terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Albert Camus





Albert Camus (7 de novembro de 1913 - 4 de janeiro de 1960) - escritor que recebeu o Prémio Nobel da Literatura em 1957 - nasceu na costa leste da Argélia, perto de Bône (atual Annaba), filho de pais Pieds-Noirs, Camus passou a infância em bairros pobres e operários. Frequentou o Grande Liceu de Argel e posteriormente entrou na Universidade de Argel, onde teve como professor de filosofia Jean Grenier. Depois de ter adoecido com tuberculose, fez a sua estreia jornalística e literária com duas das suas maiores obras: O Estrangeiro e O Mito de Sísifo.

De seu pai, Camus conhecia apenas algumas fotografias, os estilhaços que o exército enviou à viúva, os relatórios de administração das vinícolas e os dois cartões postais que enviou da metrópole, o primeiro em agosto de 1914 em Noisy-le-Sec, o segundo em setembro para o hospital de Saint-Brieuc. Ele se lembrará particularmente de duas mensagens pedindo moderação e denunciando a barbárie. A primeira marca a indignação do pai com a crueldade revanchista da guerra marroquina. A segunda é uma denúncia da pena de morte:
«Lembrei-me naqueles momentos de uma história que a minha mãe me contava sobre o meu pai. Eu não o conhecia. Tudo o que eu sabia sobre esse homem talvez fosse o que minha mãe me disse na época: ele tinha ido ver um assassino executado. Ele estava doente para ir. Ele tinha feito isso e, na volta, vomitou parte da manhã»
Em 1935, ele entraria para o Partido Comunista, movido por um sentimento de justiça e por desejo de igualdade. Embora fosse um pied noir pobre que – como ele próprio definira – criado entre o sol e a miséria –, a pobreza, assim como a dos demais brancos pobres da Argélia, jamais fora tão aguda quanto a que ele observava existir entre os árabes. Foi essa constatação que o levou a escrever “Miséria na Cabília”, um dos seus primeiros artigos publicados em jornais de Argel. Mas a passagem pelo PC foi rápida, deixando o partido dois anos depois e tornando-se um jornalista engajado na resistência durante toda a Segunda Guerra Mundial. Foi durante esse período que Camus iria escrever “O mito de Sísifo” e o belíssimo romance “O Estrangeiro”, ambos em 1942, além da peça Calígula, dois anos após.

Camus marcou posição sobre a questão da independência argelina. Depois de dois anos no Partido Comunista, bateu com a porta. 
Protestou sucessivamente contra as desigualdades e a miséria que afligiam os povos indígenas do Norte de África. Mas também defendeu os espanhóis exilados antifascistas que também haviam rompido com fortes críticas ao estalinismo. À margem de certas correntes filosóficas, Camus foi, antes de tudo, "testemunha do seu tempo e nunca deixou de lutar contra ideologias e abstrações que nos desviavam do humano". Assim, ele é levado a se opor ao liberalismo, bem como ao existencialismo e ao marxismo. Com o lançamento do L´'Homme Révolté, em 1951, a sua crítica à legitimação da violência do regime soviético na Rússia, valeram-lhe os anátemas que os intelectuais comunistas lhe lançaram, a começar por Jean-Paul Sartre com quem rompeu a sua amizade.

Desconfiado de abstrações ideológicas, já em 1945, Camus descartava qualquer ideia de revolução definitiva e enfatizava os riscos do desvio revolucionário. Segundo ele, os fins nunca justificam os meios. Um homem de esquerda moderada, posiciona-se à distância da esquerda comunista e da direita liberal de Raymond Aron. Camus durante os seus 46 anos de vida não deixou de tomar posição e de defender aquilo que julgava ser a verdade, ainda que essa opção o tenha obrigado, por diversas vezes, ao isolamento e à solidão. No universo intelectual francês do século XX, Camus era um fora de jogo. Nascido na Argélia, em 1913, em uma família muito pobre, ele não iria frequentar as grandes escolas onde eram, e ainda são, formadas as elites francesas, independentemente da sua orientação ideológica. Talvez por isso, Camus jamais teve comprometimento com qualquer ideologia, o que era surpreendente em um período da história marcado por elas.

Logo após o fim da Segunda Guerra, Camus iria gozar de alguma reputação entre a intelectualidade francesa na condição de editor do jornal Le Combat e de autor do romance A peste (1947). Entre Camus e Sartre, haveria alguma aproximação, que logo iria se romper com a publicação da peça Os justos (1950) e do livro O homem revoltado (1951), em que Camus distinguiria claramente a revolta legítima contra a injustiça da revolução, que levaria sempre ao niilismo, ao terror e à repressão. Em uma entrevista falando sobre o livro que acabava de lançar, Camus faria a seguinte declaração:
«Eu não critico o sistema revolucionário em si mesmo, mas o sistema revolucionário triunfante do nosso tempo. A revolução do século XX e a sociedade burguesa atual são para mim apenas as duas faces do mesmo niilismo que temos de superar. Parece-me que meu livro, longe de definir uma posição romântica e idealista, é, ao contrário, um apelo contra o romantismo filosófico e a mistificação, que fazem do materialismo histórico um idealismo vergonhoso. Não creio, entretanto, que a minha causa já esteja perdida. Ela está viva, como vivo é o sofrimento de milhões de homens ligados pela sua infelicidade a essa causa.»
Além de desqualificar a revolução como alternativa libertária para a humanidade, Camus seria ainda um dos primeiros a reconhecer publicamente a existência de campos de concentração na União Soviética, algo que a esquerda, em geral, só admitia ter existido na Alemanha nazi, mas jamais na pátria mãe do socialismo. Toda denúncia contra a União Soviética era então interpretada como maquinação da direita, e uma intensa disputa passou a se travar na imprensa, tendo, de um lado, Camus, na redação de Le Combat, e, de outro, Sartre, no Les Temps Modernes. O desprezo de Sartre por Camus seria compartilhado por muitos outros intelectuais franceses, que se negavam a reconhecê-lo como um dos seus pares.

Não só as origens de Camus o diferenciavam da maioria dos intelectuais da França, como também os seus hábitos e gostos. Camus gostava de lutas de boxe, de jogar futebol e tomar banho de mar no Mediterrâneo, algo absolutamente estranho aos intelectuais da época, que sobrevalorizavam o intelecto e desprezavam o corpo e as atividades físicas. Costumava ainda olhar as mulheres passarem na rua e usava roupas um tanto extravagantes para os padrões da época, contrariamente ao singelo desalinho e circunspeção dos intelectuais franceses. Por tudo isso, Camus era visto como um ser vulgar, um pied noir intruso no seleto grupo literário e intelectual de Paris. Além disso diferenciou-se da maioria dos intelectuais do seu tempo por sua posição em relação à Guerra da Argélia. Por maior que fosse a sua solidariedade com o povo magrebino, Camus sabia que, com a independência da Argélia, para todos aqueles franceses que como ele haviam nascido e vivido na Argélia há gerações, não haveria outra alternativa senão a emigração ou a morte (la valise ou le cercueil). Portanto, Camus não poderia alinhar-se com a maioria dos intelectuais franceses que defendia a independência da Argélia, tampouco poderia negar a justiça do anseio da maior parte dos argelinos por sua independência, já que a dominação francesa na região havia condenado a população berbere a uma miséria vergonhosa. Por isso, ele declararia um dia sem hesitar: “entre a justiça [a independência da Argélia] e minha mãe [uma pied noir], eu fico com minha mãe”.

A Academia de Ciências da Suécia concedeu-lhe o Prémio Nobel da Literatura pelo conjunto de sua obra literária, o que certamente deve ter causado inveja a muitos escritores franceses que se julgavam mais importantes do que ele. 
L’Étranger (1942) / O Estrangeiro, de Albert Camus, contém uma crítica às sociedades fechadas e à repressão da individualidade dissidente das convenções sociais dominantes. Meursault, personagem central do livro, personifica, de alguma forma, o tipo de comportamentos que as sociedades abertas devem tolerar, não reprimir. Devido ao seu estilo de vida, sentia-se (e era visto) como um estrangeiro na sociedade onde vivia, a Argélia colonial francesa da época entre as duas guerras. Meursault habitava nas margens da sociedade e não partilhava de muitas das suas convenções. A dissidência e o sentimento de estrangeiro são simbolizados pelo homem que não chora no funeral da mãe.

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