Esta ideia de invasão está muito ligada a fenómenos importantes, como seja o envelhecimento das sociedades mais ricas, comunidades de destino. Elas têm necessidade de rejuvenescimento para responder com maior agilidade e maior criatividade aos desafios de uma economia global mais competitiva e mais agressiva. Em todo o caso, Vitorino tem consciência de que a Europa não vai ficar como muitos europeus queriam: “tudo como dantes”. Ainda não sabemos todas as implicações que estas novas realidades vão ter sobre a sobrevivência da própria democracia. Apenas uma coisa é certa: a democracia representativa como a conhecemos no passado não vai ficar incólume a estas transformações. Não nega que haja riscos sérios. Mas também confia em que a sociedade, no seu conjunto, seja capaz de encontrar as respostas. Há uma certeza que tem: não é possível resolver problemas complexos na base de ideias simplificadas. As ideias podem ser simples, mas não podem ser simplistas. Isso é particularmente verdade nas migrações, onde o debate é, tantas vezes, dominado por estigmatizações.
As mudanças de perspetiva são sempre moldadas em parte por desenvolvimentos mais latos na sociedade moderna. Existe invariavelmente uma estreita relação entre a forma como vemos o nosso mundo e a forma como interpretamos o passado. As imagens dos povos germânicos do século V e da sua ocupação do Império Romano do Ocidente mudaram dramaticamente desde a Segunda Guerra Mundial, tal como se alteraram as ideias sobre os alemães modernos e o seu papel na União Europeia depois da “Queda do Muro de Berlim”. Os alemães foram reabilitados para se tornarem num elemento essencial da identidade europeia tal como a conhecemos agora.
Seja como for, apesar de algumas exceções, a Europa até agora tem sido um lugar tolerante, pacífico e mais acolhedor do que a maioria dos lugares do mundo. Mas agora as sondagens de opinião mostram consistentemente, em todos os países da Europa, que as migrações passaram para o topo da lista das preocupações públicas.
Na rota migratória da África Ocidental uma boa parte dos migrantes admitem que se lançaram ao inferno do deserto, e ao risco de naufrágio no Mediterrâneo, simplesmente para encontrar trabalho. Ora, nenhum destes migrantes tem direito a refúgio na Europa nos termos da Convenção de 1951para os refugiados, que consagra os direitos das pessoas que fogem da perseguição, mas não da pobreza. Eles arriscam a vida, mas a direita europeia gostaria que eles não arriscassem. E a esquerda dá prioridade aos refugiados, particularmente aos que fogem da Síria. Pessoas que se sujeitam aos horrores do deserto, aos campos de batalha da Líbia e aos barcos de morte do Mediterrâneo não o fazem de ânimo leve, e não são pessoas que serão facilmente impedidas de o fazer. Não é escolha deles ir para a morte. Mas se o governo não os ajuda, se o ACNUR não os ajuda, se ninguém os pode ajudar, então a única opção são os passadores. Quando se foge duma ditadura, da guerra ou da fome, e se é confrontado com novos conflitos, os passadores são a única oportunidade de segurança.
É bom lembrar que passadores e traficantes não são a mesma coisa. Há diferenças entre passadores e traficantes. Os passadores são aqueles a quem os migrantes confiam e pagam para os transportar de um país para outro, que apesar de os tratarem com dureza, e por vezes com brutalidade, fazem-no em pleno teatro de operações com a clara cumplicidade dos migrantes. Ao passo que os traficantes contrabandeiam as pessoas sem que elas deem por nada, portanto, sem que tenham dado o seu consentimento como dão aos passadores. A intenção dos traficantes e pura e simplesmente escravizar essas pessoas, mantendo-as em cativeiro, e às mulheres obrigam-nas a prostituir.
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