quarta-feira, 8 de outubro de 2025

Um caso único em toda a sua dimensão universal

O que é que os judeus têm de tão especial ?

De facto, há uma boa base histórica e política para dizer que a experiência judaica é sem paralelo. A criação do Estado de Israel em 1948 foi vista pelos judeus como reparação histórica e refúgio seguro. Mas também transformou o “problema judaico” em questão geopolítica. O conflito israelo-palestiniano gerou novas hostilidades, agora não apenas religiosas ou raciais, mas políticas e nacionais. Para parte do mundo árabe e islâmico, o Estado judeu é um corpo estranho, visto como produto do imperialismo ocidental. Para a extrema-direita europeia e americana, Israel alimenta a retórica de “judeus controlam a política mundial”.

O antissemitismo continua, mas assume formas diferentes. Na extrema-direita: teorias da conspiração sobre “domínio financeiro global”. Na extrema-esquerda a aversão é radical, uma mistura de hostilidade generalizada aos judeus. O paradoxo é que os judeus são hoje, demograficamente, um povo muito pequeno (menos de 0,2% da população mundial), mas politicamente e simbolicamente continuam a ter um peso enorme.

O “especial” dos judeus não é tanto algo neles mesmos, mas o facto de serem uma minoria persistente, visível e influente, que atravessou impérios, religiões e ideologias sem desaparecer. Essa resiliência é interpretada ora como exemplo de força cultural, ora como ameaça, e por isso gera tanto fascínio como hostilidade.

Muitos povos da Antiguidade desapareceram: hititas, sumérios, cartagineses, partos, e também filisteus (alegadamente os antepassados dos palestinianos). Os judeus, apesar da sua saga, desde o tempo das duas destruições do "Templo", seguido da diáspora no tempo do Império Romano e da ascensão do Cristianismo, mantiveram a sua língua litúrgica, o hebraico, bem como as leis, os costumes, e a sua férrea identidade. Não é o único povo de diáspora, outras diásporas existem (arménios, gregos, ciganos), mas nenhuma com tanta persistência simbólica universal. Isto já dá ao caso judaico uma aura de “sobrevivência milagrosa” aos olhos da História.

O judaísmo não ficou apenas como uma religião étnica. Ele gerou duas das maiores religiões universais da humanidade: Cristianismo e Islamismo. Assim, mesmo os povos que perseguiam judeus tinham de lidar com eles como raiz das próprias crenças. Esse paradoxo (serem a origem, mas recusarem-se a fundir-se no ramo maioritário) alimentou um ressentimento profundo. Nenhuma outra minoria carrega este peso universal: ser minoria e ao mesmo tempo “fundamento espiritual” do Ocidente e do Islão.

O ódio aos judeus é o ódio mais duradouro e adaptável da História. O antissemitismo é, para todos os efeitos, um modelo de ódio, que começou na Roma Antiga como questão política, em que recusaram sempre se submeterem a outras culturas. Na Idade Média os cristãos resolveram acusá-los de terem matado Deus (Jesus Cristo). O deicídio era, no entanto, uma questão religiosa. Mas no século XIX já se tratava de uma questão racial. E no século XX culminou no Holocausto, uma tentativa de extermínio. Hoje passa a ser uma questão geopolítica na convivência entre israelitas e palestinianos. O ódio nunca desaparece, apenas muda de roupagem conforme a ideologia dominante. Nenhuma outra minoria teve um ódio tão “plástico” e reaproveitável ao longo dos séculos.

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