O Arbusto Ardente - tríptico de Nicolas Froment, 1476, óleo em madeira, Avinhão.
Encomenda de René de Anjou, no painel esquerdo.
Encomenda de René de Anjou, no painel esquerdo.
No painel da direita a segunda esposa, Jeanne de Laval.
Encontra-se na Catedral de Saint-Sauveur, Aix-en-Provence.
Encontra-se na Catedral de Saint-Sauveur, Aix-en-Provence.
Embora pouco conhecido hoje, René de Anjou - "o bom rei René", [1409 - 1480] - foi uma das mais importantes figuras da cultura europeia durante os anos que precederam a Renascença. Ele recebeu, ao longo de sua vida, uma grande quantidade de títulos: rei de Nápoles e Sicília; conde de Bar; conde da Provença; conde do Piemonte; conde de Guise; duque de Calábria; duque de Anjou, duque da Lorena; rei da Hungria; rei de Aragão, Valência, Majorca e Sardenha; rei de Jerusalém. Este último era, certamente, honorário. Apesar disso, ele evocava uma continuidade que retrocedia até Godofredo de Bulhão, [1060 - 1100], reconhecido por outros potentados europeus. Uma das filhas de René, Margarida de Anjou, casou-se em 1445 com Henrique II de Inglaterra, e desempenhou um papel importante na Guerra das Rosas.
Em 16 de julho de 1429, René de Anjou oficialmente trouxe a Lorena e o Ducado de Bar para o seu cunhado, o rei Carlos VII. Eles fizeram juntos, acompanhados por Joana d'Arc, uma entrada triunfal em Laon, Soissons, Provins, Coulommiers e Compiègne.
O Duque de Bedford, regente do Reino da França, deixou Paris com um exército de dez mil homens para se encontrar com o Exército Francês, dois dois exércitos de forças iguais, 14 de agosto de 1429, perto da vila de Montépilloy, na Picardia, que não chegaram a lutar. René contribuiu para a cessação das lutas franco-inglesas, desempenhando um papel ativo nas negociações da Tours. A carreira de René de Anjou parece ter sido, em sua fase inicial, associada de algum modo com a de Joana d'Arc. Até onde se sabe, Joana nasceu na cidade de Domrémy, no ducado de Bar, o que a tornava dependente de René.
A primeira aparição de Joana d'Arc na história aconteceu em 1429, quando ela surgiu na fortaleza de Vaucouleurs, a alguns quilómetros de Domrémy, ao longo do Meuse. Ela se apresentou ao comandante da fortaleza anunciando a sua "missão divina": salvar a França dos invasores ingleses e assegurar que o príncipe herdeiro, depois chamado Carlos VII, fosse coroado rei. Para realizar esta missão, ela deveria juntar-se ao príncipe em sua corte de Chinon, no Loire, a sudoeste. Mas ela não solicitou passagem para Chinon ao comandante em Vaucouleurs; solicitou uma audiência especial com o duque da Lorena, sogro e tio-avô de René. Em deferência à sua solicitação, Joana foi recebida em audiência pelo duque, em sua capital, Nancy. Sabe-se que, quando ela chegou lá, René de Anjou estava presente. E quando o duque da Lorena lhe perguntou o que desejava, ela respondeu explicitamente, com palavras que têm constantemente intrigado os historiadores: "Seu genro, um cavalo e alguns bons homens para me acompanharem pela França.”
As especulações sobre a natureza da conexão entre René de Anjou e Joana d'Arc proliferaram, tanto na época como mais tarde; segundo algumas fontes, provavelmente inexatas, os dois eram amantes. O facto é que os dois se conheceram, e que René estava presente quando Joana partiu pela primeira vez em sua missão. Além disso, cronistas contemporâneos sustentam que, quando Joana partiu para a corte do príncipe em Chinon, René a acompanhou. E os mesmos cronistas declaram que René estava realmente presente ao seu lado durante o cerco a Orleães. Nos séculos que se seguiram, uma tentativa sistemática parece ter sido feita para suprimir todos os traços do possível papel desempenhado por René na vida de Joana. Os últimos biógrafos de René não falam sobre o seu paradeiro ou suas atividades no período entre 1429 e 1431, no apogeu da carreira de Joana. Usualmente, e tacitamente, assume-se que ele estava vegetando numa corte ducal em Nancy, mas nenhuma evidência confirma esta possibilidade.
Se René de Anjou esteve associado a Joana d'Arc, a maior parte da sua carreira posterior foi bem menos belicosa. Ao contrário de muitos contemporâneos seus, René era mais um homem de corte que um guerreiro. Nesse aspeto, estava deslocado de sua época, era um homem à frente de seu tempo, antecipando os cultivados príncipes italianos da Renascença. Amante da literatura, escreveu muito e ilustrou os seus próprios livros. Compôs poesia e alegorias místicas, bem como compêndios de regras de torneios. Procurou promover o avanço do conhecimento, e durante algum tempo empregou Cristóvão Colombo. Envolveu-se com a tradição esotérica, incluindo em sua corte um astrólogo judeu, cabalista e médico, chamado Jean de Saint Rémy. Segundo várias narrativas, Jean foi o avô de Nostradamus, o famoso profeta do século XVI.
Os interesses de René de Anjou incluíam a cavalaria e os romances do rei Artur, e o 'cálice', com o qual parece ter tido uma preocupação particular. Diz-se que tinha um grande orgulho de uma magnífica taça de pórfiro vermelho obtida em Marselha que, segundo ele, havia sido utilizada nas bodas de Canaã. Isto não pressupõe, naturalmente, a existência de uma sociedade secreta. Mas torna-a mais plausível. E se tal sociedade de facto existiu, o homem que a presidia pode bem ter sido René de Anjou. Em virtude das numerosas propriedades italianas, ele passou alguns anos na Itália; e através de sua íntima amizade com a família Sforza, que governava Milão, estabeleceu contacto com os Medici, de Florença. Existem boas razões para acreditar que foi principalmente a influência de René que moveu Cosme de Medici a embarcar numa série de projetos ambiciosos, destinados a transformar a civilização ocidental.
Os interesses de René de Anjou incluíam a cavalaria e os romances do rei Artur, e o 'cálice', com o qual parece ter tido uma preocupação particular. Diz-se que tinha um grande orgulho de uma magnífica taça de pórfiro vermelho obtida em Marselha que, segundo ele, havia sido utilizada nas bodas de Canaã. Isto não pressupõe, naturalmente, a existência de uma sociedade secreta. Mas torna-a mais plausível. E se tal sociedade de facto existiu, o homem que a presidia pode bem ter sido René de Anjou. Em virtude das numerosas propriedades italianas, ele passou alguns anos na Itália; e através de sua íntima amizade com a família Sforza, que governava Milão, estabeleceu contacto com os Medici, de Florença. Existem boas razões para acreditar que foi principalmente a influência de René que moveu Cosme de Medici a embarcar numa série de projetos ambiciosos, destinados a transformar a civilização ocidental.
Em 1439, enquanto René residia na Itália, Cosme de Medici começou a enviar agentes seus por todo o mundo em busca de manuscritos antigos. Então, em 1444, Cosme fundou a primeira biblioteca pública da Europa, a Biblioteca de San Marco, e começou assim a desafiar o longo monopólio de conhecimento, detido pela Igreja. Por ordem expressa de Cosme, o corpus do pensamento platónico, neoplatónico, pitagórico, gnóstico e hermético foi pela primeira vez traduzido e se tornou rapidamente acessível. Cosme também instruiu a Universidade de Florença a começar o ensino do grego, pela primeira vez na Europa após setecentos anos. E se encarregou de criar uma academia de estudos pitagóricos e platónicos. A Academia de Cosme gerou, por toda a península italiana, uma série de instituições similares, que se tornaram bastiões da tradição esotérica ocidental. A partir deles, a grande cultura da Renascença começou a florescer.
René de Anjou não só contribuiu em certa medida para a formação de academias, como também parece ter repassado a elas um de seus favoritos temas simbólicos, o da Arcádia. Foi na própria carreira de René que o motivo da Arcádia parece ter surgido na cultura ocidental pós-cristianismo. Em 1449, por exemplo, em sua corte de Tarascon, Provença, René representou uma série híbrida de torneios e máscaras, no qual cavaleiros se inclinavam um contra o outro ao mesmo tempo que interpretavam uma espécie de drama ou peça. Interpretado por sua amante na época, a pastora era explicitamente uma figura arcadiana, que incorporava atributos românticos e filosóficos. Ela presidia ao torneio no qual cavaleiros assumiam identidades alegóricas, representando valores e ideias que conflituavam umas com as outras. O evento era uma fusão singular do romance pastoral arcadiano com o espalhafato da távola redonda e dos mistérios do cálice sagrado.
A Arcádia figura também em outros trabalhos de René. Ela é, com frequência, identificada com uma fonte ou uma sepultura, ambas associadas a uma corrente subterrânea, usualmente relacionada com o rio Alpheus, o rio central da Arcádia geográfica, na Grécia, que corre sob a terra e remonta à superfície na fonte de Arethusa, na Sicília. Desde a mais remota Antiguidade até o Kubla Khan, de Colendge, o rio Alpheus é considerado sagrado. Seu próprio nome deriva da mesma raiz que a palavra grega alpha, que significa primeiro, ou fonte. Para René, uma corrente subterrânea parece ter sido um tema extremamente rico em ressonâncias simbólicas e alegóricas. Entre outras coisas, ele pareceria significar a tradição esotérica subterrânea do pensamento pitagórico, gnóstico, cabalístico e hermético.
Nas academias italianas, a imagem de uma corrente subterrânea parece ter sido investida de todos esses níveis de significado, aliás recorrentes. Tanto que as próprias academias têm sido frequentemente denominadas arcadianas. Em 1502, um trabalho maior foi publicado, um longo poema intitulado Arcádia, por Jacopo Sannazaro.
René de Anjou não só contribuiu em certa medida para a formação de academias, como também parece ter repassado a elas um de seus favoritos temas simbólicos, o da Arcádia. Foi na própria carreira de René que o motivo da Arcádia parece ter surgido na cultura ocidental pós-cristianismo. Em 1449, por exemplo, em sua corte de Tarascon, Provença, René representou uma série híbrida de torneios e máscaras, no qual cavaleiros se inclinavam um contra o outro ao mesmo tempo que interpretavam uma espécie de drama ou peça. Interpretado por sua amante na época, a pastora era explicitamente uma figura arcadiana, que incorporava atributos românticos e filosóficos. Ela presidia ao torneio no qual cavaleiros assumiam identidades alegóricas, representando valores e ideias que conflituavam umas com as outras. O evento era uma fusão singular do romance pastoral arcadiano com o espalhafato da távola redonda e dos mistérios do cálice sagrado.
A Arcádia figura também em outros trabalhos de René. Ela é, com frequência, identificada com uma fonte ou uma sepultura, ambas associadas a uma corrente subterrânea, usualmente relacionada com o rio Alpheus, o rio central da Arcádia geográfica, na Grécia, que corre sob a terra e remonta à superfície na fonte de Arethusa, na Sicília. Desde a mais remota Antiguidade até o Kubla Khan, de Colendge, o rio Alpheus é considerado sagrado. Seu próprio nome deriva da mesma raiz que a palavra grega alpha, que significa primeiro, ou fonte. Para René, uma corrente subterrânea parece ter sido um tema extremamente rico em ressonâncias simbólicas e alegóricas. Entre outras coisas, ele pareceria significar a tradição esotérica subterrânea do pensamento pitagórico, gnóstico, cabalístico e hermético.
Nas academias italianas, a imagem de uma corrente subterrânea parece ter sido investida de todos esses níveis de significado, aliás recorrentes. Tanto que as próprias academias têm sido frequentemente denominadas arcadianas. Em 1502, um trabalho maior foi publicado, um longo poema intitulado Arcádia, por Jacopo Sannazaro.
Les bergers d'Arcadie - Nicolas Poussin, 1638/1640
O círculo italiano de René de Anjou, alguns anos antes, incluía um Jacques Sannazaro, provavelmente pai do poeta. Durante o século XVI, a Arcádia e a corrente subterrânea tornaram-se uma moda cultural proeminente. Na Inglaterra elas inspiraram o mais importante trabalho de Sir Philip Sidney, Arcádia. Na Itália, inspiraram figuras ilustres, como Torquato Tasso, cuja obra-prima, Jerusalém Libertada, descreve a captura da Cidade Santa por Godofredo de Bulhão. Por volta do século XVII, o motivo Arcádia culminou com Nicolas Poussin e Les Bergers d'Arcadie.
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