Sonhando na esperança de encontrar uma pessoa
que nos
dispensará a necessidade de ter por perto mais gente
Pensamento complexo é o pensamento da segunda
revolução cognitiva moderna, do conhecimento multidimensional e globalizante, muito
para além de Descartes, Galileu e Newton. É na interdependência dos elementos
que repousa a sua essência.
Quando ouvimos
alguém dizer que a sua afirmação é baseada em conhecimentos científicos, muito
provavelmente se estará a referir à ciência determinista começada por Descartes
e patenteada por Newton. Esta ciência, considerada uma revolução cultural na
Europa, corresponde ao pensamento da primeira revolução cognitiva moderna, que
foi construída sob os princípios do determinismo, em que o acaso não poderia
ter lugar. E assim se distinguia do mundo das humanidades, que era o domínio das artes e letras. Ora, em bom
rigor, esta é a ciência antes do aparecimento de um Werner Heisenberg, ou de um
Schrödinger. Depois deles impôs-se a mecânica
quântica, em que a matéria é corpuscular e ondulatória ao mesmo tempo. E
por fim a teoria do caos, com a metáfora do efeito borboleta: a sensibilidade
às condições iniciais pode desencadear muito depressa um sistema de
consequências não-previsíveis. Gödel com o seu teorema da incompletude veio
demonstrar que um sistema formal como a matemática não podia ser completo e
coerente. Não podia decidir por si da sua coerência e completude. Este
terramoto conceptual devastou todas as certezas de quatro séculos. Foi a segunda
revolução científica, nos termos de Thomas Kuhn: “uma mudança de paradigma”. Os
cientistas descobrem coisas novas e diferentes com novos instrumentos. Quando
os paradigmas se alteram o mundo muda com eles.
A ordem e a
desordem opõem-se, mas nenhuma delas exclui a outra. Pelo contrário, é na sua
desintegração que o Universo se organiza. E a vida na Terra resulta da evolução
natural do Universo, que para continuar a evoluir os indivíduos têm de morrer. Do
mesmo modo, as organizações sociais não podem evoluir sem conflituar. Uma
empresa mal gerida morre. Mas também morre sem inovação. E assim com a morte da
empresa tanto morre o gestor como o inovador. Portanto, a empresa para se
manter precisa do gestor e do inventor.
Ora, entre a causa
e o efeito há uma recursividade virtuosa, em que indivíduos e sociedade
interagem para se produzirem mutuamente. Sociedade e indivíduos são uma
existência única, indissociavelmente ligados de forma recursiva: o indivíduo
influencia a sociedade e a sociedade influencia o indivíduo. É o princípio da auto-organização. E assim é a sociedade
democrática: diversidade contraditória de ideias.
Contradições e
complementaridade entre os interesses das pessoas e dos grupos, tensões
permanentes, conflitos – a procura de equilíbrio com a alternância democrática.
Os cidadãos criam a democracia, que por sua vez cria os cidadãos. A cidadania é
importante para que cada um seja realmente portador da consciência do que
representa toda a sociedade como uma unidade, partilhando os mesmos valores
fundamentais e as mesmas regras do jogo. Digamos, que é esse o papel de uma
Constituição, num país onde todos devem partilhar uma certa consciência
democrática. Esse é o sentido que
deve ser seguido para que não se perca a confiança,
ingrediente essencial na coesão das sociedades e dos povos em geral.
É verdade que hoje
as pessoas estão muito mais interconectadas que no passado ainda recente. Mas
ao mesmo tempo, as novas formas de as pessoas se relacionarem através das redes
sociais da internet provocaram a emergência de uma nova vida, mais urbana e
mais egoísta, cheia de angústia e de solidão. Este é o paradoxo da atual
sociedade em rede.
A entrada na era
das redes sociais digitais provocou em nós uma nova forma de apreendermos a
realidade. E daí uma nova forma radical da representação que fazemos da
realidade. Pelo menos é uma mudança que vai levar tempo até nos prepararmos
para melhor compreendermos a fenomenologia deste novo paradigma. Ainda são as
pessoas formadas no paradigma precedente – mecanicista, lógico, linear, fechada
na racionalidade dedutiva – que detêm o verdadeiro poder e determinam as
políticas que regem a vida da geração que já nasceu com a internet. Já se sabe
falar nos novos termos, mas ainda não se encontrou o verdadeiro sentido disto
tudo, e o verdadeiro significado para o traduzirmos em atos, em razão prática,
em ética, em valores.
Porque o tempo não
trava a mudança de paradigma em curso ainda por fechar, não temos uma visão
clara de todas as implicações e consequências. É como se estivéssemos na
condição de cego a esconder os olhos. É essa a grande dificuldade da representação
sistémica que impõe uma cultura flexível e não a cultura rígida da obediência e
da disciplina. Nesta nova era em curso, é da desordem criativa e do sentido de
risco que irá nascer uma nova ordem
mundial.
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