segunda-feira, 15 de abril de 2019

Leis do Universo e pensamento ‘a priori’


O que tem levado a comunidade científica a procurar a última palavra na experiência, não se contentando apenas com as teorias assentes em equações matemáticas, decorre da sua lealdade para com os empiristas britânicos, os primeiros a serem bem-sucedidos na disputa com os ensinamentos bíblicos judaico-cristãos. No fim de contas, as teorias cosmológicas produzidas pelo pensamento matemático eram do mesmo domínio epistemológico das narrativas dos primeiros capítulos do Génesis, ou seja, derivadas de puro pensamento a priori.

Muitos fundamentalistas cristãos aceitam uma interpretação literal da narrativa da criação dos primeiros dois capítulos do Génesis. Ora esta interpretação recebeu um novo rombo com Darwin, depois de ter publicado o livro seminal da teoria evolucionista ainda hoje intocável nos seus pilares fundamentais: a evolução das espécies por variação e seleção natural. Pelas explicações Darwinistas, os seres humanos não foram concebidos, sendo antes produto do processo cego sem direção da seleção natural, operando sobre uma fonte de variação, como a mutação genética.  A Natureza não tem em mente qualquer propósito. Não tem mente e não tem seja o que for em mente. Não planeia em função do futuro. Não tem qualquer visão, antevisão, não vê coisa alguma. A Natureza tem leis. E o que os humanos fazem, através do que eles chamam ciência, é descobrir essas leis.

A existência dos buracos negros, que até agora era uma entidade teórica a priori, é confirmada por conhecimento a posteriori. Mas provavelmente esta certeza dos buracos negros vai reforçar ainda mais a ideia a priori de que no interior dos buracos negros são geradas estrelas e quiçá universos que se regem por outras leis que não as leis que até agora a ciência tem definido como “as leis da natureza”. Laplace disse em 1796: “Devemos encarar o estado presente do universo como o efeito do seu estado anterior e como a causa do que se lhe seguirá”. Para ele nada seria incerto, e o futuro, como o passado, estaria presente aos seus olhos.

As leis de Newton aplicam-se a sistemas isolados ou fechados; descrevem como o mundo funciona desde que o mundo seja um sistema fechado (isolado), não estando sujeito a qualquer influência causal externa. Mas não faz parte da mecânica newtoniana nem da ciência clássica em geral a declaração de que o universo material é realmente um sistema fechado. Como poderia uma coisa dessas ser verificada experimentalmente? Assim, pelo paradigma newtoniano, as leis dentro de um buraco negro podem ser diferentes de todas as leis postuladas por esse paradigma científico, agora dito “clássico”. A tese de que o universo material é de facto um sistema fechado não faz parte da física clássica; é um acrescento metafísico ou teológico. Esta imagem clássica foi, evidentemente, ultrapassada pelo desenvolvimento da mecânica quântica.

A atitude epistémica dominante na ciência é a investigação empírica crítica que propõe teorias, que por serem hipotéticas estão sujeitas a serem abandonadas por outras mais satisfatórias, e por isso o seu caráter é sempre temporário. Por conseguinte, a ciência, ou antes, a atitude científica, é diferente da crença religiosa, que é dogmática e definitiva. Daí que a ciência e a religião estejam condenadas a um conflito irreconciliável e insanável. Não há maneira de uma pessoa ter uma mentalidade apropriadamente científica, e ao mesmo tempo ser um verdadeiro crente religioso. É claro que, uma coisa é dizer isto assim, outra coisa é dizer que a atitude epistémica científica é a única apropriada a qualquer área do conhecimento. Na verdade, esta afirmação não é em si mesmo produto de qualquer atividade científica que tenha chegado a essa conclusão por métodos empíricos. É uma declaração epistemológica da Filosofia como disciplina do conhecimento e dos primeiros e últimos princípios da existência e essência do ser e das coisas. De um modo geral os cientistas não se colocam na atitude epistémica de questionar todas as suas crenças: científicas e não científicas.

Sem comentários:

Enviar um comentário