Há dois dias, no
dia internacional pela eliminação da violência contra as mulheres, centenas de
pessoas reuniram-se em marchas pelas principais cidades da Europa. Das
declarações às reportagens televisivas, de líderes de alguns movimentos, como
por exemplo UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta) extraía-se um argumento
de peso: “ainda se vive numa cultura patriarcal e machista, assente numa
sociedade desigual que historicamente, quanto à desigualdade de género, tem privilegiado
os homens em detrimento das mulheres.”
É claro que a
perceção de alguns homens conservadores, os que enfiam a carapuça de machista, não
é coincidente, e como é óbvio, não aceitam essa verdade também óbvia. Argumentam
que são ideias da esquerda que tem dado vantagens injustificadas às minorias,
às mulheres, aos refugiados. Mas a verdade é que ainda é muito elevado o número
de mulheres assediadas, agredidas, violadas e assassinadas (nos últimos dez
anos, 30 mulheres assassinadas em média por ano).
Quando a liberdade
de expressão se transforma em afronta vergonhosa, agora algumas democracias
europeias criminalizam certas expressões, que são vedadas quando proferidas em
público, ou por serem humilhantes para certas minorias, ou por instigarem à
violência. No entanto estes princípios não se aplicam aos Estados Unidos da
América porque a liberdade de expressão está constitucionalmente protegida.
Assim, as pessoas podem dizer o que lhes apetece, que o que lhes pode acontecer
é apenas um opróbrio moral. Não é assim, portanto, tão extraordinário para os
americanos, toda a verborreia bestial de Donald Trump. Inclusivamente, Hillary
Clinton, numas declarações aquando da derrota que teve com Trump, chegou a
dizer que isso se deveu a um certo eleitorado pacóvio, ou algo semelhante. Ora,
de certo modo estas declarações vieram agravar ainda mais a pouca fé que esse
eleitorado visado tinha por ela. Apesar de algumas dessas pessoas não
apreciarem por aí além a forma como Trump diz as coisas, o certo é que gostam
do facto de ele não se deixar intimidar pela pressão do politicamente correto.
Pode ser irritante, e até malévolo, mas pelo menos é autêntico. Estes americanos
da chamada “América Profunda”, ou do mundo rural, e a que Hillary Clinton
chamou pacóvia, ficaram fartos de serem ridicularizados pelas elites das grandes
cidades, através dos filmes produzidos em Hollywood, em que quem ficava sempre
bem na fotografia eram personagens estereotipadas nas categorias conotadas com lésbicas
e gays.
Apesar de a
identidade pessoal ser um aspeto de suprema importância, quando levada ao
extremo pode paralisar as sociedades, ao ameaçar a possibilidade de comunicação
e de ação coletiva. Por isso, a sociedade como um todo, para prosseguir
objetivos comuns, nada beneficia quando protege determinadas identidades de
grupo cuja legitimidade pode ser discutível. As pessoas vivem melhor em
sociedades mais cosmopolitas, mais democráticas, mais diversificadas, sem que
com isso tenham de perder o sentido de identidade nacional, mais ampla e ao
mesmo tempo mais integradora.
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