Vamos todos morrer. No 1º de novembro fala-se da morte, não do morrer. Mas a morte, propriamente dita, não existe. As pessoas falam dela como se fosse um agente, um ser ou uma substância. É como o tempo. Mas é assim que as pessoas falam quando se referem ao processo humano de morrer. Ora, no 1º de novembro vive-se o luto. E isso é necessário, particularmente num tempo em que se mascara ou se esconde o momento de morrer. Ou se prolonga a vida, em agonia, inapropriadamente.
Isto de importar a palavra Halloween tem o efeito de diluir o medo. Dá a impressão de estarmos a celebrar uma festa estrangeira. A véspera do dia de Todos os Santos faz medo porque o dia de Todos os Santos é o dia dos mortos e os mortos fazem medo, sobretudo quando se pensa que estão de algum modo vivos, perturbados pela véspera do dia deles – e pela noite. Falar em bruxas também tira o medo. Parece que estamos dispostos a fazer tudo para não falar nos mortos. E nos irmãos dos mortos, na família de efabulações que fazemos à volta dos mortos: os fantasmas.
Quando um doente pergunta “vou morrer?”, é preciso muito cuidado com a resposta, diz Madalena Feio. Geralmente, devolve-se questionando: “Porque é que me está a perguntar isso?” É preciso aferir se a resposta é algo que o doente quer ouvir ou não e se é essa realmente a pergunta que quer ver respondida. “Às vezes, há um desfasamento entre o que nós pensamos e aquilo que a pessoa espera ouvir. Nunca damos um número certo, damos sempre um intervalo de tempo. Dizemos que pensamos que esse tempo se calhar não se mede em meses, mas talvez em semanas e dias, mas que nós nos enganamos muito, quer num sentido quer noutro, e isso é uma grande verdade.”
A morte é a única experiência humana que não podemos partilhar – é impossível representar a própria morte, a não ser como espectador, pelo que é sempre através do que acontece aos outros que dela tomamos conhecimento ou proximidade, pois, quando chegar a nossa vez, já não poderemos comunicá-la. Desaparecemos como consciência de nós. Deste modo, a morte impõe a inexorável vulnerabilidade humana e a limitação do Si, do Eu. Mais do que um problema ou uma interrogação à razão, a morte constitui um enigma, um mistério – partida sem regresso, ponto de interrogação no limiar do desconhecido. O horror da morte, a angústia da morte, é o pensamento que perturba a pessoa pela perda da sua individualidade. É a Consciência da perda de Si. O apaziguamento dessa consciência para algumas pessoas é a esperança, a última a morrer, de que há um Além, uma sobrevivência post mortem.
Estar vivo é podermos morrer a qualquer momento. A prática da consciencialização da noção de quanto valiosa é a vida, justamente porque a podemos perder a qualquer momento, dada a nossa tremenda vulnerabilidade, é de um valor supremo. Não acreditamos na vida eterna. Mas é bom acreditar na "crença na vida eterna". O que isto quer dizer? Quer dizer que sabemos todos que somos mortais, que somos finitos, que vamos morrer, mas como ferramenta de sobrevivência, acreditar que temos alma, e que ela é imortal, é bom para melhor defendermos a vida de todos em sociedade. A natureza não é sociável.
A ideia de imortalidade tem-se mostrado cada vez mais cativante para a ciência e para a medicina moderna. Por exemplo, na Universidade de Northwestern, nos Estados Unidos, cientistas fazem ou fizeram experiências em minhocas apagando os genes que fazem as mutações que estão na base do envelhecimento. Claro que uma coisa são os humanos, outra coisa são as minhocas, mas os cientistas entusiasmam-se muito com as conquistas técnicas. Outro exemplo é o rejuvenescimento de ratos velhos por meio da infusão de sangue de ratos novos. Os pesquisadores acreditam que o procedimento poderia funcionar com humanos. Companhias do Silicon Valley, região dos EUA que concentra algumas das principais empresas de tecnologia do mundo, estão agindo ativamente nesse setor. Uma enorme quantidade de dinheiro está sendo investida na pesquisa da imortalidade, e há grandes nomes participando, entre eles: Larry Ellison - um dos homens mais ricos do mundo e um dos donos da Oracle, empresa de sistemas de computação. Sergey Brin - co-fundador do Google e da Calico, que trabalha com saúde e bem-estar. Aubrey de Grey - o cientista e pesquisador britânico da área da medicina regenerativa é um dos maiores especialistas do Planeta em gerontologia. Essas pessoas famosas confessam sentir medo de envelhecer e morrer, por isso trabalham encarniçadamente para encontrar o tal “elixir da eterna juventude”. É claro que, quando nos remetemos para o transcendente, invocando a divindade, queremos que ela seja inteligente como nós. Com uma divindade antropomorfizada, capaz de ajuizar valores, podemos estabelecer com ela compromissos, e receber favores prestando-lhe homenagem. É este o principal benefício que os seres humanos, não os outros animais, obtém com a religião.
A morte é a única experiência humana que não podemos partilhar – é impossível representar a própria morte, a não ser como espectador, pelo que é sempre através do que acontece aos outros que dela tomamos conhecimento ou proximidade, pois, quando chegar a nossa vez, já não poderemos comunicá-la. Desaparecemos como consciência de nós. Deste modo, a morte impõe a inexorável vulnerabilidade humana e a limitação do Si, do Eu. Mais do que um problema ou uma interrogação à razão, a morte constitui um enigma, um mistério – partida sem regresso, ponto de interrogação no limiar do desconhecido. O horror da morte, a angústia da morte, é o pensamento que perturba a pessoa pela perda da sua individualidade. É a Consciência da perda de Si. O apaziguamento dessa consciência para algumas pessoas é a esperança, a última a morrer, de que há um Além, uma sobrevivência post mortem.
Estar vivo é podermos morrer a qualquer momento. A prática da consciencialização da noção de quanto valiosa é a vida, justamente porque a podemos perder a qualquer momento, dada a nossa tremenda vulnerabilidade, é de um valor supremo. Não acreditamos na vida eterna. Mas é bom acreditar na "crença na vida eterna". O que isto quer dizer? Quer dizer que sabemos todos que somos mortais, que somos finitos, que vamos morrer, mas como ferramenta de sobrevivência, acreditar que temos alma, e que ela é imortal, é bom para melhor defendermos a vida de todos em sociedade. A natureza não é sociável.
A ideia de imortalidade tem-se mostrado cada vez mais cativante para a ciência e para a medicina moderna. Por exemplo, na Universidade de Northwestern, nos Estados Unidos, cientistas fazem ou fizeram experiências em minhocas apagando os genes que fazem as mutações que estão na base do envelhecimento. Claro que uma coisa são os humanos, outra coisa são as minhocas, mas os cientistas entusiasmam-se muito com as conquistas técnicas. Outro exemplo é o rejuvenescimento de ratos velhos por meio da infusão de sangue de ratos novos. Os pesquisadores acreditam que o procedimento poderia funcionar com humanos. Companhias do Silicon Valley, região dos EUA que concentra algumas das principais empresas de tecnologia do mundo, estão agindo ativamente nesse setor. Uma enorme quantidade de dinheiro está sendo investida na pesquisa da imortalidade, e há grandes nomes participando, entre eles: Larry Ellison - um dos homens mais ricos do mundo e um dos donos da Oracle, empresa de sistemas de computação. Sergey Brin - co-fundador do Google e da Calico, que trabalha com saúde e bem-estar. Aubrey de Grey - o cientista e pesquisador britânico da área da medicina regenerativa é um dos maiores especialistas do Planeta em gerontologia. Essas pessoas famosas confessam sentir medo de envelhecer e morrer, por isso trabalham encarniçadamente para encontrar o tal “elixir da eterna juventude”. É claro que, quando nos remetemos para o transcendente, invocando a divindade, queremos que ela seja inteligente como nós. Com uma divindade antropomorfizada, capaz de ajuizar valores, podemos estabelecer com ela compromissos, e receber favores prestando-lhe homenagem. É este o principal benefício que os seres humanos, não os outros animais, obtém com a religião.
Há alguns doentes com doença crónica avançada que pedem para morrer, apesar dos seus sintomas físicos e psicológicos terem sido tentados minimizar medicamente. Há doentes que, apesar disso, continuam a pensar que pela sua incapacidade de fazer o que antes faziam - a perda do seu lugar na sociedade, no trabalho e mesmo na família - pensam que já não vale a pena viver. É preferível morrer, pensam eles, do que viver, sim, num penar desgraçado. Não é morrer em si que está em questão, dado que seja qual for a sua vontade, terão mesmo de morrer. Apenas não querem viver daquela maneira.
Quem trabalha em cuidados paliativos por vezes nega que haja pedidos para morrer nesse contexto. Alegam que os problemas estão todos resolvidos. Mas isso apenas mostra quão cínica e hipócrita é a humanidade demasiadamente humana. A maioria das pessoas que morrem em Portugal não morrem em unidades de cuidados paliativos. E a falta de comunicação com os doentes acerca do viver e do morrer em todos os sítios, seja no domicílio seja no Hospital, muitos doentes com doenças crónicas avançadas e debilitantes, nunca ouviram um médico ou um enfermeiro abordar esse assunto. É sempre através de rodeios e eufemismos, quando muito alegoricamente no âmbito religioso.
As questões psicossociais muitas vezes não são abordadas pelo médico porque passou a ser um assunto filosófico que não faz parte da sua competência. Outros assumem que os doentes, se estivessem interessados, espontaneamente revelariam as suas preocupações. No entanto, a investigação revela que só cerca de 25% dos doentes o fazem. Os doentes podem pensar que é inapropriado abordar os médicos com essas preocupações, que não há tempo para isso, que os profissionais de saúde não quererão ou não poderão ajudá-los ou, ainda, que os seus sentimentos são pouco razoáveis. Tudo isto pode contribuir para que os doentes não revelem o seu desejo de morrer.
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