que as pessoas mais queriam era entretenimento, e não intelectuais com palavreado a saber a “alta cultura”. A disseminação do entretenimento de massas já tinha feito enormes progressos durante a década de 1920, mas ainda não era o grande negócio que se tornaria em breve. Os progressos tecnológicos foram uma das principais causas, com a rádio e os discos de música no topo da moda. Milhões de pessoas, no mesmo instante, na sua privacidade, ouviam os seus artistas prediletos.

A maior parte dos impulsos e das inovações vinha dos Estados Unidos. O país representava tudo o que era novo, vibrante e excitante para milhões, sobretudo para os jovens da Europa Ocidental. A música popular e o cinema eram as forças mais dinâmicas. A Inglaterra, tendo a mesma língua e fortes laços culturais com os Estados Unidos, era mais aberta que qualquer outro país à influência americana (ainda que na década de 1930 tenham sido impostas barreiras para evitar que músicos britânicos ficassem sem trabalho, substituídos por talentos americanos importados). Os jovens se apressavam a abraçar as novidades. Tentativas de deter a maré estavam fadadas ao fracasso. O consumismo em expansão acarretou uma demanda insaciável por tudo o que os novos meios de comunicação cultural tinham a oferecer.




Com a amplificação, os cantores já não precisavam ter vozes poderosas. Podiam empunhar o microfone em vez de projetar a voz à distância e obter um som muito melhor do que poucos anos antes. O primeiro da música popular, cuja fama cruzou o Atlântico na década de 1930, foi Bing Crosby. O mesmo ocorreu com Frank Sinatra poucos anos depois. Cantores europeus também ganharam enorme popularidade, que na maior parte das vezes se limitava a seu próprio país. As cantoras também ganharam renome em seus próprios países e às vezes fora deles. Édith Piaf, “o pequeno pardal”, que começou a trilhar o caminho do estrelato em meados da década de 1930, em poucos anos era a mais conhecida artista popular da França (e, nos anos seguintes, uma celebridade internacional).




A guerra e a rádio como entretenimento para os soldados produziram suas próprias estrelas. Vera Lynn, já bem conhecida, no fim da década de 1930, pela rádio e por seus discos, como vocalista de algumas das mais conhecidas orquestras dançantes da Inglaterra, foi apelidada de “Namorada das Forças Armadas”. Dificilmente se encontraria um soldado britânico que não conhecesse seu maior sucesso, “We’ll Meet Again”, música em perfeita sintonia com a época. “Lili Marlene”, na voz de Lale Andersen, embora não apreciada pelos oficiais nazis, tornou-se a favorita da Wehrmacht e, extraordinariamente, cruzou as linhas e tornou-se sucesso também entre os soldados Aliados na versão em inglês, cantada por Marlene Dietrich.




O novo som das big bands nasceu também nos Estados Unidos, com o sucesso da Paul Whiteman Orchestra na década de 1920 (dando a Bing Crosby a sua primeira grande oportunidade como cantor). Havia também algumas bandas importantes integradas por músicos negros, como a de Fletcher Henderson. Mas os negros ainda eram discriminados no mercado. Alguns dos maiores intérpretes de jazz, como o trompetista Louis Armstrong, que ganhou fama com as bandas Hot Five e Hot Seven, na década de 1920, adaptaram-se às novas tendências e tornaram-se astros das novas bandas antes de ter as suas próprias. Na década de 1930, quando o sucesso que fazia em seu próprio país, embora digno de nota, ainda era limitado pelo preconceito racial, que vedava aos artistas negros os contratos mais polpudos, Armstrong conquistou grande aclamação popular na Europa.




Duke Ellington, o mais complexo e inovador de todos os primeiros “reis do jazz”, viveu algo parecido quando sua banda tocou no London Palladium, em 1933 — “os aplausos foram magníficos, era aplauso em cima de aplauso”, comentou ele. Seis anos depois, sua segunda turnê europeia chegou ao clímax em Estocolmo, em abril de 1939, com muita festa de seus fãs suecos por seu quadragésimo aniversário. No entanto, até mesmo Armstrong e Ellington estavam perdendo terreno para novas tendências da música popular, cuja nova febre era o swing. O expoente máximo (e maior beneficiário) dessa transição foi Benny Goodman, cujo pai tinha fugido do terror antissemita na Rússia para os Estados Unidos. Goodman, apelidado “Rei do Swing”, era um excelente clarinetista cuja banda tocava uma versão autêntica do jazz, beneficiada por arranjos de Fletcher Henderson (que, como muitos outros músicos negros de destaque, tinha vivido tempos difíceis durante a Depressão). Mas Goodman tinha muitos imitadores menos inovadores e menos talentosos. Eles transformaram o swing basicamente em música para dançar, explorando o filão do “furor dançante” que tomou conta de grande parte da Europa na década de 1930.




Na Alemanha nazi, no entanto, o swing, como o jazz, eram considerados “música de negros”. No entanto, o que o regime podia fazer era eliminar artistas populares que não se encaixassem em seus critérios de pureza racial. Entre eles estava o famoso artista de cabaré Fritz Grünbaum, judeu que tentou fugir da Áustria imediatamente depois do Anschluss, em 1938, mas foi barrado na fronteira checa. Ele foi mandado para o campo de concentração de Buchenwald e para o de Dachau, onde morreu em 1941. Fritz Löhner-Beda, também judeu e originário da Boémia, libretista famoso que tinha trabalhado em musicais e operetas com Franz Lehár, entre outros, foi preso em Viena depois do Anschluss, enviado a Dachau, depois a Buchenwald e, por fim, em 1942, a Auschwitz. Foi espancado até à morte no complexo industrial anexo, Monowitz. Ralf Erwin, judeu nascido na Silésia, compositor mais conhecido pela canção “Ich küsse Ihre Hand, Madame” [Beijo sua mão, madame] — famosa na voz do tenor Richard Tauber —, fugiu da Alemanha na época da ascensão do nazismo ao poder, em 1933. Foi capturado na França durante a ocupação e morreu num campo em 1943. No âmbito do entretenimento popular, como em muitas outras áreas da vida cultural, os nazis empobreceram grotescamente a Alemanha com suas políticas raciais absurdas e truculentas.



Com tantos jovens convocados para o serviço militar, os dias de glória do swing e das orquestras começaram a desaparecer. Os salões enfrentavam dificuldades óbvias, Muitas bandas interromperam suas atividades porque seus membros tinham sido convocados. Alguns continuavam tocando mesmo de farda, mas outros já não podiam fazer o mesmo. Muitos foram mortos em ação. Glenn Miller, renomado líder da orquestra americana da Força Expedicionária Aliada, que reunia 48 músicos, morreu em dezembro de 1944 no Canal da Mancha, quando o avião que o transportava da Inglaterra para a França, onde se apresentaria para soldados franceses, desapareceu. 

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Jürgen Habermas



O filósofo e sociólogo alemão Jürgen Habermas foi confrontado enquanto adolescente com a história viva do nacional-socialismo; a experiência da desumanidade coletiva do seu país marcou-o definitivamente. Compreender a possibilidade dessa experiência tão radicalmente distinta dos ideais de liberdade, justiça e autonomia da tradição de Kant, Hegel e Marx, mas acontecida precisamente na mesma cultura, impôs-se-lhe como desafio incontornável. A discussão entre Habermas e John Rawls sobre concepções de democracia (deliberativa, procedimental, etc.) é um produtivo ponto de abordagem desta questão na filosofia política contemporânea.

Sem deixar de considerar o pessimismo civilizacional expresso pela geração da Escola de Frankfurt anterior à sua, Habermas procura responder-lhe. Para ele, o projeto do Iluminismo não está morto. No núcleo do seu trabalho está a elaboração de uma teoria da democracia para o nosso tempo, bem como uma causa: mostrar que este projeto não é um projeto ingénuo. É esta causa que está por trás de importantes polémicas teóricas que trava nos finais do século XX com filósofos franceses como Jean-François Lyotard ou Jacques Derrida. Quando no pensamento francês esta ideia já se tinha tornado ultrapassada, Habermas não deixa nunca cair a ideia de emancipação. Habermas estudou em Göttingen, Zurique, Bona e Frankfurt. Escreveu a sua tese de doutoramento sobre Schelling (1954) e a tese de Habilitation sobre a esfera pública (1962) — um tema que, aliado ao da racionalidade comunicacional, estruturará todo o seu pensamento. A tese de Habilitation de Habermas será terminada em Marburgo devido a um desentendimento com Horkheimer.

Ao longo da sua muito produtiva vida académica, ensinou entre a Alemanha e Nova Iorque, na New School for Social Research. Algumas das suas obras fundamentais são Conhecimento e Interesse (Erkenntnis und Interesse, 1968), Técnica e Ciência como «Ideologia» (Technik und Wissenschaft als «Ideologie», 1968), Teoria da Ação Comunicacional (Theorie des kommunikativen Handelns, 1981), O Discurso Filosófico da Modernidade (Der Philosophische Diskurs der Moderne, 1985) e Faktizität und Geltung: Beiträge zur Diskurstheorie des Rechts und des demokratischen Rechtsstaats (Entre Factos e Normas: Contribuições para Uma Teoria Discursiva do Direito e da Democracia, 1992). Publicou também bastante, mais recentemente, sobre democracia, bem como sobre a Europa e a União Europeia, e sobre as relações entre naturalismo e religião em diálogo com o ainda cardeal Ratzinger, que viria a ser o Papa Bento XVI.

O Discurso Filosófico da Modernidade é uma meditação sobre a história da filosofia contemporânea, com a tradição alemã no seu núcleo, e do ponto de vista filosófico talvez a mais fascinante das suas obras.Isto quer dizer que a visão que Habermas tem da filosofia contemporânea não considera o nascimento da filosofia analítica nos autores de língua alemã - Frege, menos considerado pelo seu recato avesso a protagonismos, ainda que Bertrand Russel o tenha relevado para grande plano; e Wittgenstein, que ao contrário de Frege deu muito que falar com a sua excentricidade quase mística. Habermas é um leitor do que melhor se faz da filosofia analítica em inglês, mais no âmbito da filosofia da linguagem e da filosofia política. Nada disso é tradição em língua alemã. 

Para Habermas, do núcleo da tradição alemã, tem muito respeito pelo grande triunvirato - Kant; Hegel; Marx. O filósofo alemão com quem Habermas se envolveu em polémica foi Dieter Henricha, propósito da famigerada Metafísica tão delapidada por Heidegger e seus epígonos. Não deixa de ser interessante contrastar as ideias habermasianas com o grande paladino da Fenomenologia Alemã - Edmund Husserl, com o regresso às formas de vida, elas próprias.

Ora, concentrando todo o discurso da Modernidade que já vinha pensada de Kant e Hegel, à qual Marx lhe pregou um bom acrescento com a sua historicidade, assim Habermas se filiou no outro triunvirato que deu a chancela da Escola de Frankfurt - Horkheimer, Benjamin e Adorno. Habermas tornou-se muito crítico dos pensadores franceses que se extraviaram no apelidado pensamento pós-moderno, com Foucault e Derrida à cabeça, sem negligenciar a dupla dos patronos: Nietzsche e Heidegger.

Portanto, o Discurso Filosófico da Modernidade tem como ponto central a sua teoria: Da Ação Comunicacional. Esta aparece como fundamentação de um projeto iluminista e democrático, superando a filosofia da consciência husserliana, mas não através de qualquer relativismo pós-modernista. Do ponto de vista teórico, o próprio Habermas considera que ultrapassar a ligação existente entre uma determinada linhagem de crítica social e a filosofia do sujeito é uma precondição da crítica social. É através da Teoria da Ação Comunicacional que pretende levar a cabo uma crítica da razão centrada no sujeito. Esta é a raiz da ligação do pensamento de Habermas à teoria da linguagem. 

Em termos de teoria social, Habermas pretende também substituir, no lugar fundamental que esta ocupava, a categoria marxista do trabalho pela categoria da comunicação. Para a teoria da ação comunicacional, Habermas nas suas ligações com os analíticos ingleses foi buscar inspiração aos diversos estudos sobre a linguagem, nomeadamente aos atos de fala de J. L. Austin e John Searle. Habermas pretende pôr em relevo o potencial ético e crítico desta abordagem da linguagem; a sua ideia central é a de uma pragmática universal também inspirada em Kant.

A competência comunicacional representa assim uma possibilidade de acordo subjacente a toda a interação humana. A ação comunicacional é o nome da ação social coordenada através de atos de fala, nos quais e pelos quais os falantes pretendem a verdade, retidão e sinceridade. A partir da perspectiva pragmática, torna-se claro o envolvimento de tais pretensões de validade no entendimento linguístico. É uma teoria da linguagem apoiada na racionalidade. Os falantes têm de se envolver em modos de comportamento para os quais existem boas razões para a construção de uma sociedade plena de valores democráticos. E isso faz-se através do entendimento intersubjetivo. É por assim dizer uma ética discursiva, de linhagem kantiana, que conduz a uma teoria social e política da modernidade, uma teoria fundamentadora, racionalista e universalista.

Contrariando o pendor pessimista de anteriores autores da Escola de Frankfurt como Adorno e Horkheimer, Habermas pretende recuperar o potencial emancipador e universalista do projeto civilizacional da modernidade e mostrar que a razão instrumental não tem o papel totalmente dominante nas sociedades contemporâneas que as críticas pessimistas lhe atribuem. Ele pensa que o diagnóstico de Adorno e Horkheimer (o diagnóstico do carácter totalitário, monolítico, da razão instrumental) é excessivo e esquece um outro tipo de racionalidade, em ação também ele nas sociedades contemporâneas, a que chama racionalidade comunicacional, e que vê como orientada não para a manipulação e reificação de todas as realidades naturais e sociais, mas sim para o entendimento mútuo e a ação consensual. Esta diferença é o que lhe permite articular a sua resposta aos críticos e adversários da civilização europeia com o epíteto de "O Ocidente".

terça-feira, 16 de abril de 2024

Mahmūd Hotak



Eu, numa conversa com o ChatGPT, perguntei: 

Mahmud Hotak foi apoiado por 15 mil afegãos armados com zamburaks?

ChatGPT - Na verdade, o Império Safávida do Irão desintegrou-se em 1722 devido à invasão afegã liderada por Mahmud Hotak, que capturou Isfahan, a capital safávida, e depôs o último xá safávida, Sultan Husayn. Isso marcou o fim do domínio safávida sobre o Irão. Mahmud Hotak foi um líder afegão do século XVIII que liderou um movimento de resistência contra a dinastia safávida no Afeganistão. Seus seguidores eram conhecidos por utilizar zamburaks, armas de fogo montadas em camelos, que eram eficazes em ataques rápidos e guerrilha. O apoio de 15 mil afegãos armados com zamburaks certamente teria sido significativo em suas campanhas militares.

As tribos Ghilzai pashtun sunitas odiavam os safávidas xiitas?

ChatGPT - Sim, isso é correto. As tribos Ghilzai, que eram predominantemente pashtuns e sunitas, tinham uma longa história de rivalidade e conflito com os safávidas, que eram xiitas. Essa divisão étnica e religiosa contribuiu para a animosidade entre os dois grupos e foi um dos fatores que impulsionaram o apoio dos Ghilzai a líderes como Mahmud Hotak em sua luta contra os safávidas.




Shāh Mahmūd Hotak, [1697-1725] foi o governante da dinastia Hotak que derrubou a dinastia Safávida para se tornar o rei do Irão de 1722 até à sua morte em 1725. Mahmud era o filho mais velho de Mirwais Hotak, o chefe da tribo Ghilzai Pashtun do Afeganistão, que havia tornado a região de Kandahar, que era independente do domínio safávida em 1709. Mirwais quando morreu, em 1715, foi sucedido pelo irmão, Abdul Aziz. Abdul Aziz participou ao lado dos persas, o que o fez reentrar na suserania do Irão safávida. Tal situação foi muito impopular entre os afegãos.

Mahmud, vendo que as conquistas de seu pai, Mirwais Hotak, tinham sido alienadas, reuniu muitos de seus seguidores leais e entrou no palácio real. O próprio Mahmud Hotak matou Abdul Aziz, o que o fez subir ao trono dos Hotaks aos 18 anos. Mahmud Hotak, ambicioso, e desejando expandir seus territórios, desencadeou guerra contra os safávidas. Sua primeira campanha foi em 1720, marchando para Kerman.

Depois de derrotar o Sultanato de Herat, em 1720, preparou de seguida nova campanha contra os safávidas. Em 1722, Mahmud reuniu 20.000 homens e dirigiu-se para Isfahan. Os persas e afegãos se encontraram na Batalha de Gulnabad, em 8 de março de 1722. Apesar de estar em menor número, e mal equipado, o exército persa foi derrotado, e os afegãos avançaram sobre Isfahan. Sultan Husayn, acompanhado de seus cortesãos e oficiais, foi para Farahabad, onde os afegãos estavam acampados. Husayn removeu a coroa e a colocou no turbante de Mahmud, que era doravante o Xá.

Nos primeiros dias de seu governo, Mahmud demonstrou benevolência, tratando bem a família real capturada e supriu de alimentos a capital faminta. Mas foi confrontado com um pretendente rival ao trono: o filho de Husayn - Tahmasp. Mahmud enviou um exército, mas Tahmasp escapou. Os pashtuns tomaram a cidade. Mas a população levantou-se contra eles em janeiro de 1723. A revolta foi um sucesso.

Mahmud convocou os ministros e nobres persas para uma reunião. Mas, sob falsos pretextos, mandou matá-los. Cerca de 3.000 dos guardas reais persas foram executados. Ao mesmo tempo, os arquirrivais otomanos e russos aproveitaram o caos para tomar terras para si, limitando a extensão do território sob o controlo de Mahmud.

Muitas tribos pashtun preferiam Ashraf Khan. Em fevereiro de 1725, acreditando num rumor de que um dos filhos de Sultan Husayn - Safi Mirza -, havia escapado, Mahmud ordenou a execução de todos os outros príncipes safávidas que estavam em suas mãos, com exceção do próprio Sultan Husayn. Em 22 de abril de 1725, um grupo de oficiais afegãos libertou Ashraf Hotak, que se encontrava preso por ordem de Mahmud. E por um golpe palaciano Ashraf Khan foi colocado no trono. Mahmud foi assassinado. 



Mahmud Hotak

Os Safávidas recrutaram soldados georgianos?

ChatGPT - Sim, os Safávidas recrutaram soldados georgianos para fazerem parte de seu exército. A Geórgia estava localizada numa região estratégica e era frequentemente alvo de invasões e conflitos entre diferentes impérios e dinastias da região. Os Safávidas, como muitos outros governantes da região, buscavam fortalecer seu exército recrutando guerreiros georgianos, conhecidos por sua habilidade e ferocidade em combate.

Os georgianos eram governados por reis Bagrationi

ChatGPT - Sim, os georgianos eram governados pela dinastia Bagrationi (também conhecida como Bragation), que reinou na Geórgia por séculos. A dinastia Bagrationi foi uma das mais antigas e influentes da Geórgia, com raízes que remontam ao século VIII. Eles desempenharam um papel crucial na história e na política da Geórgia, incluindo períodos de unificação e fragmentação do reino georgiano.

Um dos reis Bagrationi era Jorge

ChatGPT - Não há registos históricos de um rei Bagrationi chamado Jorge. No entanto, a dinastia Bagrationi teve muitos reis ao longo de sua história, incluindo alguns chamados Giorgi, na forma georgiana. Um dos mais conhecidos foi Jorge XI, que reinou no século XIII. Ele foi um dos últimos governantes antes da invasão mongol e desempenhou um papel importante na história da Geórgia medieval.

Jorge, um duro paladino, converteu-se ao islão com o nome de Gurgin KhanEstou a referir-me a Gurgin Khan em Kandahar

ChatGPT - Ah, entendi. Você está se referindo a Gurgin Khan, que foi um líder militar georgiano que se converteu ao Islão e assumiu o comando na região de Kandahar, no Afeganistão, durante o século XVII. Ele foi originalmente conhecido como Jorge XI da Geórgia antes de se converter e adotar o nome Gurgin Khan. Sua conversão ao Islão e a sua liderança em Kandahar são eventos históricos bem documentados.

Nessa altura havia um rei que governava o Afeganistão e a Geórgia. Quem era ele?

ChatGPT - Na época, o líder que governava tanto o Afeganistão quanto a Geórgia era Shah Abbas I, que foi o monarca da dinastia safávida no Irão. Embora ele não tenha governado diretamente o Afeganistão e a Geórgia, sua influência se estendia a essas regiões por meio de governadores e aliados. Shah Abbas I foi um dos líderes mais poderosos do mundo islâmico durante o início do século XVII e desempenhou um papel significativo na política e na história da região.

E o rei Jorge governava o quê?

ChatGPT - O rei Jorge, conhecido como Jorge XI da Geórgia, governava o Reino da Geórgia, um país localizado na região do Cáucaso, com sua capital em Tbilisi. A Geórgia era um estado independente com sua própria cultura, história e política, e os reis da dinastia Bagrationi governaram a região durante séculos, até à sua anexação pelo Império Russo no século XIX.

O mesmo rei que enviou Mirwais Hotak a Isfahan, certo?

ChatGPT - Não, houve uma confusão de nomes. Mirwais Hotak foi enviado a Isfahan por Gurgin Khan, também conhecido como Shah Hussain Hotak, não pelo rei Jorge XI da Geórgia. Mirwais Hotak foi um líder tribal afegão que desempenhou um papel importante na resistência afegã contra o domínio safávida no século XVIII. Ele foi enviado a Isfahan por Gurgin Khan como representante dos interesses afegãos na corte safávida.

E quem era Mirwais Baba?

ChatGPT - Baba, também conhecido como Mirwais Khan Hotak, foi um líder tribal afegão do século XVII. Ele é mais conhecido por liderar a revolta afegã contra o domínio safávida na região de Kandahar, no atual Afeganistão. Sua revolta foi um dos eventos-chave que levaram à queda do controlo safávida em Kandahar e ao surgimento do domínio dos Hotak na região. Mirwais Baba é considerado um herói nacional no Afeganistão devido à sua resistência e liderança contra as forças safávidas.

E Jorge acabou por ser chacinado?

ChatGPT - Não há registos históricos de um rei Bagrationi chamado Jorge XI sendo chacinado. A dinastia Bagrationi governou a Geórgia por séculos, e houve muitos reis ao longo de sua história. Embora alguns reis tenham enfrentado finais trágicos, como assassinato ou morte em batalha, não há registos específicos de um rei chamado Jorge XI que tenha sido chacinado.

sexta-feira, 12 de abril de 2024

Governança ou governação? Política ou políticas?



Governança e governação - bem como Política e políticas - são conceitos relacionados, mas têm nuances diferentes.

Governança é o processo de tomada de decisão e implementação de políticas por parte das instituições de um país, organização ou sistema. Geralmente, está associada à maneira como o poder é exercido e controlado em uma entidade específica, com foco em transparência, responsabilidade, prestação de contas e participação dos diferentes stakeholders.

Governação é um termo mais amplo que engloba não apenas a estrutura formal de governança, mas também os processos informais, práticas culturais e interações sociais que moldam o funcionamento de uma sociedade ou sistema político. Além das instituições formais, a governação considera também as relações de poder, normas sociais, valores e tradições que influenciam a maneira como as decisões são tomadas e implementadas.

Em resumo, enquanto a governança se concentra nas estruturas formais de poder e controlo, a governação abrange uma gama mais ampla de influências e processos que moldam o funcionamento de uma sociedade ou sistema.

A China hoje é um caso interessante, pois combina elementos de capitalismo e comunismo. Apesar de ter uma economia predominantemente capitalista, ainda mantém um sistema político de partido único comunista. Algumas características que podem ser observadas incluem: Economia Capitalista Controlada pelo Estado.

Embora haja um forte setor privado e empresas multinacionais operando na China, o Estado mantém um controle significativo sobre a economia, com empresas estatais desempenhando um papel crucial em setores chave. O Partido Comunista da China continua a ser a única autoridade política, com um sistema político centralizado que controla todos os aspectos do governo. O Planeamento Económico é Centralizado. Apesar da presença de mercado e investimento estrangeiro, o governo chinês ainda mantém um controlo considerável sobre o planeamento económico e as políticas industriais. 

Enquanto algumas regiões da China desfrutam de um alto padrão de vida e desenvolvimento económico, outras áreas ainda enfrentam desigualdades significativas, o que é contrário à ideia comunista de igualdade. A Ideologia controla o sistema de informação: jornais, televisão e outros órgãos associativos da sociedade civil, que não existe. O governo chinês continua a exercer um controlo rígido sobre os órgãos de comunicação social. A informação é monopolizada pelo governo promovendo uma narrativa comunista, e reprimindo críticas ou ideias consideradas subversivas.

Essas características refletem a complexidade da situação atual da China, onde elementos de capitalismo e comunismo coexistem de maneira que desafiam definições simples. Os políticos que governam de acordo com as opiniões públicas são geralmente considerados como seguindo uma abordagem de governança baseada na democracia representativa. Eles tomam em consideração as opiniões, necessidades e preocupações dos cidadãos ao tomar decisões políticas e implementar políticas públicas. Isso pode ser visto como uma forma de garantir que o governo esteja alinhado com os interesses e valores da sociedade que representa. No entanto, há debates sobre a eficácia e a ética dessa abordagem, especialmente quando as opiniões públicas podem ser influenciadas por desinformação ou manipulação.

Política é o processo pelo qual os indivíduos - grupos que formam uma sociedade, um país, um Estado, uma Nação - tomam decisões e exercem poder para alcançar objetivos comuns que dizem respeito a todos. Isso pode incluir a formulação de leis, a alocação de recursos, a resolução de conflitos e a negociação de interesses diversos.

Políticas são os planos de ação deliberados ou cursos de ação desenvolvidos por governos, organizações ou indivíduos para alcançar objetivos específicos dentro do contexto político mais amplo.
Políticas podem abranger uma ampla gama de áreas, desde políticas económicas e sociais, até políticas de saúde, ambientais e educacionais.

Em resumo, a política refere-se ao processo geral de tomada de decisões e exercício de poder. Por outro lado, as políticas são os planos específicos desenvolvidos e implementados dentro desse processo para alcançar objetivos definidos.


A velocidade dos satélites

 




A velocidade dos satélites no espaço varia, dependendo da sua órbita. Por exemplo, os satélites de baixa órbita, como os usados para comunicações terrestres, geralmente viajam a velocidades entre 7 e 8 Km/segundo, enquanto os satélites geoestacionários, que ficam em órbita fixa sobre a Terra, viajam a cerca de 3 Km/segundo.

Os satélites são movidos principalmente pela força da gravidade da Terra, que os mantém em órbita ao redor do planeta. Uma vez lançados na órbita correta, os satélites continuam a se mover em trajetórias previsíveis devido ao equilíbrio entre a força gravitacional e a velocidade tangencial que adquiriram durante o lançamento. Além disso, alguns satélites podem usar propulsão própria, como motores a jato ou propulsores iónicos, para ajustar a órbita ou manobrar de acordo com as necessidades operacionais.

A gravidade da Terra exerce uma força atrativa sobre os satélites, puxando-os em direção ao centro do planeta. Essa força gravitacional é o que mantém os satélites em órbita ao redor da Terra. Quando um satélite é lançado com velocidade suficiente na direção correta, ele continua a se mover ao longo de uma trajetória curva ao redor da Terra devido à combinação entre a sua velocidade tangencial e a força gravitacional da Terra. Basicamente, a gravidade mantém o satélite em órbita ao puxá-lo em direção à Terra, enquanto a velocidade tangencial o impede de cair diretamente para o planeta.

Para explicar o movimento dos satélites é preciso fazer a experiência mental que Isaac Newton fez no século XVIII. Newton imaginou um canhão no topo de uma montanha apontado na direção paralela à superfície da Terra. Ignorando-se o efeito da atmosfera, o projétil iria até uma certa distância e depois cairia na Terra. Lançando-se o mesmo projétil com velocidade maior, ele cairia a uma distância maior. Aumentando-se cada vez mais a velocidade do projétil, chegaria um ponto em que o projétil já não mais atingiria a superfície do planeta, e descreveria uma órbita circular. Mas isso não significa que a gravidade não está agindo, pois é ela que faz a trajetória ser curva (diz-se que o projétil está em contínua queda livre). Em outras palavras, a gravidade da Terra faz com que a trajetória seja curva e, se a velocidade for suficiente, esta curva nunca atinge a superfície do planeta. Se a velocidade do projétil for ainda maior, ele passará a descrever uma órbita elíptica e, se a velocidade for ainda maior, o projétil escapa da influência da gravidade do planeta.

O cientista alemão Johanes Kepler formulou, no século XVII, as três leis do movimento planetário (Leis de Kepler). A primeira lei, que diz que todos os planetas orbitam o Sol numa trajetória elíptica, sendo que o Sol se localiza em um dos focos dessa elipse, pode ser aplicada aos satélites sendo que o planeta ocupa um dos focos dessa elipse. A segunda lei que diz que uma linha imaginária feita do centro do Sol ao centro do planeta varre áreas iguais em intervalos de tempo iguais é também aplicada aos satélites artificiais, pois no perigeu a velocidade do satélite é maior e no apogeu a velocidade é menor. E por fim, a terceira lei de Kepler, que afirma que a razão entre os quadrados dos períodos dos planetas é igual à razão dos cubos das distâncias médias ao Sol é obedecida pelos satélites que orbitam planetas ou qualquer objeto celeste.


quinta-feira, 11 de abril de 2024

A globalização do século XVI


A convivência pacífica entre Filipe II de Espanha [1527-1598] e 
Fernando I do Sacro Império Romano Germânico [1503-1564], pode ser atribuída a uma série de fatores, incluindo interesses políticos compartilhados, relações familiares e alianças estratégicas. Ambos os monarcas poderiam ter buscado evitar conflitos desnecessários, concentrando-se em fortalecer os seus reinos e enfrentar desafios comuns. Além disso, o contexto político e económico da época também pode ter influenciado essa relação pacífica. Os territórios sob domínio dos Habsburgos incluíam não apenas o coração dos domínios hereditários dos Habsburgos na Áustria, mas também partes da Alemanha, Hungria, Boémia, entre outros. O domínio dos Habsburgos se estendeu ainda mais com as uniões dinásticas e as conquistas militares ao longo dos séculos, tornando-os uma das famílias mais poderosas e influentes da Europa durante grande parte da história moderna.

Carlos V [1500-1558] enfrentou desafios financeiros consideráveis durante o seu reinado. Ele lutou com as finanças do vasto império Habsburgo, que incluía territórios em toda a Europa, além das possessões espanholas no Novo Mundo. As constantes guerras e o ônus financeiro de manter um império tão vasto e diversificado contribuíram para as suas dificuldades financeiras. Embora não tenha acabado completamente falido, Carlos V enfrentou sérios problemas económicos ao longo de seu reinado e, eventualmente, abdicou do trono em 1556 em favor de seu filho Filipe II, buscando uma vida mais tranquila.

Fernando I era irmão de Carlos V, ambos filhos de Filipe I e Joana. Fernando I  foi imperador do Sacro Império Romano Germânico após a abdicação de Carlos V em 1558. O seu sucessor foi Maximiliano II. Um outro Fernando II de Áustria - Arquiduque Fernando -, fazia parte dos vários membros da Casa de Habsburgo que detiveram o título de Arquiduque da Áustria. Este título foi usado principalmente pelos herdeiros aparentes do trono do Sacro Império Romano Germânico, que pertencia à dinastia Habsburgo. Ao longo da história, vários Arquiduques Fernando tiveram papel importante na expansão e no domínio dos Habsburgos sobre vastos territórios na Europa Central e Oriental.

Maximiliano II de Áustria foi de facto um membro proeminente da Casa de Habsburgo. Ele era irmão de Felipe II da Espanha. Maximiliano foi Arquiduque da Áustria e, posteriormente Imperador do Sacro Império Romano Germânico, sucedendo a seu pai, Fernando I, em 1564. Sob seu governo, Maximiliano II buscou manter a estabilidade do império atendendo às tensões religiosas da época, adotando uma política de tolerância religiosa, especialmente em relação aos protestantes. Ele também foi um patrono das artes e das ciências, contribuindo para o florescimento cultural do império durante seu reinado. Maximiliano II casou com Maria de Espanha. Maria era filha de Carlos V, Imperador do Sacro Império Romano Germânico (Também era Carlos I, rei de Espanha) e de Isabel de Portugal. O casamento entre Maximiliano & Maria foi parte de uma estratégia de aliança entre as casas reais dos Habsburgos espanhóis e austríacos, fortalecendo assim os laços entre os dois ramos da família Habsburgo. O casal teve vários filhos, incluindo o futuro imperador Rodolfo II.

Na verdade, o Imperador Carlos V casou com Isabel de Portugal, filha de Manuel I de Portugal, em 1526, no Alcázar de los Reyes Cristianos, em Córdoba. E Dom João III de Portugal casou com Catarina de Áustria, irmã do Imperador Carlos V, em 1525. Este casamento também foi parte de uma estratégia política para fortalecer as relações entre Portugal e o Império Habsburgo.


A questão que prendia a Casa de Habsburgo era a sua rivalidade com os Valois, tendo sido foi um dos principais conflitos dinásticos na Europa durante séculos. Ambas as famílias eram poderosas dinastias reais que disputavam o controlo sobre vastos territórios e influências políticas na Europa, especialmente durante a Idade Média e a Idade Moderna. As rivalidades entre essas casas reais frequentemente levaram a guerras, alianças complicadas e intriga política em toda a Europa, moldando o curso da história do continente.

A dinastia Valois foi uma importante família real francesa que governou a França de 1328 a 1589. Durante o seu reinado, os Valois enfrentaram muitos desafios, incluindo guerras internas, conflitos com outras casas reais europeias, como os Habsburgos, e crises políticas e económicas. Eles desempenharam um papel significativo na história da França, especialmente durante o Renascimento, quando o país experimentou um florescimento cultural e artístico. No entanto, a dinastia Valois chegou ao fim com a ascensão da dinastia Bourbon ao trono francês em 1589, após a morte de Henrique III.

Por seu lado, a dinastia dos Habsburgos foi uma das mais poderosas e influentes da Europa, tendo governado vastos territórios durante séculos. Originária da Áustria, a família expandiu seu domínio para incluir a Espanha, os Países Baixos, partes da Itália, a Hungria, a Boémia, entre outros territórios. Os Habsburgos também foram eleitos como Sacros Imperadores Romanos, controlando assim o Sacro Império Romano Germânico por grande parte de sua existência. A rivalidade entre os Habsburgos e outras famílias reais, como os Valois da França, foi uma característica proeminente da política europeia durante séculos, levando a numerosos conflitos e alianças complexas. A dinastia dos Habsburgos desempenhou um papel crucial na história europeia até ao final do século XIX, quando o Império Austro-Húngaro entrou em colapso após a Primeira Guerra Mundial.



Carlos V, por Ticiano
Batalha de Mühlberg

O retrato equestre de Carlos V, pintado por Ticiano, é uma obra-prima da arte renascentista. Ticiano capturou magistralmente a majestade e o poder do imperador Carlos V montado em seu cavalo. A pintura é conhecida por sua riqueza de detalhes e pela habilidade do artista em retratar tanto o cavalo quanto o imperador com uma grande sensação de realismo e dignidade.

Ticiano Vecellio, frequentemente conhecido simplesmente como Ticiano, foi um dos mais importantes pintores renascentistas italianos, que também trabalhou para os Habsburgos. Ele nasceu por volta de 1488 e morreu em 1576. Ticiano é conhecido por suas habilidades técnicas excepcionais, uso inovador da cor e composições dramáticas. Ele trabalhou principalmente em Veneza e foi um dos principais expoentes da Escola de Veneza. Suas obras incluem uma ampla gama de temas, desde retratos e pinturas religiosas até mitológicas e históricas. Ticiano teve um impacto duradouro na história da arte e influenciou gerações posteriores de pintores.

Ele teve uma relação especialmente próxima com o imperador Carlos V e seu filho, Filipe II. Ticiano pintou vários retratos da família Habsburgo, incluindo Carlos V, sua esposa Isabel de Portugal e seu filho Filipe II. Além disso, ele produziu obras religiosas e mitológicas encomendadas pelos Habsburgos. Essas comissões não apenas garantiram o patrocínio financeiro de Ticiano, mas também elevaram o seu status como um dos pintores mais renomados da época.

A Batalha de Mühlberg foi um importante confronto militar ocorrido em 24 de abril de 1547, durante as Guerras de Carlos V na Alemanha. Nesta batalha, as forças do Sacro Império Romano Germânico, lideradas pelo próprio imperador Carlos V, e seu comandante Fernando Álvarez de Toledo, Duque de Alba, derrotaram as forças da Liga de Esmalcalda, liderada pelo eleitor João Frederico I da Saxónia. A vitória de Carlos V em Mühlberg consolidou o seu domínio sobre o Sacro Império e foi um marco significativo na história da Europa do século XVI.

Carlos V confrontou Martinho Lutero na Dieta de Worms em 1521. A Dieta de Worms foi uma assembleia imperial realizada na cidade de Worms, na Alemanha, onde Lutero foi convocado para responder por suas ideias religiosas, que desafiavam a autoridade da Igreja Católica. Durante o encontro, Lutero se recusou a retratar suas crenças e supostamente teria dito a famosa frase: "Aqui estou. Não posso fazer outra coisa. Que Deus me ajude. Amém." Carlos V, como imperador do Sacro Império Romano Germânico, presidiu a Dieta e decidiu a resposta oficial às ideias de Lutero, resultando na excomunhão do reformador que deu início à Reforma Protestante. Mas, 
Frederico III da Saxónia, também conhecido como Frederico, o Sábio, desempenhou um papel crucial na proteção de Martinho Lutero durante a Reforma Protestante. Frederico era um príncipe eleitor do Sacro Império Romano Germânico e governou a região da Saxónia. Ele simpatizava com as ideias de Lutero e reconhecia a sua importância para a Saxónia e para a Reforma.

Quando Lutero foi convocado corria o risco de ser preso e julgado por heresia. Frederico providenciou um salvo-conduto seguro para que Lutero viajasse para Worms sob sua proteção. Após a Dieta, quando ficou claro que a vida de Lutero estava em perigo, Frederico organizou o sequestro fictício de Lutero e o levou para o Castelo de Wartburg, onde Lutero ficou escondido por cerca de um ano sob o pseudónimo de "Junker Jörg". Essa ação de Frederico permitiu que Lutero continuasse o seu trabalho de tradução da Bíblia e de escrever obras teológicas sem a ameaça imediata de prisão ou execução.

Alberto, um membro da Casa de Hohenzollern, tornou-se o primeiro Duque da Prússia, em 1525. Ele era conhecido como Alberto de Brandemburgo-Ansbach, e sua ascensão marcou o estabelecimento do Ducado da Prússia como um estado secular. Antes disso, a região da Prússia era dominada pela Ordem Teutónica, uma ordem religiosa militar que governava a região em nome do Sacro Império Romano Germânico. No entanto, após a Guerra dos Treze Anos (1454-1466) e a Paz de Thorn, a Prússia se tornou um feudo do Reino da Polónia. Posteriormente, com a secularização das terras da Ordem Teutónica após a Reforma Protestante, Alberto se converteu ao protestantismo e obteve o título de Duque da Prússia, governando a região como um estado secular e soberano, embora ainda mantivesse uma relação formal com a coroa polaca como um feudo. Essa mudança marcou o início do domínio dos Hohenzollern na região, que eventualmente levaria à criação do Reino da Prússia e ao surgimento da Prússia como uma grande potência na Europa.


Carlos V frequentemente recorreu a empréstimos dos Fugger, uma poderosa família de banqueiros alemães, para financiar as suas campanhas militares e outras despesas. Os Fugger eram uma das famílias mais ricas e influentes da Europa na época e desempenharam um papel crucial no financiamento das atividades de Carlos V, contribuindo para a sua capacidade de manter e expandir um vasto império.



Filipe II da Espanha foi responsável pela construção do majestoso Mosteiro de El Escorial. Ele ordenou a construção deste impressionante complexo arquitetónico no século XVI, entre 1563 e 1584. El Escorial serviu como um centro político, religioso e cultural importante para a Espanha durante o reinado de Filipe II e continuou a desempenhar um papel significativo na história espanhola desde então.



Do Mausoléu dos Infantes no Escorial


terça-feira, 9 de abril de 2024

Abderramão II de Córdoba e Zubaida, a das Mil e Uma Noites




Estátua de Abderramão II em Múrcia 

Abderramão II de Córdoba foi o oitavo emir Omíada de Córdoba, reinando de 822 a 852. Durante o seu reinado, o Califado de Córdoba alcançou uma era de grande prosperidade cultural, científica e económica no Al-Andalus.

O Emir de Córdoba em 822 já era independente do Grande Califado. Em sua juventude, tomou parte do chamado "massacre da vala", quando vieram prestar homenagem aos príncipes mortos por ordem de seu pai. Ao ascender ao trono, continuou as campanhas militares e esteve em estado permanente de guerra contra Afonso II das Astúrias. O Califado de Córdoba conseguiu travar o avanço dos cristãos, que se tinham acantonado a Norte, em direção ao sul, pelo menos até 842.

Em 837 Abderramão havia esmagado uma revolta dos chamados "povos do livro" em Toledo. Ele emitiu um decreto proibindo os cristãos de buscar o martírio, que foi concretizado ao forçar a realização de um sínodo na cidade de Córdoba, em 839. O encontro foi presidido por Recafredo, arcebispo de Sevilha. As execuções iniciadas em seu reinado culminariam na canonização dos Mártires de Córdoba.

Em 844, Abderramão repeliu um ataque montado pelos vikings que haviam desembarcado em Cádis. Os vikings chegaram a conquistar Sevilha, e atacaram a própria capital do emirado, Córdoba. Para evitar novas incursões, construiu uma frota e um arsenal naval em Sevilha. Também respondeu ao chamamento de Guilherme de Septimânia que lhe pediu ajuda na sua luta contra as nomeações de Carlos, o Calvo.

Abderramão II foi um poeta muito talentoso, e elegante, a quem são atribuídos os Anais da Espanha. Fomentou as artes, as ciências e a agricultura, tendo dotado a capital de águas, banhos públicos, escolas e excelentes vias, embelezando-a com os formosos monumentos.




Zubaidah bint Ja'far ibn al-Mansur, e Harun al-Rashid, de Bagdade, fazem parte das bases de “As Mil e Uma Noites”. Zubaida, um ano mais nova que Harun, apenas se sabe da data do seu falecimento: 7 de julho de 831. Era neta do califa al-Mansur. Diz-se que o palácio de Zubaida "soava como uma colmeia" porque ela empregava cem empregadas que haviam memorizado o Alcorão.

Em sua quinta peregrinação a Meca, ela viu que uma seca havia devastado a população e reduzido o Poço Zamzam a um fio de água. Assim ordenou que o poço fosse aprofundado, tendo gastado mais de 2 milhões de dinares melhorando o abastecimento de água de Meca e da província circundante. Isso incluiu a construção de um aqueduto a partir da nascente de Hunayn, 95 Km a leste, bem como a famosa "Primavera de Zubaida" na planície de Arafat, um dos locais rituais do Hajj. Quando seus engenheiros a alertaram sobre a despesa, atendendo às dificuldades técnicas, ela respondeu que estava determinada a realizar o trabalho mesmo que cada golpe de picareta custasse um dinar.

Zubaida também melhorou a rota peregrina através de 900 Km de deserto entre Kufa e Meca. A estrada foi pavimentada e desobstruída de pedregulhos. E mandou colocar depósitos de água ao longo do percurso. As caixas de água também serviam de cisterna, captando o excedente de água da chuva das das periódicas tempestades que ocasionalmente afogavam quase tudo. Ibn Batuta, referindo-se a Zubaidah: "cada reservatório, piscina ou poço nesta estrada que vai de Meca a Bagdade é devido à sua generosidade". Essa estrada não seria utilizável por ninguém se Zubaida não se tivesse empenhado na execução de tais benfeitorias. Ele menciona especificamente os reservatórios de água em Birkat al-Marjum e al-Qarurah.

Zubaida contratou uma equipa de assistentes para administrar as propriedades e atuar em seu nome em inúmeros empreendimentos comerciais, independentes de Harun. Sua casa particular também era administrada de maneira luxuosa. Suas refeições eram apresentadas em pratos de ouro e prata em vez da simples bandeja de couro comumente usada na época, e introduziu a tendência da moda de usar sandálias costuradas com pedras preciosas. Também se fazia circular num palanquim feito de prata, ébano e forrado a seda.

Construiu um palácio com um grande salão de banquetes acarpetado e apoiado por pilares feitos de marfim e ouro. Versos do Alcorão foram gravados nas paredes em letras douradas. O palácio foi cercado por um jardim cheio de animais e pássaros incomuns. Ela tinha um macaco de estimação vestido como soldado de cavalaria e contratou 30 servos para atender às necessidades do macaco. Os visitantes de Zubaida, incluindo generais de alto escalão, foram obrigados a beijar a mão do macaco. Além disso, uma série de escravas seguiam por onde ela passava, e cada uma fazia recitações do Alcorão de cor. Reconstruiu Tabriz depois de ter sido devastada por um terramoto, em 791.

Seu marido, Harun al-Rashid morreu em março de 809 enquanto estava em Tus. Sucedeu-lhe o filho Muhammad al-Amin que continuou as políticas progressistas encetadas pelo pai. Os dois primeiros anos de seu reinado foram geralmente pacíficos, no entanto, al-Amin tentou remover o meio-irmão da herança, o que desembocou numa guerra civil. Ganharam os partidários de al-Ma'mun, em 813, o qual ocupou o lugar. 

A Bagdade dos abássidas, especialmente durante o período áureo, era conhecida por sua riqueza cultural e intelectual, e o sexo fazia parte da vida quotidiana da sociedade islâmica da época. No entanto, devido à natureza conservadora das fontes históricas disponíveis, as descrições específicas do prazer sexual na Bagdade abássida foram ocultadas. As referências à sexualidade na literatura da época, como a poesia erótica e os contos das Mil e Uma Noites, oferecem algum vislumbre de como seria a sexualidade na sociedade abássida, mas é importante reconhecer que essas obras são ficcionais, e podem não refletir totalmente a realidade histórica.

sábado, 6 de abril de 2024

Extremistas e moderados



Extremistas e moderados opõem-se num espectro de opiniões e comportamentos. Os extremistas tendem a adotar posições radicais e inflexíveis, muitas vezes recorrendo à violência ou à exclusão de quem discorda de suas ideias. Enquanto isso, os moderados buscam um equilíbrio que geralmente estão abertos ao diálogo e à negociação. Mas q
uando as tensões e os ressentimentos entre grupos étnicos, religiosos, culturais e políticos se intensificam, está criado o clima propício para o conflito, que em muitos casos termina em guerra.

Por conseguinte é crucial a promoção do entendimento mútuo, a tolerância e a resolução pacífica de conflitos para evitar que se instale o ódio, que por sua vez vai dar origem à violência. Daí ser necessário evitar dentro de cada país o ódio entre partidos políticos. Embora a discordância e o debate político sejam naturais numa democracia saudável, o ódio e a hostilidade exacerbados podem levar a uma polarização prejudicial, dificultando a cooperação para uma boa governação. É essencial promover o diálogo construtivo, o respeito mútuo e o compromisso para encontrar soluções que beneficiem a sociedade como um todo. Mas hoje vivem-se tempos distópicos, entre uma revolução científica e tecnológica que assusta, e uma dissolução de certos princípios éticos que faz lembrar a barbárie de outros tempos. Repare-se na seguinte descrição de um cientista "freelancer" dos Estados Unidos da América: 
Hoje, na América, quem quiser editar genes num laboratório, pode comprar Cas9 na internet. Pode, inclusivamente, comprar os ARN-guias. O site da IDT disponibiliza kits preparados para serem inseridos em células humanas a partir de 95 dólares. Por exemplo: prepara-se um pouco de Cas9 com um ARN-guia criado para eliminar o gene de bactéria (um trecho de ADN) que resiste ao antibiótico ampicilina. Com pipetas, um pedaço de ADN é incubado com a enzima Cas9 e depois o ARN é guiado de modo a cortá-lo na posição desejada. É adicionado um corante que ajuda a visualizar os resultados pela técnica da eletroforese em gel que separa as moléculas de ADN de tamanhos distintos. A impressão daí resultante revela bandas em diferentes pontos ao longo do gel, indicando como eles foram cortados pelo Cas9.
Eu vejo a pessoa humana como um ser corpóreo inserido na sociedade, a qual dita mais ou menos o seu destino conforme a hierarquização de dois valores: justiça e liberdade. E assim se definem as suas circunstâncias conforme a sociedade é mais liberal, mas menos justa; ou mais comunitária, mas mais justa. Há um aspeto que é real: a Federação Russa confronta-se com alguns casos de reivindicação de autonomia política por parte de minorias com autoria de atentados terroristas. A questão que se levanta é se atos terroristas têm cabimento na conceção da guerra justa. O princípio da autodeterminação é compatível com a reivindicação de uma guerra justa?

Os países surgiram historicamente como formas de organização política e administrativa que ajudam a organizar territórios, otimizar os recursos e gerir as populações sob uma estrutura de governo, serviços e leis que regulam as relações entre pessoas e entidades. Ao longo da história, os países surgiram como uma maneira de estabelecer fronteiras. Isso muitas vezes ocorreu para proteger grupos de pessoas da escravidão, da conquista ou da exploração por parte de outros grupos. Os países fornecem uma estrutura legal e política para garantir direitos e proteções aos seus cidadãos.

É correto dizer que um partido político é do "centro" se ele adota uma posição ideológica que busca equilibrar elementos da esquerda e da direita, promovendo políticas moderadas e pragmáticas. Alguns partidos políticos são explicitamente identificados como de centro devido às suas plataformas e agendas políticas. Alguns exemplos de partidos políticos do centro ao redor do mundo incluem: o Partido Democrata nos Estados Unidos; o Partido Liberal no Canadá; o Partido Democrático Liberal no Japão; o Partido Democrata na Itália; o Partido Social Democrata na Alemanha; o Partido Democrata Cristão na Holanda; o Partido Democrata Cristão na Noruega. Esses são apenas alguns exemplos e a classificação dos partidos como do centro pode variar dependendo do contexto político e das ideologias predominantes em cada país.

A sociedade se fortalece na solidariedade. Uma sociedade é mais saudável e mais justa quando é ao mesmo tempo pluralista e cultiva valores compartilhados de liberdades individuais e direitos civis. Há, contudo, um certo pensamento designado por relativista, uma espécie de dogma em que o indivíduo é independente e livre de compromissos para com a restante sociedade. Mas um outro pensamento chamado comunitarismo, que cria melhores sociedades do que o liberalismo. Mais ainda em tempos de guerra, o Estado não pode abster-se e ser neutro em relação a certos pilares essenciais à coesão social.
Uma coisa é: a esquerda criticar a Primavera por granizar os cravos em abril. Outra coisa é chegar a casa, depois de ter colocado no prego o serviço da Companhia das Índias, e dizer aos filhos que comam a sardinha diretamente da lata, porque é um dia a menos para a fome, não importa serem ricos, um dia em que se não come é um dia a menos para a morte. Há sempre um dia em que voltaremos a ser apenas pó das estrelas. Afinal, isso vem escrito na Bíblia, graças a Todos os Santos pelo terramoto de Lisboa. Hoje é comummente aceite que os autos-de-fé não impedem os terramotos. Em abono da verdade, o que mais lhes resta? Os filhos em casa precisam de comer.
A extrema-direita muitas vezes usa memes apocalípticos para promover a sua agenda e espalhar desinformação. Esses memes podem retratar visões extremistas sobre temas como imigração, mudanças climáticas, globalização e outras questões sociais e políticas. Eles são projetados para instigar medo, raiva e divisão, muitas vezes distorcendo factos ou simplificando questões complexas para promover uma narrativa específica.

O termo "Ocidente político" geralmente se refere às nações e regiões do mundo que compartilham sistemas políticos democráticos, valores liberais, estado de direito e economias de mercado. Isso inclui grande parte da Europa, América do Norte e algumas partes da Oceania. Esses países tendem a ter sistemas políticos mais abertos e pluralistas em comparação com outras partes do mundo. Enquanto ideia, o Ocidente é, portanto, o produto de cinco revoluções que ocorreram nos últimos dois milénios. Veja-se, por exemplo, o que se está a passar no norte de Moçambique com as atrocidades do denominado “Estado Islâmico”. Ou noutras zonas de África com a Rússia, por procuração, através do grupo Wagner.

Os princípios a serem respeitados no contrato social entre partidos políticos podem incluir transparência, democracia interna, respeito à diversidade de opiniões, compromisso com o bem comum, prestação de contas aos eleitores e comprometimento com os valores democráticos e constitucionais do país. O contrato social é uma teoria política que aborda como as pessoas concordam em viver em sociedade e estabelecer regras e governo. A tolerância é um princípio que promove o respeito e aceitação das diferenças entre os membros dessa sociedade, garantindo a convivência pacífica e o respeito aos direitos individuais. Em muitas teorias políticas, a tolerância é vista como uma parte essencial do contrato social, pois permite que pessoas com diferentes crenças e valores coexistam em harmonia dentro de uma sociedade.

Um compromisso entre instituições e eleitorado é essencial para uma democracia saudável. Isso envolve instituições governamentais atuando de forma responsável, transparente e representativa, enquanto o eleitorado participa ativamente no processo político, exercendo seus direitos e responsabilidades de forma informada e engajada. Esse compromisso pode ser alcançado através de eleições justas, prestação de contas, transparência nas decisões políticas e diálogo constante entre representantes e cidadãos. Para além de possíveis erros táticos, os governantes não podem perder de vista os princípios da justiça. E por maioria de razão, tratando-se o governo da instituição mais efetiva na vida das pessoas, o seu exemplo não pode deixar de estar alinhado com o que uma sociedade justa exige.

Ora, sendo o bem comum o maior bem, os agentes deviam sobrepor planos racionais aos planos dos desejos e das ideologias para alinharem este bem com os princípios da justiça. E neste caso, é justo que o resultado final menos desejável dos votos dos eleitores, ainda que cegados pelo véu de ignorância, mas sem ter resultado de manobras fraudulentas, tem de ser respeitado. 
Existem várias razões pelas quais as pessoas podem acreditar nas declarações de Donald Trump, mesmo que sejam falsas. Algumas pessoas podem identificar-se ideologicamente com ele e, portanto, estar inclinadas a aceitar as suas afirmações. Além disso, a repetição frequente de certas declarações pode fazer com que pareçam mais verdadeiras, mesmo que não sejam. Também pode haver uma falta de acesso a fontes de informação confiáveis, levando as pessoas a confiarem no que ele diz.

Em política, o mal muitas vezes prevalece sobre o bem devido a uma série de fatores complexos, como interesses pessoais, poder, corrupção e manipulação das massas. Oportunidades de corrupção, falta de transparência e a capacidade de manipular informações são algumas das razões pelas quais o mal pode ter uma vantagem. Além disso, as pessoas nem sempre têm acesso a informações precisas ou são facilmente influenciadas por discursos emocionais e promessas vazias. A visão hobbesiana da natureza humana tende a ser pessimista, caracterizada pela ideia de que os seres humanos são inerentemente egoístas, competitivos e propensos à violência. Thomas Hobbes, um filósofo político do século XVII, argumentava que, na ausência de um governo forte para impor ordem e segurança, a vida dos indivíduos seria "solitária, pobre, sórdida, brutal e curta". Essa perspetiva pessimista sobre a natureza humana fundamentou a defesa do contrato social e da necessidade de um Estado forte para garantir a paz e a estabilidade.

A questão da natureza humana é debatida há séculos. Alguns argumentam que os seres humanos têm uma tendência inata para o mal, enquanto outros defendem que há uma inclinação para o bem. Na realidade, é uma combinação complexa de ambos, e o comportamento humano é influenciado por uma variedade de fatores, incluindo genética, ambiente, cultura e experiências pessoais.

quarta-feira, 3 de abril de 2024

A guerra, a tropa, e as teorias da conspiração



Se Gouveia e Melo tem legitimidade para apelar ao regresso do SMO, muitos de nós não. Em Portugal, a obrigação legal de prestação de serviços às Forças Armadas terminou efetivamente em 2004, altura em que foi substituída pelo Dia da Defesa Nacional e pelo apoio patriótico à seleção de futebol, à época comandada pelo sargentão Scolari. Os jovens que hoje seriam chamados para prestar o serviço nasceram todos depois do seu fim. Tanto a geração que se baldava por causa de alegadas dores nas costas, como a minha, que foi meramente convidada a fazer uma visita de estudo à base naval do Alfeite, com direito a sandes mista em forma de triângulo, não têm autoridade para obrigar os putos de hoje a acordar às seis da manhã para fazer a cama. Não é concebível convocarmos os outros para o dever quando só conhecemos as armas pelo Call of Duty.

Em dezembro de 2023, o Ministro de defesa alemão, um socialista, disse que a Europa se devia preparar para o risco de guerra até ao final da década. Em finais de março de 2024 foi Donald Tusk, primeiro-ministro polaco, conservador e ex-presidente do Conselho Europeu, que veio dizer que entrámos em modo de pré-guerra. Não porque esteja iminente, mas porque pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial o risco de conflito no continente é real. 

Em fevereiro de 2024 já Ursula Von der Leyen tinha dito, em Estrasburgo, que “o risco de guerra não é iminente, mas não é impossível”. Nessa altura também o ministro da defesa da Dinamarca, um liberal e conservador, havia dito que não se podia descartar que daqui a três a cinco anos a Rússia pusesse à prova o Artigo 5º e a solidariedade da NATO. Nos últimos tempos, chefes militares noruegueses disseram coisas parecidas, a Estónia está a fazer bunkers, a Letónia repôs o Serviço Militar Obrigatório e a Lituânia discute alargar a base de recrutamento do serviço militar.

O que importa retirar de todas estas declarações de políticos e militares de países geograficamente próximos da Rússia não é uma tese conspirativa, uma suspeita de haver gente com vontade de mandar ir para a guerra ou entrar em pânico. 
Na luta pelo poder há sempre quem conspire. Assim, um político detentor do poder, por razões de Estado, precisa de ter algumas qualidades, como a dissimulação, seja por Razões de Estado, seja por razões do interesse de todos. Os conspiradores, geralmente contrários ao interesse nacional, boicotam. Agora, se são as teorias da conspiração que fabricam paranoicos, ou se são os paranoicos que são dados a fabricar teorias da conspiração, é já um assunto para especialistas em idiossincrasias do domínio da mente humana.

O que é verdadeiramente impressionante é a perceção partilhada por estes atores de que a Rússia de Putin pode se sentir tentada a concretizar objetivos políticos pela força das armas, convencida que a Europa, e a NATO, não estarão disponíveis para combater por gente e territórios que antes de 1989 estavam do outro lado do Muro de Berlim. A Rússia, em fevereiro de 2022 não esteve com meias medidas, e invadiu a Ucrânia. A Ucrânia era território que lhe pertencia, ou melhor, sempre foi russo.  Para além de não querer no território muito próximo de Moscovo uma democracia liberal de feição ocidental, quando percebia que se estava a desmoronar numa dissolução decadente. Mas os atuais líderes europeus também perceberam muito bem o que Putin quer. 

O Príncipe, de Maquiavel, é um dos manuais políticos mais estudados no Ocidente, e tido em conta pela maioria de todos os líderes políticos depois dele. Descreve as estratégias mais eficazes para se chegar ao poder, e depois de alcançado, como o príncipe o deve manter. Não se deve confundir “maquiavélico” com mefistofélico”. Mefistófeles é uma personagem demoníaca do Fausto de Goethe. A expressão “maquiavélico” está para Maquiavel, assim como a expressão “marxista” está para Marx. Pouco tem a ver com eles. São conceções deturpadas. Daí dizer-se: nem Marx seria marxista, e Maquiavel nunca foi maquiavélico.

A principal ideia em "O Príncipe" é que um governante deve estar disposto a usar qualquer meio, se for necessário, para manter o poder a fim de garantir a estabilidade do Estado. Ora, “o necessário” pode ser algo que envolva ações antidemocráticas e amorais para salvar a integridade do Estado. Maquiavel é enfático na importância da astúcia, da força, e da habilidade política para governar eficazmente.


Em tempos de crise, é comum que as pessoas sintam mais ansiedade e preocupação, o que pode levar algumas delas a desenvolverem sintomas de paranoia. A incerteza e o medo do desconhecido podem intensificar esse tipo de comportamento em algumas pessoas. No entanto, nem todas as pessoas reagem da mesma maneira às crises; algumas podem lidar melhor com a incerteza do que outras.

Existem certos traços de personalidade e condições psicológicas que podem tornar uma pessoa mais suscetível à paranoia. Alguns desses fatores incluem traços de personalidade pré-existentes como personalidade paranoica, desconfiança excessiva, sensibilidade à crítica, baixa autoestima e dificuldade em confiar nos outros. Na síndrome pós-traumática, indivíduos que passaram por experiências traumáticas no passado, como abuso físico, emocional ou sexual, podem ter uma predisposição maior para desenvolver sintomas de paranoia. Situações de stress, como crises financeiras, problemas de saúde, conflitos interpessoais ou eventos traumáticos também podem desencadear ou exacerbar sintomas de paranoia em algumas pessoas.

É importante notar que a paranoia pode variar em gravidade e manifestação de pessoa para pessoa, e nem todas as pessoas com os fatores acima desenvolverão sintomas de paranoia. O tratamento adequado, como terapia cognitivo/comportamental e, em alguns casos, medicação, pode ajudar a gerenciar os sintomas e melhorar a qualidade de vida das pessoas que sofrem de paranoia.

É comum pessoas com tendências paranoicas serem mais suscetíveis a teorias da conspiração. Isso ocorre porque a paranoia pode levar alguém a interpretar eventos de forma distorcida e acreditar em explicações complexas e conspiratórias para o que está acontecendo ao seu redor, mesmo na ausência de evidências sólidas. Teorias da conspiração são explicações alternativas e muitas vezes sem embasamento factual para eventos históricos, políticos, sociais ou científicos. Elas sugerem que um grupo secreto de pessoas ou entidades está conspirando para manipular eventos em benefício próprio, frequentemente envolvendo supressão de informações, manipulação dos órgãos de comunicação social e controlo da sociedade. Essas teorias geralmente carecem de evidências sólidas e são amplamente consideradas como especulações infundadas ou crenças irracionais. Suas crenças podem variar amplamente, desde teorias sobre governos mundiais secretos. Alguns teóricos da conspiração são motivados por um desejo de entender melhor o mundo, enquanto outros podem ser impulsionados por paranoia ou desconfiança extrema.

segunda-feira, 1 de abril de 2024

Os moderados de 1938. Munique e a questão dos Sudetos

 

Em novembro de 1937, Halifax, líder da Câmara dos Lordes que em breve se tornaria secretário do Exterior, preparava-se para visitar Hitler. Esperava chegar a um acordo com o ditador alemão em relação à Europa Central. Era o primeiro passo numa política de apaziguamento mais ativa, que refletia a iniciativa do novo primeiro-ministro britânico, Neville Chamberlain, que substituíra Baldwin em 28 de maio. Em dezembro do ano anterior, o rei Eduardo VIII, mais tarde conhecido como Duque de Windsor, renunciou ao trono em 20 de janeiro de 1936, em favor de seu irmão Jorge VI, para se casar com uma americana divorciada, Wallis Simpson. 



Halifax aquando da visita a Hitler

Ao se avistar com Hitler em 19 de novembro, o próprio Halifax deu a entender que o governo britânico aceitaria uma mudança mediante a “evolução pacífica” da situação da Áustria, da Checoslováquia e de Danzig, embora desejasse evitar “perturbações de maiores consequências”. Isso era tudo o que Hitler queria ouvir. Respondeu que não tinha o menor desejo de anexar a Áustria ou torná-la politicamente dependente da Alemanha. Nos bastidores, porém, continuou a trabalhar com esse objetivo. Halifax registou em seu diário que considerou Hitler “muito sincero” e desejoso de relações amistosas com a Inglaterra. O culto aristocrata britânico estava sem dúvida nenhuma fora de seu habitat natural ao tratar com um líder político cuja solução para os problemas da Inglaterra na Índia era, declaradamente, abrir fogo contra Gandhi e várias centenas de membros do Partido do Congresso Nacional Indiano até a ordem ser restaurada. De volta a Londres, Halifax garantiu aos ministros que Hitler não tinha em mente nenhuma “aventura imediata” e sugeriu dar-lhe de presente algum território colonial para torná-lo mais tratável na Europa.

Duas semanas antes da renúncia de Baldwin, a coroação de um novo rei, Jorge VI, pai da que viria a ser a rainha Isabel II, fora uma momentânea exibição de união patriótica no país, que se recuperava da depressão económica e evitara o extremismo político que tomava conta de grande parte da Europa.



O rei Jorge VI com Churchill

Chamberlain considerou a visita “um êxito completo”. Numa carta privada, escreveu à irmã que, embora os alemães desejassem dominar a Europa Oriental, ele não via motivo para não chegar a um acordo caso a Inglaterra desse garantias de que nada faria para impedir mudanças por via pacífica e a Alemanha rejeitasse o uso da força no trato com a Áustria e a Checoslováquia. O ministro que mais se opunha a essa nova forma, mais ativa, de apaziguamento — a busca de um entendimento com a Alemanha mediante relações bilaterais e a aceitação de mudanças territoriais na Europa Central — era o secretário do Exterior, Anthony Eden, que desde janeiro de 1938 se encontrava doente e convalescia no sul da França. Em sua ausência, a condução das relações exteriores estava nas mãos do próprio Chamberlain. Desgastado e em conflito permanente com o primeiro-ministro, Eden renunciou ao cargo em 20 de fevereiro de 1938. Seu sucessor foi Halifax.

Quando os franceses perguntaram se a Checoslováquia, poderia contar com o apoio da Inglaterra, assim como o da França, caso viesse a ser alvo de agressão, Chamberlain evitou comprometer-se, limitando-se a dizer que a Checoslováquia ficava a “uma distância muito grande” e era um país “com o qual não tínhamos muita coisa em comum”. A Itália estava sendo atraída cada vez mais para o abraço de ferro da Alemanha. Em janeiro de 1938, o Exército italiano recebeu, pela primeira vez, uma diretriz que previa um alinhamento dos dois países contra a Inglaterra e a França. Conscientes da precariedade de seu programa de rearmamento, as Forças Armadas italianas só podiam pedir aos céus que a guerra não viesse logo.

Em Moscovo, Stálin passara grande parte de 1937 demolindo o comando do Exército Vermelho com os expurgos. Para os observadores externos, parecia rematada loucura. Essa era a opinião de Hitler. “Deve ser exterminado”, comentou ele com Joseph Goebbels, seu ministro da Propaganda. Contudo, a União Soviética não estava ainda nos cenários que exibira aos comandantes militares um mês antes. Para os dirigentes soviéticos, era inevitável a guerra com as potências capitalistas, entre as quais eles incluíam a Alemanha e a Itália. Viam o fascismo como a forma mais extrema e agressiva de capitalismo. 
A única dúvida era quanto à data em que ocorreria a guerra. Quanto mais pudesse ser protelada, melhor seria para a União Soviética. Havia um longo caminho a percorrer antes que sua máquina militar estivesse pronta.

Nas capitais dos países da Europa Central e Oriental, em fins de 1937, os governantes locais estavam mais que conscientes de uma drástica alteração do equilíbrio de poder e da limitação de suas próprias opções. Era óbvio que dependiam de iniciativas das grandes potências europeias, que eles não podiam controlar. A ideia de segurança coletiva por meio da Liga das Nações estava morta e enterrada havia muito, como mostrara a invasão da Abissínia. A França, antes fiadora de proteção por meio de sua rede de alianças, estava gravemente debilitada. Suas divisões internas e seus problemas económicos saltavam aos olhos. A Inglaterra, evidentemente, deixou de se interessar pela Europa Central, e a influência política e económica da Alemanha estava preenchendo o vazio deixado. Interesses nacionais, assim como suspeitas ou inimizades mútuas, representavam entraves à cooperação militar. Enquanto isso, o poderio alemão crescia visivelmente, sendo a Europa Central o alvo mais óbvio de quaisquer ações expansionistas. A Áustria, que não tinha mais a proteção da Itália, seria, quase com certeza, o primeiro alvo da Alemanha. Um movimento nesse sentido certamente ocorreria em breve.

Desde julho de 1937, o Japão, cada vez mais beligerante, vinha travando uma guerra feroz contra a China. O mundo assistia, chocado, às atrocidades cometidas, entre as quais, em dezembro, a horrenda chacina, em Nanquim, de civis chineses por enlouquecidas tropas japonesas. Esses factos contribuíam para um declínio paulatino, embora vagaroso, da atitude isolacionista dos Estados Unidos, onde o presidente Roosevelt já havia chamado a atenção, três meses antes, para a necessidade de “pôr em quarentena” as potências agressoras que ameaçavam a paz mundial. Por ora, e para a frustração dos britânicos (cujos interesses no Extremo Oriente seriam ameaçados diretamente por agressões japonesas), os Estados Unidos não esboçavam reação alguma. Ainda assim, o ano de 1937 assistiu ao começo do confronto no Pacífico entre o Japão e os Estados Unidos, que acabaria levando os dois países a um conflito global. E foi também em 1937 que Roosevelt começou a perceber a necessidade de persuadir a opinião pública americana de que qualquer agressão alemã na Europa não deixaria de ter consequências para os Estados Unidos.

Em 4 de fevereiro de 1938, foram anunciadas em Berlim importantes mudanças na cúpula do Reich alemão. O ministro da Guerra, Blomberg, e o comandante supremo do Exército, Fritsch, tinham sido destituídos. O próprio Hitler assumira a chefia do alto-comando reestruturado da Wehrmacht. Por conta disso, sua supremacia tornou-se ainda maior, ao passo que a posição do comando militar ficou muito enfraquecida. O número daqueles que manifestavam temores de ser arrastados a uma guerra contra as potências ocidentais era enormemente inferior ao dos correligionários de Hitler, conquistados pelos gigantescos gastos em rearmamento, pela recuperação do prestígio e pela afirmação da posição internacional da Alemanha. A política externa agressiva, que explorava as fraquezas e as divisões das democracias ocidentais, havia feito com que o líder caísse nas boas graças do povo. As massas lhe conferiram o apoio plebiscitário que incrementava o seu prestígio no país e no exterior. O potencial de resistência organizada fora sufocado havia muito tempo. Somente um golpe militar poderia desafiar de facto o poder de Hitler. E disso ainda não havia sinal.

Hitler tinha agora representantes em posições chave, homens sintonizados com a sua política externa de alto risco. Ribbentrop era conhecido por replicar as ideias de Hitler. Outras mudanças ocorreram nos altos escalões da burocracia e do corpo diplomático. O governo austríaco rendeu-se à intensa pressão de Berlim, tropas alemãs cruzaram a fronteira da Áustria e as leis que incorporariam o país a uma Grande Alemanha foram preparadas. Em 15 de março, diante de uma multidão em êxtase na Heldenplatz, em Viena, Hitler anunciou “a entrada de minha terra natal no Reich Alemão”. Como ele previra, as democracias ocidentais protestaram timidamente, porém nada fizeram. Tampouco a brutal perseguição de judeus austríacos e de adversários políticos dos nazis, que logo se seguiu, provocou alguma reação em Paris ou Londres ou anulou as esperanças de Neville Chamberlain de que talvez fosse possível “para nós, um dia, retomar negociações de paz com os alemães”.

O caso da Checoslováquia era diferente. A posição geográfica lhe conferia uma importância vital. O país tinha uma aliança com a França e outra com a União Soviética. E a França era aliada da Inglaterra. Um ataque à Checoslováquia poderia precipitar uma guerra europeia generalizada. Da perspectiva alemã, os vínculos da Checoslováquia, um país da Europa Central, com o oeste e o leste do continente constituíam um problema estratégico potencialmente sério. Suas matérias-primas e seus armamentos seriam valiosíssimos para os preparativos bélicos da Alemanha. Entretanto, atacar a Checoslováquia era uma aventura de alto risco, que poderia arrastar o país à guerra com as democracias ocidentais — uma guerra que alguns de seus comandantes militares, como o general Ludwig Beck, chefe do Estado-Maior do Exército, tinham a certeza de que o país não poderia vencer.

A Checoslováquia, porém, não podia contar com proteção. Mesmo enquanto a Alemanha engolia a Áustria, o ministro da Defesa francês, Édouard Daladier, avisava a seu governo que a França não poderia oferecer nenhuma ajuda militar direta; da mesma forma, os comandantes militares soviéticos descartavam qualquer possibilidade de o Exército Vermelho socorrer a Checoslováquia. Semanas depois, o governo francês soube que a Inglaterra não daria garantia alguma de empreender ações militares se os alemães atacassem a Checoslováquia. Em meados de 1938, as potências ocidentais tomaram posição. A França, por mais que afirmasse seu apoio à Checoslováquia, não agiria sem a Inglaterra; e a Inglaterra não acenaria com nenhuma perspectiva de intervenção militar. Os checos estavam entregues à própria sorte.


Entrada triunfal de Hitler nos Sudetos

E havia o problema dos Sudetos. Quando Hitler alegou que não desejava nada além de trazer os alemães perseguidos “de volta ao Reich”, foi como se, mais uma vez, ele não passasse de um político nacionalista, embora extremado e absolutamente intransigente, em busca do objetivo limitado de incorporar ao Reich outro bloco étnico alemão. A falta de compreensão das motivações de Hitler era um componente crucial da crescente tragédia da Checoslováquia. A agressividade da Alemanha, a impotência da Checoslováquia e a apatia anglo-francesa desempenharam um papel no drama que estava levando a Europa em direção a outra guerra. Os preparativos para o ataque previam a data de 1 de outubro, no mais tardar. Para consumo público, Hitler aumentou o volume de suas agressões verbais cada vez mais desabridas ao governo checo e afirmou em público que não tinha outras exigências territoriais na Europa além da solução do problema dos Sudetos.

Acreditando que desejava a incorporação dos Sudetos à Alemanha e nada além disso, Neville Chamberlain viajou duas vezes a Berlim, em meados de setembro, para reunir-se com o ditador. Ao retornar de sua primeira viagem, no dia 15, mostrou-se otimista quanto à perspectiva de um acordo próximo: os checos cederiam os Sudetos e Hitler renunciaria ao uso da força. Em conversas reservadas, opinou que o alemão, embora duro e implacável, “era um homem em cuja palavra se podia confiar”. Muito em breve o primeiro-ministro britânico se desiludiria quanto à presunção da boa-fé de Hitler. Em 21 de setembro, com imensa relutância e um profundo sentimento de terem sido traídos, os checos enfim capitularam ao diktat anglo-francês. Para Hitler, contudo, isso não bastou. Em sua segunda reunião com Chamberlain, em 22 de setembro, ele repudiou o que o primeiro-ministro britânico julgara ser um acordo, definido uma semana antes. Agora exigia que os checos aceitassem a ocupação alemã dos Sudetos em 1 de outubro; caso contrário, tomaria a área à força. E ainda declarou ser indiferente às advertências da Inglaterra de que isso poderia levar à guerra com as potências ocidentais.

Hitler tinha ido além dos limites toleráveis por certos membros do gabinete de Chamberlain, entre os quais o secretário do Exterior, Lord Halifax. Em 25 de setembro, eles se opuseram à aceitação do ultimato alemão. Franceses e britânicos concordaram em enviar um emissário a Berlim a fim de advertir Hitler de que, se atacasse a Checoslováquia, haveria guerra. Os franceses começaram a se mobilizar, assim como os soviéticos. Os britânicos prepararam a esquadra. A guerra parecia cada vez mais provável. Fizeram-se tensos esforços para convocar uma conferência que levasse a um acordo. Por fim, Mussolini interveio para intermediar uma conferência entre Alemanha, Itália, Inglaterra e França. A União Soviética, que não contava com a confiança de ninguém, ficou de fora. Com isso, abriu-se o caminho para o desfecho do drama no Acordo de Munique, assinado em 30 de setembro de 1938. Os checos não estiveram representados no encontro das grandes potências, reunidas para dividir o país. As duas democracias ocidentais forçaram outra democracia a se submeter à intimidação de um ditador.

A Inglaterra e a França não teriam obtido melhores resultados lutando em 1938, apesar das advertências dos comandantes militares, do que esperando mais um ano? De facto, só em 1939 os gastos militares dos dois países quase igualaram os da Alemanha, e apenas naquele ano as duas democracias iniciaram um sério planeamento de guerra. Todavia, também a Alemanha se rearmou fortemente em 1939, e ficou muito mais equipada para a guerra do que estivera. Esse estado de coisas foi reforçado pela destruição do poderio militar checo e pela aquisição de novas fontes de matérias-primas e de armamento na antiga Checoslováquia. O desastre de Munique podia ter sido evitado. Winston Churchill, que durante muito tempo se manifestara contra o apaziguamento, mas como uma voz bastante isolada, defendera abertamente, em 1938, uma “grande aliança” com a União Soviética e os países da Europa Oriental para deter Hitler.