quarta-feira, 31 de outubro de 2018

A recente reação dos italianos face às migrações e o papel da Organização Internacional para as Migrações

A maioria dos italianos não concorda com a seguinte opinião: “Queiramos ou não, não é possível parar a imigração, não se pode fazer nada em relação ao que foge ao nosso controlo”. Os italianos consideram que essa postura é potencialmente desastrosa. Assim como também rejeitam a ideia de que os germânicos do século V tenham sido imigrantes pacíficos. Não compram a teoria que é hoje padrão nas academias do norte da Europa: “. . . a dita invasão pacífica dos bárbaros não causou nenhum retrocesso civilizacional, antes pelo contrário. . .”


António Vitorino é o atual diretor geral da Organização Internacional para as Migrações, e segundo ele, os italianos culpam os imigrantes como bode expiatório dos seus problemas de fundo para os quais não querem ou não sabem resolver. As ideias de que as migrações são uma invasão, que põem em causa a identidade dos países de acolhimento, são falsas ideias feitas. É uma visão desfocada da realidade, impregnada de preconceitos e juízos apriorísticos completamente errados, de que os imigrantes descaracterizam as identidades nacionais dos países de acolhimento: “. . . temos, felizmente, casos de sucesso de sociedades abertas, tolerantes, onde o ajustamento e a convivialidade são garantidos por um esforço de duplo sentido — dos que chegam, para se adaptarem, e dos que os recebem, para se adaptarem à sua chegada. . .”

Esta ideia de invasão está muito ligada a fenómenos importantes, como seja o envelhecimento das sociedades mais ricas, comunidades de destino. Elas têm necessidade de rejuvenescimento para responder com maior agilidade e maior criatividade aos desafios de uma economia global mais competitiva e mais agressiva. Em todo o caso, Vitorino tem consciência de que a Europa não vai ficar como muitos europeus queriam: “tudo como dantes”. Ainda não sabemos todas as implicações que estas novas realidades vão ter sobre a sobrevivência da própria democracia. Apenas uma coisa é certa: a democracia representativa como a conhecemos no passado não vai ficar incólume a estas transformações. Não nega que haja riscos sérios. Mas também confia em que a sociedade, no seu conjunto, seja capaz de encontrar as respostas. Há uma certeza que tem: não é possível resolver problemas complexos na base de ideias simplificadas. As ideias podem ser simples, mas não podem ser simplistas. Isso é particularmente verdade nas migrações, onde o debate é, tantas vezes, dominado por estigmatizações.

As mudanças de perspetiva são sempre moldadas em parte por desenvolvimentos mais latos na sociedade moderna. Existe invariavelmente uma estreita relação entre a forma como vemos o nosso mundo e a forma como interpretamos o passado. As imagens dos povos germânicos do século V e da sua ocupação do Império Romano do Ocidente mudaram dramaticamente desde a Segunda Guerra Mundial, tal como se alteraram as ideias sobre os alemães modernos e o seu papel na União Europeia depois da “Queda do Muro de Berlim”. Os alemães foram reabilitados para se tornarem num elemento essencial da identidade europeia tal como a conhecemos agora.

Seja como for, apesar de algumas exceções, a Europa até agora tem sido um lugar tolerante, pacífico e mais acolhedor do que a maioria dos lugares do mundo. Mas agora as sondagens de opinião mostram consistentemente, em todos os países da Europa, que as migrações passaram para o topo da lista das preocupações públicas.

Na rota migratória da África Ocidental uma boa parte dos migrantes admitem que se lançaram ao inferno do deserto, e ao risco de naufrágio no Mediterrâneo, simplesmente para encontrar trabalho. Ora, nenhum destes migrantes tem direito a refúgio na Europa nos termos da Convenção de 1951para os refugiados, que consagra os direitos das pessoas que fogem da perseguição, mas não da pobreza. Eles arriscam a vida, mas a direita europeia gostaria que eles não arriscassem. E a esquerda dá prioridade aos refugiados, particularmente aos que fogem da Síria. Pessoas que se sujeitam aos horrores do deserto, aos campos de batalha da Líbia e aos barcos de morte do Mediterrâneo não o fazem de ânimo leve, e não são pessoas que serão facilmente impedidas de o fazer. Não é escolha deles ir para a morte. Mas se o governo não os ajuda, se o ACNUR não os ajuda, se ninguém os pode ajudar, então a única opção são os passadores. Quando se foge duma ditadura, da guerra ou da fome, e se é confrontado com novos conflitos, os passadores são a única oportunidade de segurança.

É bom lembrar que passadores e traficantes não são a mesma coisa. Há diferenças entre passadores e traficantes. Os passadores são aqueles a quem os migrantes confiam e pagam para os transportar de um país para outro, que apesar de os tratarem com dureza, e por vezes com brutalidade, fazem-no em pleno teatro de operações com a clara cumplicidade dos migrantes. Ao passo que os traficantes contrabandeiam as pessoas sem que elas deem por nada, portanto, sem que tenham dado o seu consentimento como dão aos passadores. A intenção dos traficantes e pura e simplesmente escravizar essas pessoas, mantendo-as em cativeiro, e às mulheres obrigam-nas a prostituir.

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