É a teoria de que o comunismo foi a principal causa política que moveu o eleitorado a votar no partido nazi. Porque se não fosse o comunismo o eleitorado não votaria nos nazis. Hitler chegou ao poder pelo jogo lícito democrático, e não por nenhum golpe militar, como tantos nesse século XX. Mas não foi o comunismo que “gerou” o nazismo. Foi o pavor do comunismo, num contexto de colapso das instituições liberais, que deu ao nazismo a aparência de uma alternativa de ordem.
A República de Weimar, oficialmente conhecida como Reich Alemão, foi um período histórico da Alemanha de 9 de novembro de 1918 a 23 de março de 1933, durante o qual foi uma república federal constitucional pela primeira vez na história. O nome informal do período é derivado da cidade de Weimar, que sediou a assembleia constituinte que estabeleceu o governo. Após a devastação da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Alemanha estava exausta. A consciência da derrota iminente desencadeou uma revolução, a abdicação do Kaiser Guilherme II, a rendição formal aos Aliados e a proclamação da República de Weimar em 9 de novembro de 1918.
Nos seus primeiros anos, graves problemas assolaram a República, como a hiperinflação e o extremismo político, incluindo assassinatos políticos e duas tentativas de tomada de poder por paramilitares rivais. Em 1924, uma grande estabilidade monetária e política foi restaurada e a república desfrutou de relativa prosperidade durante os cinco anos seguintes. Este período, às vezes conhecido como os Anos 20 Dourados, foi caracterizado por um florescimento cultural significativo, progresso social e melhoria gradual nas relações externas. Em 1920 aderiu à Liga das Nações, o que marcou a sua reintegração na comunidade internacional. No entanto, especialmente na direita política, permaneceu um ressentimento forte e generalizado contra o tratado e aqueles que o assinaram e apoiaram.
A Grande Depressão de outubro de 1929 impactou severamente o ténue progresso da Alemanha. O alto desemprego e a subsequente agitação social e política levaram ao colapso da coligação liderada pelo chanceler Hermann Müller. A partir de março de 1930, o presidente Paul von Hindenburg usou poderes de emergência para apoiar os chanceleres Heinrich Brüning, Franz von Papen e o general Kurt von Schleicher. A Grande Depressão, exacerbada pela política de deflação de Brüning, levou a um aumento do desemprego. Em 30 de janeiro de 1933, Hindenburg nomeou Adolf Hitler como chanceler para chefiar um governo de coligação. No final de março de 1933, o incêndio do Reichstag foi aproveitado por Hitler para reforçar o seu poder. Hitler utilizou este pretexto para impedir a governação constitucional e suspender as liberdades civis. O que provocou o rápido colapso da democracia a nível federal e estatal, e a criação de uma ditadura de partido único sob a sua liderança.
Em 1918/19, houve revoltas comunistas, como a da Liga Espartaquista, de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, que tentaram implantar uma república soviética à semelhança da Rússia bolchevique. Essas tentativas foram sangrentas e deixaram uma memória de pavor entre as classes média e alta. E mesmo entre muitos trabalhadores, que temiam perder a pouca estabilidade que tinham. Por isso, quando o Partido Comunista Alemão (KPD) cresceu eleitoralmente durante a Grande Depressão, grande parte da população passou a ver o nacional-socialismo como um "mal necessário" para evitar o comunismo.
O NSDAP – o partido de Hitler – chegou ao poder através de eleições legítimas. Hitler foi nomeado chanceler em janeiro de 1933 após o partido se ter tornado o maior do Reichstag, embora sem maioria absoluta. Muitos votaram nele não por antissemitismo, nem por convicção ideológica, mas porque viam no nazismo a única força capaz de manter a ordem e impedir uma revolução vermelha. O próprio Joseph Goebbels explorava esse medo. Um especialista da propaganda, difundia a ideia de que o comunismo era o provocador do caos, do fogo, da destruição da família, da propriedade e da religião. Sem o espectro do comunismo, o nazismo talvez nunca tivesse tido o impulso eleitoral que o levou ao poder. O comunismo foi o inimigo imaginário que Hitler explorou para mobilizar as massas. Mas é importante notar que isto não absolve o nazismo – um totalitarismo simétrico – cada um à sua maneira, expressões distintas da mesma crise da modernidade. Ambos provocaram uma anomia e tal desespero que levou ao colapso do liberalismo democrático.
Pode-se argumentar que o comunismo, pela sua difusão global e longevidade, causou mais mortes e destruição ao longo do século XX do que o nazismo. Mas, em termos lógicos, usar o comunismo como causa do nazismo é manifestamente exagerado. O comunismo pode ter criado o contexto que levou ao medo. O medo é que determinou o triunfo do nazismo. Mas havia muitos outros fatores: o Tratado de Versalhes; a crise de 1929; a humilhação nacional e o ressentimento social; e o vazio espiritual da época.
Nas eleições parlamentares de maio de 1928, o NSDAP (partido nazi) tinha apenas 2,6% dos votos. Era um grupo marginal. O Partido Comunista Alemão (KPD), por sua vez, já tinha 10,6%. Mas depois da crise de 1929, o desemprego disparou para 6 milhões, e tudo mudou.
Pesquisas posteriores (como as de Jürgen Falter e Detlef Mühlberger) mostram que nas regiões industriais (Berlim, Ruhr, Saxónia), o voto comunista era forte. Nas regiões rurais, protestantes e de classe média, o voto nazi cresceu com força em resposta direta ao avanço do KPD. O historiador Ian Kershaw, biógrafo de Hitler, resume isto assim: “O medo do comunismo foi o cimento que uniu a burguesia e a classe média em torno de Hitler. Ele prometia ser o único capaz de conter o colapso total.” Assim, o voto nazi foi, em grande parte, um voto de autodefesa de classe contra a ameaça da revolução proletária.
Estudos de comportamento eleitoral - Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt - mostram que o NSDAP atraiu sobretudo as classes médias em declínio – pequenos comerciantes, funcionários, agricultores endividados – que se sentiam ameaçados pela proletarização. O KPD atraía os operários industriais urbanos, muitos desempregados e radicalizados. Entre 1930 e 1932, à medida que o Partido Comunista crescia nos centros urbanos, o Partido Nazi consolidava-se nas periferias e no interior, com uma mensagem de “ordem contra o caos”. A polarização entre comunistas e nazis acabou por esvaziar o centro político. Os dois grandes partidos moderados – o Social-Democrata (SPD) e o Católico (Zentrum) – foram esmagados entre esses extremos. O resultado foi que Hitler chegou ao poder pelo voto (com o apoio da direita tradicional e do medo das elites), sem precisar de golpe militar. Foi uma autodestruição democrática, catalisada pelo terror ao comunismo. O nazismo foi, em parte, a reação patológica da sociedade liberal alemã ao trauma comunista: uma espécie de doença autoimune que acabou por matar o próprio corpo político.

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