quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

União Soviética de Stalin, a Itália de Mussolini e a Alemanha de Hitler



As três ditaduras dinâmicas — a União Soviética de Stalin, a Itália de Mussolini e a Alemanha de Hitler — eram na prática formas de governo bastante distintas, embora tivessem alguns aspetos estruturais em comum. O regime de Stalin distingue-se claramente dos outros dois, que partilham um maior número de características (além do facto de a Alemanha nazi ter tomado “emprestados” alguns elementos da Itália fascista), ainda que também apresentem diferenças cruciais. O único dos três regimes a declarar explicitamente que estava construindo um “estado totalitário” foi o de Mussolini. No entanto, a “reivindicação total” teve, de forma incontestável, consequências tremendas para o comportamento dos cidadãos em sociedades orquestradas e controladas de forma tão rígida.

Em cada um dos três regimes tentou-se, incessantemente, moldar atitudes e comportamentos de acordo com princípios ideológicos excludentes. A identidade com o regime era sustentada e fortalecida pela ênfase no “inimigo interno” — os “excluídos”, cuja própria existência levou à criação de uma comunidade de “incluídos”, aqueles que estavam “integrados”. A sociedade italiana foi a que menos se impregnou dos valores do regime; e o grau de impregnação, com toda probabilidade, foi maior na Alemanha.

Com base nos indicadores disponíveis, a Alemanha nazi teve o mais alto nível de apoio popular, e a Itália ficou a certa distância, enquanto a União Soviética tinha a maior população coagida, o que parece indicar um menor índice de apoio autêntico. Para as pessoas aterrorizadas pelo Estado policial, as diferenças ideológicas ou estruturais entre os regimes eram uma questão da mais absoluta indiferença. A União Soviética exercia um extraordinário nível de terror dirigido a seus próprios cidadãos, muito mais que os outros dois regimes, uma dissuasão arbitrária e imprevisível não repetida em nenhum outro lugar. O terror nazi concentrava-se em sufocar a oposição política organizada e, cada vez mais, em minorias fracas e pequenas — em especial os judeus e outros grupos raciais ou sociais “excluídos”.

Depois de mais de uma década de governo fascista, a lacuna entre a retórica e a realidade era considerável, e o objetivo de uma totalidade de Estado e sociedade permaneceu ilusório. Havia pouca determinação impulsora por trás das ações do regime. Mesmo a guerra colonial e a vitória na Abissínia, embora o triunfo fosse bem-visto, tiveram somente um efeito superficial sobre a postura dos italianos e mobilizaram a população por pouco tempo. Apesar da beligerância de Mussolini e da cúpula fascista, havia pouco interesse pela perspetiva de guerra e glória militar, e com certeza pouca disposição de suportar as agruras e o sofrimento de um conflito.

Ao contrário do que ocorria na Itália, o impulso ideológico na União Soviética era fortíssimo. Avanços colossais, a um enorme custo humano, tinham sido feitos para mobilizar a economia estatal, reestruturar a produção agrícola e industrializar o país em ritmo mais que acelerado. Por trás da notável rapidez dessas medidas estava a presunção de uma guerra que não demoraria a acontecer. Todavia, à diferença da Alemanha e até da Itália, o foco estava na preparação da economia e da sociedade para a defesa militar da União Soviética, e não para a agressão externa (embora a ocupação dos países bálticos e, talvez, do oeste da Polónia fosse levada em conta, confessadamente, como parte da construção de um cordão defensivo). A União Soviética não se achava, de maneira alguma, pronta para um conflito de vulto, embora o próprio Stalin infligisse sérios desfalques ao Exército Vermelho com os grandes expurgos.

O dinamismo ideológico de Hitler avulta sobre o dos outros dois regimes, tanto na nitidez do foco de sua perseguição cada vez maior dos “inimigos” externos, sobretudo os judeus, como em sua intensa preparação para o conflito militar num futuro próximo — preparações que eram de natureza claramente agressivas, e não defensivas. A Alemanha tinha a economia mais avançada da Europa, uma economia que vinha sendo orientada rapidamente e cada vez mais para a guerra. E contava também com a mais eficiente liderança militar.

Juntas, as três ditaduras viriam a desempenhar um papel fundamental no desenho do continente europeu nos anos vindouros, mas os governantes das democracias ocidentais consideravam, corretamente, que a maior ameaça era a Alemanha. Na época, Stalin era visto como um perigo sobretudo para seu próprio povo, enquanto Mussolini era uma ameaça em especial para os povos subjugados das colónias italianas na África e fonte de imprevisibilidade no Mediterrâneo. Hitler ameaçava os judeus alemães, mas, da perspetiva internacional, era acima de tudo um perigo gigantesco e crescente para a paz na Europa.

O governo britânico, em especial, desconfiava da União Soviética e lhe era antagónico, abominando seu sistema social e vendo com perplexidade os expurgos de Stalin. A Itália era considerada um problema controlável no Mediterrâneo, cada vez mais hostil aos interesses ocidentais, mas não uma ameaça grave por si só. A principal e crescente fonte de preocupação era a Alemanha, com um povo unido e liderado por um ditador de implacável determinação, um país que se rearmava depressa e cujas forças já estavam perto de superar o poderio militar da Primeira Guerra Mundial. Em 1914, a Inglaterra tinha ido à guerra principalmente para evitar que a Alemanha dominasse a Europa e para proteger o seu império de suas pretensões à condição de potência mundial. Tudo indicava que em pouco tempo a história se repetiria.

Mas em julho d 1936 o general Franco lançou sua rebelião contra a república espanhola, e em pouco tempo ganhou o apoio de Hitler e de Mussolini, enquanto Stalin dava apoio às forças republicanas. Os ditadores, em lados opostos da Guerra Civil Espanhola, estavam testando as suas forças. Mais uma vez, as democracias ocidentais revelariam sua fraqueza. O envolvimento das grandes potências na Guerra Civil foi o mais claro sinal, além da tragédia nacional para o povo espanhol, de que a ordem internacional da Europa estava entrando em colapso.

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