São as histórias
falaciosas do passado que muitas vezes moldam as nossas perspetivas do mundo e
as nossas expectativas para o futuro. E isto acontece porque nós somos muito
sensíveis ao sentido que o mundo e a vida tem de ter. E para tal somos muitas
vezes forçados a fazer entorses e enviesamentos aos factos e aos pensamentos
para que as coisas se expliquem dentro de um quadro paradigmático de
mundivisão. E assim, as histórias explicativas têm de ser simples e mais
concretas do que abstratas.
A mente humana não
lida bem com não-explicações. A mente que constrói narrativas acerca do passado
é um órgão de criação de sentido. Quando ocorre um acontecimento imprevisto, ajustamos
de imediato a nossa perspetiva do mundo, para que se acomode à surpresa. Sabe-se
que as nossas memórias estão constantemente a serem revistas e refeitas, e é
por isso que não podemos acreditar cem por cento nelas. Essa é uma das
limitações da nossa mente, entre outras, claro. Somos imperfeitos a reconstruir
estados passados de conhecimento. E é por isso que damos conta de nos
enganarmos a nós próprios o tempo todo, pois passamos a vida a acreditar em
relatos como verdadeiros, quando na realidade são falsos. Tudo o que contribua
para relatos coerentes, nós gostamos. Daí que quando todos foram ultrapassados
pela imprevisibilidade dos acontecimentos, há sempre alguém que diz: “Eu bem
sabia!”
O enviesamento da
perceção retrospetiva tem efeitos perniciosos nas avaliações dos decisores.
Leva os observadores a avaliarem a qualidade de uma decisão, não segundo a
solidez do processo, ma por o resultado ter sido bom ou mau. É o que acontece
com os médicos, ou os corretores de bolsa, especialmente ingrata porque tomam
decisões pelos outros. É por isso que se diz que para o mesmo doente o médico
tanto pode ser deus se tudo correr bem, como ser o diabo se tudo correr mal.
O que conta é o
resultado, não se as práticas e as decisões foram boas. As ações que pareciam
prudentes, devido ao enviesamento de resultados, recebem uma perceção
retrospetiva de irresponsável e negligente. A confiança subjetiva dos
corretores é uma sensação, não um juízo. É por confiarem demasiado nas suas
intuições e subjetividades que os apelidados gurus falham mais do que acertam. Sabemos que as pessoas conseguem
manter uma fé inabalável em qualquer proposição, por muito absurda que seja,
quando é defendida por uma comunidade de adeptos, ou fãs. Não é surpreendente,
por conseguinte, que uma grande quantidade de indivíduos engajados no mundo das
Seitas, de que as seitas religiosas
são apenas uma parte, acreditem eles próprios fazerem parte daquilo que
biblicamente ficou conhecido como “povo eleito”.
Uma narrativa,
desde que apelativa e coerente nos raciocínios, é suscetível de provocar em nós
a ilusão de inevitabilidade. O que contribui para o chamado efeito de aura: as pessoas boas só fazem
coisas boas; e as pessoas más só fazem coisas más. O efeito de aura ajuda a manter as narrativas explicativas simples e
coerentes. É a nossa tendência para construir e acreditar em narrativas
coerentes do passado e dos gurus.
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