segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Como viver em tempos de recessão democrática?


         Viktor Orbán, o primeiro-ministro húngaro, declarou em 2017 que o seu regresso ao poder marcava o ponto em que os húngaros decidiram que queriam recuperar o seu país com a dignidade que a autoestima por si própria merecia. Pois a identidade nacional nascia, em primeiro lugar, da distinção ente o nosso eu interior e um mundo exterior de regras e normas da curvatura da banana e da couve de couve de Bruxelas, que não reconhecia adequadamente o valor da dignidade do eu interior húngaro. Não é o eu interior que deve ser obrigado a conformar-se com a regras impostas por uma casta de burocratas. Quem tem de mudar é precisamente essa mesma casta.
          Esta segunda década dos ‘anos 2000’, tem sido profundamente marcada por uma recessão democrática, não apenas na Europa, mas um pouco por todo o mundo. E então, a que se deve isto? Como anda tudo ligado, é um fenómeno que começa em força em meados dos ‘anos 1980’ com a deslocalização das empresas-fábrica da Europa e dos Estados Unidos para a Ásai Oriental, onde a mão de obra era muito mais barata, e culmina, pelo menos até aqui, na mutação da Al-Qaeda em Estado Islâmico. E jovens muçulmanos, a maior parte deles nascidos na Europa, a deixarem as suas vidas, aparentemente vividas com relativa tranquilidade, para se alistarem nas fileiras do autodenominado Estado Islâmico. E a cereja do bolo chegou em 2016, quando os britânicos votaram a favor da sua saída da União Europeia, e os norte-americanos elegeram Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos.
          Assim, para a emergência do sentimento de identidade nacional, que estava adormecido, juntou-se a fome com a vontade de comer: a perda de emprego por parte das classes trabalhadoras e classes médias antigas desses países; e a vaga colossal de imigrantes fugindo à guerra, e a outros atropelos contra os direitos humanos, sobretudo do Médio Oriente, África Subsariana e América Central. Muitos nacionais dos países de acolhimento viram os imigrantes não só como usurpadores dos seus empregos, mas também como os causadores da insegurança e agitação social. Estavam assim criadas as condições para que partidos anti-imigração e anti União Europeia ganhassem força para subir em flexa.
          Bem ou mal, sobretudo os eleitorados preferencialmente inclinados para políticas conservadoras e de direita, sentiram que o seu âmago, o mais íntimo da sua dignidade humana, o “eu interior”, estava ameaçado. Portanto, já não era apenas a carestia material, devida ao desemprego, o único problema, mas a ela associava-se o sentimento de um eu interior desrespeitado, para não dizer humilhado.

Sem comentários:

Enviar um comentário