Embora o cravo vermelho se tenha tornado um símbolo único e profundamente associado ao 25 de Abril de 1974, existem paralelos interessantes noutras revoluções ou movimentos anteriores. Por exemplo, a rosa vermelha foi um símbolo importante nos movimentos socialistas e trabalhistas europeus. Representava a luta pelos direitos dos trabalhadores, justiça social e solidariedade. Curiosamente, há referência a uma “Revolução dos Cravos” protagonizada por um movimento na Macedónia, em1903. Mas apenas nominal, sem ter acontecido efetivamente. Na Rússia, durante a queda do czar em 1917, há relatos de floristas oferecendo flores aos soldados, em que estes as colocavam no cano das espingardas. E é icónica a fotografia de George Harris a colocar uma flor no cano da espingarda de um soldado durante um protesto contra a Guerra do Vietname, em 1967.
Daí a ideia de alguns semiólogos que “alguém esclarecido forjou o símbolo dos cravos”. E isso é compreensível como hipótese intuitiva. Afinal, o uso de um símbolo tão forte parece ter uma intenção prévia. Mas as evidências históricas disponíveis não apontam para uma ação organizada ou planeada. Tudo o que sabemos indica que o surgimento dos cravos foi espontâneo e contingente, resultado de circunstâncias muito particulares naquele dia. Celeste Caeiro era empregada de um restaurante que celebrava o aniversário naquele dia. E foi apanhada de manhã cedo, quando ia trabalhar, com um grande cesto de cravos para serem oferecidos nesse dia aos clientes. Com a cidade tomada pelos militares, ela viu-se envolvida naquele tipo de situação em que nem ela nem ninguém sabe explicar muito bem como aconteceu. A verdade é que, às tantas, os cravos se espalharam por mãos de transeuntes anónimos e soldados no caminho de Celeste Caeiro. E o que acabou intuitivamente por acontecer foi quando os militares começaram a colocá-los no cano das espingardas.
A adesão foi imediata porque o símbolo encaixou no espírito do movimento. O MFA queria uma revolução sem sangue, e espalhou os soldados pelas ruas. E isso coincidiu, mal foram vistos, com a simpatia popular que há muito ansiava por aquele dia [como tão bem disse a poeta Sophia de Mello Breyner Andresen]. Uma flor encaixou perfeitamente nesse ambiente. Não há indício de premeditação. As revoluções têm símbolos que às vezes emergem de modo orgânico. Após o dia 25, jornais, rádio e fotógrafos amplificaram a imagem. Os cravos tornaram-se símbolo oficial gradualmente, não pela mão de um “mentor” secreto. Não houve mão esclarecida. Houve sincronia histórica.


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