segunda-feira, 13 de novembro de 2023

As implicações do Tratado de Versalhes no mundo e na Liga das Nações



O Tratado de Versalhes – tratado de paz que encerrou oficialmente a Primeira Guerra Mundial assinado em 28 de junho de 1919 - foi considerado pela Alemanha como um diktat das nações da Tríplice Entente. Na sequência do armistício, assinado em novembro de 1918, após seis meses de negociações, em Paris, o principal ponto do tratado determinava que a Alemanha, como a causadora da guerra, aceitasse todas as responsabilidades.

Para o líder da maioria no Senado dos Estados Unidos, Henry Cabot Lodge, a luta contra o Tratado e a Liga das Nações era uma luta conservadora republicana do nacionalismo norte-americano contra o internacionalismo. 
 Segundo a historiadora norte-americana Sally Marks, desde os anos 1970, que a Alemanha poderia ter pagado as suas indemnizações, mas optou por não fazê-lo, e por meio de várias táticas, instigada, em especial, pelos britânicos, conseguiu fazer com que a opinião internacional se voltasse contra os franceses e contra as disposições económicas do Tratado de Versalhes.

O britânico John Maynard Keynes teceu fortes críticas às reparações impostas à Alemanha no seu livro 'As consequências econômicas da paz' (1919). Seria absolutamente certo que a Alemanha não iria poder pagar qualquer quantia que se aproximasse daquele total. Keynes escreveu: «Há uma grande diferença entre fixar uma soma definida, que embora grande estivesse dentro da capacidade de pagamento da Alemanha, permitindo-lhe guardar um pouco para si. E estabelecer uma quantia muito superior à sua capacidade de pagar, podendo ser reduzida por uma comissão estrangeira cujo objetivo é obter cada ano o maior pagamento permitido pelas circunstâncias. A primeira hipótese deixaria ainda à Alemanha um modesto incentivo para o empreendimento, energia e esperança. Mas a segunda consiste em tirar-lhe a pele ano após ano, em perpetuidade, e por mais discreta e habilidosamente que isso se faça, tendo o cuidado de não matar o paciente no processo, trata-se de uma política que, se fosse efetivamente sustentada e praticada de modo deliberado, não tardaria a ser considerada pelo julgamento dos homens como um dos atos mais ultrajantes de crueldade de um vencedor, em toda a história da civilização.»

Depois de voltar de Paris, o Presidente dos Estados Unidos, Wilson, destruiu a sua saúde viajando pelo país para mobilizar o apoio público ao Tratado. Em seu último discurso, em 25 de setembro de 1919, após grandes emoções sofre um Acidente Vascular Cerebral (AVC) em Pueblo, Colorado. Ele tinha feito referência à sua visita a um cemitério norte-americano antes de deixar a França. O Tratado não recolocou imediatamente os Estados Unidos no isolamento internacional. Mas no Partido Republicano havia alguns que tinham sido dos maiores defensores da participação na Primeira Guerra Mundial. E alguns dos seus líderes acreditavam numa política externa ativa em tempos de paz, na tradição do ex-presidente Theodore Roosevelt. Na verdade, na convenção republicana em junho de 1920, o próprio Henry Cabot Lodge criticou o isolacionismo, alegando que o mundo precisa muito dos Estados Unidos da América.

A eleição de novembro de 1920 sinalizou uma clara rejeição à política externa de Wilson por parte do público norte-americano. Harding obteve mais de 60% dos votos populares, e os candidatos isolacionistas também ajudaram a colocar o Congresso ainda mais firmemente nas mãos republicanas. Em vez de um tratado de paz, em julho de 1921, uma resolução conjunta do Congresso declarou o fim do estado de guerra entre a Alemanha e os Estados Unidos. A contribuição norte-americana à ocupação Aliada da Renânia tinha diminuído para menos de 10 mil homens, os últimos dos quais foram retirados em fevereiro de 1923. 

O envolvimento dos Estados Unidos nos assuntos da Europa fora revisto no Plano Dawes (1924) e no Plano Young (1930). Era revisto o cronograma de pagamento das reparações da Alemanha. Foi para facilitar o pagamento das dívidas da guerra para com os Estados Unidos. Era para manter a capacidade da Alemanha cumprir com as suas obrigações. Os Planos Dawes e Young também refletiam a dominação norte-americana dos mercados financeiros globais no pós-guerra. A guerra trouxe a rápida transformação dos Estados Unidos, de devedor líquido em principal credor do mundo, e Nova York substituiu Londres como centro da economia mundial. O seu crescimento industrial contrastava fortemente com o mal-estar do pós-guerra na Europa. Em 1929, a produção industrial dos Estados Unidos ultrapassou o seu nível de 1913 em mais de 80%, o suficiente para responder por impressionantes 43% da produção global.

Entre os beligerantes da Primeira Guerra Mundial, o Japão saiu com maiores ganhos a um custo menor do que qualquer outro país, vitórias fáceis que alimentaram a sua arrogância crescente. Entre 1913 e 1929, a produção industrial do Japão mais do que triplicou, mas partia de um ponto tão baixo que a sua base industrial muito menor representou apenas 2,5% da produção industrial do mundo em 1929. Mas a contínua fragilidade industrial do Japão em comparação com os Estados Unidos nada fez para moderar as suas ambições pós-guerra. Uma facção linha-dura dos almirantes japoneses considerou uma derrota quando o Tratado Naval de Washington (1922) deu ao Japão uma frota de 60% das marinhas britânica ou norte-americana, em vez de o igualar. Isso levou o Japão a esperar que um dia iria à guerra com os Estados Unidos.

A decisão Aliada de atender à reivindicação do Japão sobre a península de Shantung desencadeou o Movimento de Quatro de Maio, assim nomeado em função do dia em que a notícia chegou a Pequim (4 de maio de 1919), levando milhares de universitários chineses a se reunir na praça Tiananmen para extravasar a sua frustração contra as potências ocidentais e contra a fraqueza de sua própria República chinesa. Muitos líderes do Movimento Quatro de Maio, recorrendo à Rússia soviética como sua fonte de inspiração, levaram à fundação do Partido Comunista Chinês, em 1921.

Embora Shantung tenha sido o gatilho do Movimento Quatro de Maio, o Japão devolveu a península à China em 1922. Ainda que em troca de novas concessões em outras partes do país. O mesmo aconteceu com outros asiáticos, decepcionados com o Tratado daquele verão de 1919 em Paris. Também se voltaram para o mesmo comunismo depois de se decepcionarem com o Ocidente. O nacionalista vietnamita Ho Chi Minh encaminhou uma correspondência ao secretário de Estado Americano, pedindo a independência do seu país, de acordo com o princípio da autodeterminação nacional. 
Era uma carta dirigida a Robert Lansing, em 18 de junho de 1919. Ho Chi Minh, ainda em Paris para a Conferência de Paz com o “Grupo de Patriotas Anamitas”, já antevia a independência para o Vietname. Apelou aos vencedores da Guerra a conceção de uma lista de “liberdades”. Não obteve resposta. Em 1923, Ho Chi Minh saiu de Paris e dirigiu-se para Moscovo, onde se tornou um agente da Internacional Comunista de Lenin (Comintern). E assim embarcou na sua longa luta por um Vietname independente e comunista. 

Com exceção das terras continentais chinesas incorporadas ao Império Japonês, todas as ex-colónias alemãs estavam tecnicamente sob a tutela de seus novos proprietários na condição do mandatos da Liga das Nações. Todavia, nenhuma recebeu independência antes de 1960. A Namíbia, finalmente a alcançaria 30 anos depois. O atraso decorreu do facto de o mandato do antigo Sudoeste Africano Alemão estar sob a administração da África do Sul. Entretanto, depois da Segunda Guerra, caiu sob controle de um regime de apartheid cujas origens também datavam do período de 1914 a 1918. 
Os líderes africâneres não teriam mais êxito em impedir que a África do Sul fosse à guerra com a Alemanha em 1939 do que tiveram em 1914. Após a Segunda Guerra, o seu partido ressurgiu para se tornar o partido da maioria do eleitorado exclusivamente branco e acabaria por romper os laços com a Grã-Bretanha para estabelecer a República da África do Sul (1961) e aplicar a política de apartheid, que durou até 1994. O último presidente branco da África do Sul, F. W. de Klerk, concedeu independência à Namíbia em 1990, no mesmo ano em que libertou Nelson Mandela da prisão.

Estava em marcha a geração pela autodeterminação nacional africana que se estendeu ao movimento pelo governo autónomo na Índia. Gandhi e Jinnah pressupunham, ambos, que a Inglaterra iria recompensar as contribuições da Índia na Primeira Guerra Mundial com uma transição para um autogoverno logo em seguida. Daí terem ficado chocados em novembro de 1918 quando a lei marcial foi estendida para o pós-guerra, uma medida claramente dirigida contra os seus próprios apoiantes. Em fevereiro de 1919, quase três anos antes de assumir a liderança formal do Congresso Nacional indiano, Gandhi lançou a sua primeira campanha de desobediência civil contra a autoridade britânica abarcando toda a Índia. 

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