quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

A fraqueza da União Europeia

A União Nacional (UN), de Marine Le Pen, e a França Insubmissa (LFI), de Jean-Luc Mélenchon, celebraram ontem na Assembleia Nacional francesa a queda do Governo. Extrema-esquerda e extrema-direita convergiram numa moção de censura que derrubou o Governo de Michel Barnier. Socialistas e ecologistas foram arrastados num negócio que ameaça transformar a crise política numa crise institucional, dobrada por uma crise financeira. Com a abertura da crise política a propósito do orçamento e da lei de financiamento da segurança social, foi Le Pen quem melhor tirou partido da situação. O Governo Barnier sofria de uma dupla fraqueza: a falta de uma maioria presidencial e o enfraquecimento do poder presidencial.



O sistema político europeu, em muitos casos, tem demonstrado uma falta de coesão e clareza diante das ameaças globais, como a ascensão da Rússia de Putin e a crescente assertividade da China. Quando esses riscos se tornam evidentes, muitas vezes as respostas vêm tardiamente, ou são reativas, e não preventivas. Putin, com a sua ambição de restaurar a Rússia como uma superpotência, explorando o vazio de liderança e a fragmentação interna da Europa, já demonstrou a sua estratégia em várias frentes. Ele aposta na fraqueza, nas divisões internas e na falta de unidade, não apenas na Europa, mas também em outras regiões do mundo. Ao tentar expandir a sua influência sobre a Ucrânia, pela subversão ou pela força militar, e ao buscar redesenhar o mapa geopolítico da Eurásia, Putin está criando uma nova ordem que submete a Europa ao seu controle autocrático.

A grande questão é se as sociedades europeias serão capazes de se unir e encontrar a liderança necessária para resistir a essa pressão. Os bons líderes fazem toda a diferença, mas eles precisam de um ambiente que favoreça a sua ascensão, e não um sistema político que favoreça apenas a estabilidade momentânea ou o populismo. A Europa precisa de líderes capazes de confrontar a realidade da mudança do poder global, que não apenas vejam o desafio como uma ameaça, mas também como uma oportunidade para se fortalecer internamente.

E a chave para isso é uma liderança que inspire não só a força militar, mas também a coesão social, económica e política. Quando uma população sente que seus líderes são frágeis ou excessivamente divididos, a confiança esmorece, e a defesa da liberdade e da soberania torna-se mais difícil. A Europa habituou-se a viver à sombra da bananeira americana chamada NATO. Mas Trump voltou a ganhar as eleições e já ameaçou os europeus se quiserem segurança têm que a pagar. Mas também há quem pense que Trump foi bom, porque obrigou os europeus a acordarem e fazerem-se à vida. O impacto de Donald Trump na geopolítica europeia foi profundo, principalmente no que se refere à relação da Europa com os Estados Unidos e à sua posição na NATO.

Ao longo de décadas, os países europeus dependiam dos EUA para garantir a sua segurança, especialmente durante e após a Guerra Fria. Mas, com o foco crescente de Trump em "America First" e em diminuir o papel dos EUA em conflitos fora de suas fronteiras, a Europa está forçada a reconsiderar a sua dependência da NATO e, mais amplamente a estratégia de segurança. Muitos consideram que essa pressão de Trump, embora imposta de forma brusca e, por vezes, desestabilizadora, foi, de certa forma, um "despertar" para a Europa. A ameaça de uma retirada parcial do apoio militar americano, ou de uma diminuição da sua presença na Europa, força os líderes europeus a pensarem mais seriamente sobre a necessidade de uma maior autonomia em termos de defesa. A falta de uma resposta efetiva a isso pode ser vista como uma falha da União Europeia, que ainda não conseguiu criar uma estrutura militar e de defesa realmente independente, o que torna a sua segurança um campo de dependência política e estratégica.

O fator Trump, com sua abordagem pragmática e, por vezes, isolacionista, pode ser um ponto de inflexão que acelera esse processo. De qualquer forma, a Europa, diante das novas circunstâncias, poderá ser forçada a refletir mais seriamente sobre a sua posição no palco mundial e a necessidade de construir um futuro mais independente, tanto militar quanto politicamente.

Mas, além da questão militar, outro desafio será manter a coesão interna da União Europeia. O aumento da autonomia pode ser visto com ceticismo por alguns países. Pode ser que agora com o novo Presidente do Conselho Europeu, que entrou no dia 1 e dezembro deste ano em funções, se consiga uma Europa mais unida, pois ele é muito bom a fazer pontes e a conseguir consensos. É muito hábil nisso, o António Costa, português.

António Costa, como novo Presidente do Conselho Europeu, certamente traz uma abordagem diplomática que pode ser crucial para fortalecer a unidade da União Europeia em um momento de incerteza global. Sua habilidade em construir consensos e formar pontes entre diferentes interesses é uma característica importante, especialmente quando se considera o momento histórico desta Europa, com desafios tanto internos como externos. Costa tem demonstrado ser um líder pragmático, capaz de gerir tensões dentro da política interna de Portugal, e essa experiência pode ser valiosa ao tentar coordenar as políticas de 27 países da UE. Ele já provou ser capaz de negociar com diferentes forças políticas, como se viu em Portugal, onde navegou com sucesso entre a esquerda e o centro. Isso pode ser essencial para lidar com a diversidade de opiniões dentro da UE, que vai desde os países mais orientados para a integração europeia até aqueles que mantêm uma postura mais cética em relação a certas políticas.

Com a crescente ameaça da Rússia e a possível falta de apoio dos EUA sob a presidência de Trump, uma liderança forte e unificada da UE se torna ainda mais necessária. Costa, com sua experiência, pode ser o tipo de líder que a Europa precisa para criar uma visão comum de defesa e segurança, bem como para avançar com reformas que permitam a União Europeia assumir um papel mais independente no cenário global. O seu foco em consensos também poderá ser vital para que se avance no fortalecimento da capacidade militar europeia sem criar divisões internas. A chave será equilibrar a necessidade de autonomia militar com a manutenção das alianças históricas e o respeito pelas diferentes preocupações dos Estados-membros.

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