segunda-feira, 1 de abril de 2019

Uma via insustentável


          A recente catástrofe climática em Moçambique avisa-nos mais uma vez que temos de nos mexer e mudar esta via insustentável para uma mais sustentável. Caso contrário, algo desagradável irá acontecer. Até agora ainda tem sido possível aos países mais desenvolvidos manter em grande parte as suas amenidades, mas de futuro tal deixará de ser assegurado se não se arrepiar caminho. É duvidoso que o mundo desenvolvido possa manter o seu estilo de vida isolado, não apenas porque o clima não obedece a fronteiras, mas também porque as suas fronteiras rapidamente se desmoronam sob vagas maciças de imigrantes desesperados com fome, fugindo às catástrofes naturais e às guerras nos seus países de origem. Por outro lado, não se vislumbra que a curto prazo a deterioração ambiental, provocada pela poluição industrial e tráfego rodoviário, sobretudo nas megametrópoles, seja revertida.
          Pode haver dois tipos de escolha para o sucesso ou o fracasso:
          Planeamento a longo prazo e vontade de reconsiderar antigos valores. Do mesmo modo, também podemos reconhecer o papel crucial dessas mesmas duas escolhas para o resultado de nossas vidas individuais. Uma dessas escolhas depende da coragem de praticar raciocínio de longo prazo, e tomar decisões antecipadas firmes, corajosas, em um tempo em que os problemas se tornam percetíveis, mas antes de assumirem proporções críticas. Este tipo de tomada de decisão é o oposto da tomada de decisão reativa de curto prazo que muito frequentemente caracteriza os nossos políticos eleitos, concentrando-se apenas em assuntos que possam vir a irromper em crise nos próximos 90 dias. A outra escolha crucial iluminada pelo passado envolve a coragem de tomar decisões dolorosas em relação a valores. Que valores que outrora serviram bem à nossa sociedade podem continuar a ser mantidos sob as novas alteradas circunstâncias? Quais desses valores devem ser alijados e substituídos por abordagens diferentes? Eis a questão!
          Os habitantes dos países mais desenvolvidos vivem numa certa ambivalência em relação aos imigrantes que chegam em busca de um melhor nível de vida. Por um lado, a economia está completamente dependente da mão de obra desses povos, quer na agricultura, quer na construção civil, quer nos serviços domésticos. Mas por outro lado os autóctones queixam-se de que os imigrantes competem com os desempregados locais, fazem baixar os salários e sobrecarregam os sistemas de saúde.
          Os otimistas dizem: "A tecnologia resolverá os nossos problemas." Esta é uma expressão de fé no futuro, portanto baseada no suposto antecedente de ter a tecnologia resolvido mais problemas do que aqueles que criou em passado recente. Está implícita a premissa de que de amanhã em diante, a tecnologia funcionará basicamente para resolver os problemas existentes, e deixará de criar novos. A experiência que se tem de tudo isto é que é o contrário. Algumas tecnologias são bem-sucedidas, outras não. As que são bem-sucedidas geralmente demoraram algumas décadas para se desenvolverem e se espalharem. E mesmo estas, sejam ou não bem-sucedidas na solução dos problemas para os quais foram projetadas, geralmente criam novos e inesperados problemas. As soluções tecnológicas para os problemas ambientais geralmente são bem mais dispendiosas do que as medidas preventivas para evitar a criação de problemas. Acima de tudo, os avanços tecnológicos apenas aumentam a nossa habilidade de fazer coisas, seja para o bem ou para o mal. Todos os nossos problemas atuais são consequências negativas não intencionais de nossa tecnologia existente. Os rápidos avanços tecnológicos durante o século XX criaram problemas novos e difíceis mais rapidamente do que resolvido os antigos.
          Durante os primeiros anos após a entrada em cena dos automóveis, até parecia que as cidades se tornavam mais limpas à medida que os cavalos iam desaparecendo. Ainda hoje se notam vestígios desses tempos quando visitamos o núcleo histórico da cidade de Viena, o cheiro a esterco e urina de cavalo mais a sonoridade dos seus cascos. Embora ninguém esteja advogando a volta ao cavalo como solução para o smog das emissões dos motores a explosão, o exemplo serve para ilustrar o lado negativo não previsto de tecnologias que alguns teimam em preservar.
          Outro exemplo de fé na mudança e substituição é a esperança de que fontes de energia renováveis, como a energia eólica e solar, possam resolver a crise de energia. Tais tecnologias existem, contudo, a energia eólica e solar têm aplicabilidade limitada porque só podem ser usadas em locais com luz e vento constantes. Além disso, a recente história da tecnologia demonstra que o tempo de conversão para a adoção de grandes mudanças pode ser medido em décadas, porque muitas instituições e tecnologias secundárias associadas com a antiga tecnologia têm de ser mudadas. É de facto visível que fontes de energia além dos combustíveis fósseis farão contribuições crescentes para o nosso transporte motorizado e geração de energia. Mas esta é uma solução a longo prazo. Não faz sentido nos contentarmos com o nosso presente conforto quando é evidente que estamos num curso não sustentável.
          O problema além de demográfico é também de desenvolvimento se ele for virtuoso para os países dantes ditos do terceiro mundo. Se estes países alcançarem os padrões de vida do primeiro mundo, o que é legítimo, então a situação se tornará ainda mais insustentável. Até agora, as preocupações ambientais são luxos que só podem ser pagos pelos países ricos, que não têm o direito de dizer aos cidadãos dos países pobres o que devem fazer. Estes povos saberem muito bem como estão sendo prejudicados pelo crescimento populacional, desflorestação, sobrepesca e outros problemas. Eles sabem disso porque pagam a conta imediata, em forma de perda de madeira gratuita com a qual construir casas, grave erosão do solo e a queixa trágica da sua incapacidade de comprar roupas, livros e pagar a escola para os seus filhos. A floresta atrás de sua aldeia está sendo derrubada ou porque um governo corrupto ordenou que fosse derrubada apesar do seu protesto, frequentemente violento, ou porque tiveram de assinar um arrendamento com grande relutância por não ter visto outro meio de conseguir dinheiro necessário para sustentar os seus filhos no ano seguinte.
          Porque será que os níveis desses produtos químicos tóxicos, de nações industriais remotas das Américas e da Europa, podem ser mais elevados nos inuits do que em americanos e europeus urbanos? É porque a base da dieta inuit são as baleias, focas e aves marinhas que comem peixes, moluscos, camarões, e esses produtos químicos se concentram em cada passo desta cadeia alimentar. Todos nós no Primeiro Mundo que ocasionalmente consumimos frutos do mar também estamos ingerindo esses produtos químicos, mas em quantidades menores.
          Quando as pessoas estão desesperadas, subnutridas e sem esperança, culpam os seus governos, que veem como responsáveis ou incapazes de resolver os seus problemas. Depois, ou se matam uns aos outros em guerras civis, ou tentam emigrar a qualquer custo. Dão-se conta de que nada têm a perder, e tornam-se terroristas, ou apoiam e toleram o terrorismo. Alta percentagem da população no fim da adolescência e início da idade adulta transformam-se em hordas de homens jovens desempregados, maduros para serem recrutados em milícias.
          Portanto, globalização quer dizer mais que comunicações mundiais aperfeiçoadas, que podem levar diversas coisas em diversas direções. A globalização não se restringe apenas a coisas boas. Para se entender a escala mundial dos problemas, considere-se o lixo recolhido nas praias dos pequenos atóis no sudeste do Oceano Pacífico: atóis desabitados, sem água potável, raramente visitados até mesmo por iates, e entre os pedaços de terra mais remotos do mundo, cada um deles a centenas de quilómetros até mesmo da remota e desabitada ilha Henderson. Ali, as pesquisas detetaram em média um pedaço de lixo para cada metro linear de praia, que deve ter vindo de navios ou de países asiáticos ou americanos na costa do Pacífico, a milhares de quilómetros de distância. Os itens mais comuns são sacos plásticos, boias, garrafas de vidro e de plástico, cordas, sapatos e lâmpadas, junto com coisas estranhas como bolas de futebol. Outro exemplo sinistro são os mais altos níveis de contaminação por produtos químicos tóxicos e pesticidas registados entre os inuits (esquimós) da Gronelândia Oriental e da Sibéria, que também estão entre os lugares mais afastados das fábricas de produtos químicos de uso intensivo. Os níveis de mercúrio que têm no sangue, porém, atingem as faixas associadas à intoxicação aguda, enquanto os níveis tóxicos de bifenóis policlorados PCBs no leite das mães inuits são altos o bastante para classificar seu leite como alimento tóxico. Os efeitos nos bebés incluem perda de audição, desenvolvimento mental alterado e função imunológica deprimida, daí as altas taxas de infeções respiratórias e do ouvido.

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