quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

O mapa mundo de Hereford





Mapa de Hereford

Datado do fim do século XIII, o mapa mundo de Hereford, inscrito num único pedaço de pele de vitela, é um dos mapas medievais mais importantes do mundo. Desde o início, o mapa foi projetado não para a navegação prática, mas como uma inspiradora obra de arte. Seguindo a tradição medieval, o mapa circular mostra o mundo conhecido com Jerusalém ao centro. Em alguns lugares, ele é surpreendentemente preciso; em outros, completamente errado. Os textos para a Europa e para a África, por exemplo, estão trocados.


mapa de Hereford também está cheio de curiosas anormalidades, desde animais misteriosos e cenas bíblicas até aos fantasiosos e bizarros povos desconhecidos de terras distantes. Ao todo, o mapa inclui cerca de 500 ilustrações de pessoas, lugares, animais, cidades, incluindo 15 eventos bíblicos e oito da mitologia clássica. Ele foi criado provavelmente em Lincolnshire, ou em Yorkshire, e esteve praticamente sempre guardado na Catedral de Hereford. Ele pode ter sido inspirado por outro mapa mundo conhecido como mapa Ebstorf, que foi desenhado por volta de 1239 e era quase seis vezes maior que o mapa de Hereford. Embora existam cópias, o mapa Ebstorf original foi destruído num bombardeamento da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, deixando o Hereford - 1,5m por 1,2m - como o maior mapa sobrevivente da Idade Média, pelo menos que se conheça.



Catedral de Hereford

Havia judeus em Catai, protegidos pelo cã, judeus na abrasadora Núbia, judeus no reino hindu de Deli, onde o soberano possuía setecentos elefantes. Nestes mapas - Ebsdorf e Hereford - Jesus Cristo ainda figurava com destaque sobre o planeta. Mas depois desapareceram por completo, o que é significativo se repararmos em quem passou a dominar a cartografia. No Extremo Oriente, na vizinhança de Gog e Magog, era Cristo no Paraíso, às vezes, de maneira menos plausível, o Anticristo. Mas isso é sub reptício, porque a coroa e a barba tornam mais provável que se trate de David.

O mapa de Cresques vem depois. Ao que se dizia, tendo conquistado havia pouco a ilha de Maiorca, o rei de Aragão tinha planos cruzadistas em relação às Canárias, de onde talvez pudesse ter lançado a habitual missão de pregar e lucrar no continente africano, dominado pelos muçulmanos. Foi nessa época que os reis de Aragão se tinham lançado ao mar a fim de criar um estado através do Mediterrâneo. De 
Valência e da Catalunha às ilhas Baleares, à Sardenha, à Córsega e à Sicília, um mini império tão extenso que se dizia que até os peixes ostentavam na cauda as barras douradas e escarlates de Aragão.

A caminho de Chanbaleth, a capital da Catai de Kublai Khan, a caravana de Marco Polo transpôs o planalto do Cáucaso e avançou pela Rota da Seda para penetrar na distante Ásia. Parelhas de camelos seguem na vanguarda, seguidas por uma escolta de soldados a pé, e depois os viajantes, liderados pelo próprio Marco Polo, que, sorridente, conversa com um tártaro. No tráfego intenso desses homens em movimento se entrechocam lendas e factos, informações colhidas com esforço e fantasias compulsivas, novas descobertas e tradições. 
A recaptura de Jerusalém e da Terra Santa, e a força da missão cavaleiresca das cruzadas não se tinham apagado da imaginação cristã, sobretudo na Espanha. O mais importante é que, por uma razão ou outra, sem o peso das obsessões cruzadistas unificantes da cristandade, da missão global de conversão, os judeus estavam aqui, ali, em todas as partes, e embora muitos tivessem aportado em Maiorca no século XIII, junto com os seus conquistadores cristãos, muito do valor deles para os governantes estava exatamente em servirem de intermediários com o inimigo muçulmano. 

Falavam e liam o árabe, traziam para o mundo cristão conhecimentos de astronomia, medicina e filosofia, adquiridos aos árabes, e, mais importante, podiam negociar com as potências e os portos do Magreb, no norte da África, e com o Egito. Não se permitia aos judeus possuir navios, mas os reis independentes de Maiorca e os soberanos aragoneses que lhes sucederam ordenavam aos armadores cristãos que recebessem cargas originárias de países muçulmanos e embarcadas por judeus. Eles eram os únicos habitantes de Maiorca que tinham liberdade de ir aonde quisessem, se bem que nem sempre com segurança, cruzando as fronteiras linguísticas, religiosas e aduaneiras do Mediterrâneo. As costas sobre as quais havia mais informações náuticas e os nomes de portos trazem a marca de suas idas e vindas pelas disputadas ilhas do Egeu e, com mais audácia, pelas do Atlântico. A oeste da longa costa da Guiné ficavam, embora não marcados com exatidão, arquipélagos convidativos. Ilhas cujos nomes estavam fadados a minar a imaginação.

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