segunda-feira, 17 de junho de 2019

Mente e Realidade, com Gareth Evans


Gareth Evans [1946-1980] estudou Filosofia, Política e Economia no University College da Universidade de Oxford de 1964 a 1967. Tornou-se um senior scholar em Christ Church, Oxford (1967-1968) e um Kennedy Scholar na Universidade de Harvard e na Universidade da Califórnia em Berkeley (1968-1969).
Gareth Evans foi um brilhante carismático jovem filósofo de Oxford, tendo merecido o prestigiante cargo de “Wilde Reader” em Filosofia da Mente em Oxford com a precoce idade de 33 anos. Pouco tempo depois de aceitar o cargo, misteriosamente, adoeceu. Isto seguiu-se a um incidente no México, onde se encontrava como professor visitante, no qual levou um tiro de espingarda numa perna como resultado de uma tentativa falhada de rapto de um amigo filósofo mexicano com quem estava na altura por acaso. Pouco tempo depois foi-lhe diagnosticado cancro em estado avançado, e em poucos meses morreu.
Uma vez que era de longe o melhor jovem filósofo na Grã-Bretanha, a tragédia chocou todo o mundo filosófico. Os seus escritos exerceram uma enorme influência no estado da Filosofia. O seu livro póstumo, The Varieties of Reference, é ainda um trabalho maior da filosofia da mente e da linguagem. Em sua breve carreira, Evans contribuiu substancialmente nos campos da lógica, metafísica, filosofia da linguagem e filosofia da mente.
Evans fez parte do florescimento dos estudos filosóficos sobre a mente e a linguagem na Universidade de Oxford após 1970, sob a influência de Donald Davidson, dos Estados Unidos da América, e do seu conterrâneo Saul Kripke. Ele foi um dos muitos filósofos britânicos que mais contribuíram para o desenvolvimento do projeto semântico formal para as línguas naturais, tendo editado em parceria com John McDowell a coletânea sobre o tema Truth and Meaning. Sob a influência de Peter Strawson, Evans continuou a tradição dos estudos filosóficos de Oxford de investigar as condições para a objetividade do pensamento sob um viés kantiano.
Seu livro póstumo The Varieties of Reference, ainda é muito influente nos estudos de filosofia da mente e filosofia da linguagem, desenvolve teses do filósofo e amigo John McDowell (editor do livro) sobre os pensamentos acerca de objetos singulares (por oposição às propriedades de objetos), tomando-os como modos especiais da mente vincular-se ao mundo.
          Em filosofia da realidade existem duas posições antagónicas: a dos antirrealistas e a dos realistas, ou seja, a velha questão do idealismo e do realismo, se o mundo depende de algum modo das nossas mentes ou se é completamente independente delas. Este é um tema filosófico com uma longa tradição.
          Depois de Einstein ter apresentado as teorias acerca de como é o universo, sem ter recorrido a qualquer observação empírica, mas à medida que os anos vão passando e as observações empíricas as vão confirmando uma a uma, leva-nos a pensar que os realistas são capazes de estar mais certos que os antirrealistas.
          Os antirrealistas dizem coisas do género: se quisermos descobrir algo sobre a estrutura básica da realidade, devemos investigar o modo como falamos sobre a realidade. A questão era a seguinte: será que o significado das nossas frases deve ser explicado em função dos indícios que temos para as afirmar, ou será uma questão de condições de verdade que nada têm intrinsecamente que ver com indícios? Isto relaciona-se com o idealismo, a ideia de que o mundo é em última análise mental. O verificacionismo reduz-se aos estados sensoriais que nos levam a acreditar nos indícios que nos são dados pelos sentidos. Por exemplo, o que nos aparece visualmente, como estado do sistema sensorial, é mais um parece. Assim, a verdade do que dizemos para um antirrealista vai depender dos nossos estados sensoriais. Ao passo que um realista, baseando-se nos astrofísicos teóricos do calibre de Einstein, dirá que a verdade do mundo real que eles apresentam é independente de qualquer estado sensorial. Os realistas defendem que há objetos no mundo intrinsecamente independentes da mente, que ao provocarem os nossos estados sensoriais são eles as causas dos nossos estados mentais, os quais por sua vez nos dão os indícios da sua existência.
          Para um antirrealista a realidade esgota-se em tudo aquilo que faz parte do nosso conhecimento. O que desconhecemos é como se não existisse. Ao passo que para um realista há coisas e factos que existem quer tenhamos ou não conhecimento delas.  Que o realista diz é que a realidade transcende o nosso conhecimento. A realidade é o que é, defende o realista, quer possamos saber coisas sobre ela quer não. Ao passo que o antirrealista acha que a realidade é, em última análise, o produto dos nossos estados cognitivos.
          Não podemos confundir a própria realidade com as formas que temos de a conhecer. A realidade é uma coisa; o conhecimento que temos dela, outra. Os objetos físicos não são a mesma coisa que os estados sensoriais que temos quando os percecionamos. E também as partículas físicas não são a mesma coisa que os contadores que assinalam a sua presença. Ora, como os estados sensoriais da realidade são os estados a que a tradição científica classifica de objetividade, então o mundo real, tal como ele é em si, independente das mentes humanas, só pode ser apreendido teoricamente. Vemos de facto objetos físicos e as suas propriedades, mas não podemos ter a pretensão de os ver puramente, objetivamente, tal como são representados pela física empírica ou observacional.
          Depois da correção de alguns equívocos relacionados com a nossa perceção do mundo exterior à nossa mente, apesar de não recomendar que trabalhemos muito com a categoria dicotómica subjetivo/objetivo, podemos afirmar que o mundo observável resulta da nossa necessária subjetividade percetiva. Ao passo que é através da racionalidade que conseguimos formar através da ciência uma representação puramente objetiva do mundo. Temos conceitos que não têm qualquer laivo de subjetividade, mesmo com uma perceção irremediavelmente subjetiva.
          É inescapável o conceito de pensamento quando falamos de assuntos relacionados com um outro conceito que é o de mente. Há quem entenda que mente e cérebro é a mesma coisa. Mas eu não acho. Quando faço uma pergunta à minha neta e ela demora a responder, eu digo: pensa primeiro à vontade antes de responder; ou quando lhe mostro um pássaro amarelo e lhe pergunto como se chama esse pássaro, não estou a ver o que oo cérebro dela está a fazer, mas sim toda a sua atitude enquanto pensa e responde. Pensar é uma espécie de discurso silencioso no qual os símbolos estão causalmente ligados a objetos exteriores. Para colocar a coisa de forma simples: aquilo em que pensamos é uma questão de saber que objetos causam os símbolos que nos surgem na cabeça.
          Portanto, não sendo possível reduzir conceitos mentais a conceitos físicos, Donald Davidson procurou aderir a essa mundividência basicamente materialista, mas ao mesmo tempo defendendo que não se podia fazer a mente ser apenas o cérebro. Daí retirou uma série de conceitos com os quais desenvolveu algumas ideias a que chamou “monismo anómalo”, por ser uma espécie de materialismo não redutor.

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