domingo, 6 de junho de 2021

O problema das redes sociais em 2021


A necessidade de pertença provoca a atração de grupos identitários, cujo comportamento de gang acaba por criar uma falsa sensação de unanimidade. Os extremistas, como só falam com extremistas, caem numa falácia, com a falsa sensação da unanimidade. Veem as mesmas ideias repetidas tantas vezes que acreditam que a maior parte das pessoas, e não só eles, pensa daquela maneira. É a esta forma de ver os outros que se dá o nome de distorção prismática. Quando um feixe de luz atravessa um prisma, a luz dispersa-se e distorce-se. Por causa dessa distorção, os radicais veem os outros como radicais. É uma distorção para dentro e para fora. É a mediocridade do medíocre extremistão. Um extremista do Texas criou uma lista no Facebook de 300 “amigos”, todos com uma visão política igual. E para se galvanizarem, almoçam juntos uma vez por mês em Austin.

A grande tragédia das redes sociais é que elas agravaram um velho problema – a tendência para interpretar mal a sociedade gerando desconfiança. As redes sociais induzem uma falsa compreensão da realidade, como se fossem um espelho gigante da realidade social. Mas as redes não são um espelho, são um prisma. Um espelho reflete, um prisma distorce. As redes sociais, distorcem a visão que temos de nós e dos outros. As redes sociais aumentam a polarização política e alimentam o extremismo, defende o sociólogo Chris Bail em:

Breaking the Social Media Prism –How to Make Our Platforms Less Polarizing
(Princeton University Press, 2021)


Bail sublinha que a arquitetura das redes sociais é construída com base no estatuto social (o Twitter e o Instagram dão um "quebra nozes" a quem gera mais tráfego. Mas ao mesmo tempo erguem muros fossos à empatia. Um obstáculo e um fosso, que ao fazer aumentar a indiferença hostil a ideias diferentes, desumaniza. As redes sociais transmitem-nos uma ideia errada acerca do que nós somos. Que ideia têm os outros sobre nós? Um desejo impertinente ao qual damos muito valor. Uma falsa sensação de controlo sobre como é que nos devemos apresentar em público. Qual é a nossa persona mais eficaz?

Chris Bail mostra-nos os truques e técnicas que os extremistas usam para criar o mundo artificial das redes sociais. Parece democracia moderna em ação, mas o que vemos nas redes não são debates, nem exercícios democráticos. Os radicais têm gosto em criar o caos: estudos nos EUA e na Dinamarca concluíram que quem espalha notícias falsas tem um gosto particular pelo caos e vontade de ver o sistema ruir. Mas são cobardes e hipócritas, mostrando uma persona ao vivo e outra por trás do anonimato, com os nicknames das redes sociais.

As redes sociais, por paradoxal que pareça, dão espaço aos solitários e aos perdidos que procuram alguém que lhes dê atenção; dão-lhes um propósito no quotidiano; dão-lhes uma comunidade; dão-lhes auto validação e auto valorização. A pseudo-celebridade dos likes dá às pessoas uma falsa sensação de que são famosas e influentes. Os solitários que se tornam trolls juntam-se e formam uma espécie de mercenários que se juntam para ataques coletivos premeditados. As listas com os nomes de “amigos” com comportamentos extremistas nas redes sociais passam de uns para os outros de modo a formar claques, ou batalhões de agressores digitais. Esses grupos seguem rituais, assumem compromissos de fidelização, e agem como uma seita. Comprometem-se a seguir as páginas uns dos outros, orquestram comentários e likes de apoio coletivo ou de ataque coletivo. 

Moral da história: as pessoas armadilhadas na rede, já não conseguem libertar-se. Inicialmente são esmagadas virtualmente. Mas, a seguir, são molestadas na vida real, quando não perseguidas até à exaustão. Às vezes, estas turbas de radicais lançam ataques coordenados contra uma pessoa que defendeu uma ideia com a qual um deles não concorda. Parecendo que o mundo inteiro estava atento. Mas é artificial. No modo de manada, ou carneirada, discordam sem saber do que discordam; é um deles que chama os outros “amigos” a fazer barulho. Os ataques de grupo podem ser mais ou menos agressivos, mais ou menos sarcásticos, mas são concertados.

É certo que estes grupos estão longe de representar as tendências da sociedade no seu todo. São grupos de radicais agressivos que tentam calar os outros através do insulto, da humilhação e da agressividade. E a generalidade das pessoas não é assim. Mas contaminam o ambiente moral de uma sociedade. Numa experiência, a equipa de Bail observou como um grupo de extremistas seguiu mensagens criadas por computadores com ideias opostas às suas e viu como eles, sem se aperceberem, convergiram rapidamente à volta dessas “pessoas”. Pessoas que não existem, eram bots, os “robôs” da Internet, respondendo violentamente às mensagens. Os sociólogos viram como, em pouco tempo, os extremistas passaram a seguir-se uns aos outros. Isto aconteceu com extremistas de esquerda e de direita. Estes ataques coletivos servem para aproximar os extremistas e não espelham tendências da sociedade.

Um outro aspeto perverso é que há muitos craques informáticos que resvalam para o gosto pela malfeitoria dos hackers. Os hackers radicais monitorizam os seguidores. Por exemplo, se um seguidor  deixar de seguir o "amigo" A, nas redes sociais, a plataforma, como o Facebook ou outra, por defeito não informa A, pois nós podemos silenciar A e deixar de ver os seus posts e só nós é que sabemos. Mas os hackers extremistas sabem como fazê-lo. O Laboratório da Polarização da Duke University, conseguiu entrevistar alguns destes hackers que revelaram ter usado apps externas às plataformas que conseguem identificar as pessoas que deixaram de os seguir nessas redes. E que, quando as encontram, fazem ataques concertados contra elas, num ambiente de vingança, como se fossem traidores. Este é um exemplo que, como diz Chris Bail, mostra como as redes sociais facilitam e dão força aos extremistas.

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