quarta-feira, 2 de março de 2022

Carroças Panje e isbás russas *


Já havia vários dias que Blobel despachava Teilkommandos de Kiev para expurgar os arredores – Pereiaslav ou Chernigov, eram muitas. Os Teilkommandoführer, porém, ficavam desesperados: se tivessem que retornar a um lugar depois de uma ação, encontravam ainda mais judeus; aqueles que se haviam escondido voltavam assim que eles partiam. Reclamavam que isso distorcia todas as suas estatísticas. O Kommando, segundo os totais acumulados de Blobel, liquidara 151 mil, das quais 14 mil sem ajuda externa (isto é, sem os batalhões Orpo de Jeckeln). Um Vorkommando estava em vias de ser formado para entrar em Kharkiv.

As chuvas estavam começando e, mal se atravessava o Dniepre, cheio, chafurdava-se na lama. Camiões e carros faziam espirrar uma lama preta e gordurosa, modelada por fiapos de palha, pois os soldados saqueavam os moinhos à beira da estrada para, em vão, estenderem feno à frente dos veículos. Uns oficiais de uma divisão de infantaria que se dirigiam para a linha da frente desde Jitomir, homens esgotados, viam a chegada do inverno com angústia e se perguntavam pelo objetivo final, não conseguiam avançar sequer até Kharkiv. Queixavam-se dos novos recrutas, enviados da Alemanha para compensar as perdas, mas mal treinados e, no calor da luta, logo vítimas do pânico. O material caía aos pedaços: as charretes alemãs modernas, com pneus de borracha e engrenagem de roldanas, desmantelavam nos trilhos, sendo então substituídas por carroças Panje confiscadas aos camponeses, quase indestrutíveis. 



Os belos cavalos alemães, húngaros ou irlandeses com que haviam começado a campanha morriam em massa; sobreviviam apenas os póneis russos, que comiam de tudo, de brotos de bétula a palha do telhado das isbás russas; mas estes eram leves demais para o trabalho pesado de carga, e as unidades deixavam para trás toneladas de munições e equipamento.



Todas as noites os homens esfalfam-se para encontrar um telhado ou um buraco seco pela metade. Estão todos com os uniformes esfarrapados, cheios de pulgas, não recebendo nada, nem pão. Os próprios oficiais careciam de tudo: barbeadores, sabão, pasta de dentes, couro para reparar as botas, agulha, linha. Chovia noite e dia e eles perdiam mais homens em virtude de doenças — disenteria, hepatite, difteria — que em combate. Os doentes eram obrigados a caminhar até 35 Km por dia, pois não havia como transportá-los e, se deixados sozinhos nas aldeias, insurgentes vinham matá-los. Os insurgentes, agora, proliferavam como pulgas; pareciam estar em toda a parte, e os estafetas ou contactos isolados desapareciam nas matas. Entre os soldados havia vários russos de uniforme alemão, com a braçadeira branca dos Hilfswillige.

* No tempo das lagartas da Whermacht, segundo Jonathan Littell em As Benevolentes

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