O pessimismo antropológico, a ideia de que a natureza humana é inclinada ao egoísmo, à violência ou à irracionalidade, tem fama de ser imputado a gente conservadora de direita. Mas isso é um mito, não é monopólio exclusivo da direita conservadora. Ele aparece tanto na esquerda como na direita, embora com motivações e expressões diferentes. Se o ser humano é naturalmente mau ou fraco, então precisa de instituições fortes para contê-lo. Desde Hobbes que vários filósofos defendem, de formas diferentes, que o ser humano precisa de freios, seja pela autoridade do Estado, da Igreja, ou das tradições.
É mais frequente um utopista otimista acreditar que somos máquinas racionais de otimização do que um cético cínico pessimista. Pois é da irracionalidade que tomamos decisões morais sem saber porquê. Daí que seja uma desgraça quando a nossa racionalidade tenta eliminar essas irracionalidades. A racionalidade pode ser a chave para estabelecer a paz, mas a importância irracional dos valores sagrados é a chave para estabelecer uma paz duradoura.
Cornelius Castoriadis (1922–1997) - Autonomia e tragédia – Pessimismo histórico-filosófico. Obra principal: A Instituição Imaginária da Sociedade. Ideia-chave: As sociedades são criações imaginárias, mas muitas vezes caem em regimes de heteronomia, isto é, se submetem a poderes exteriores que elas mesmas criaram. A liberdade é uma exceção. A maioria das sociedades prefere a servidão voluntária, o conformismo e o medo da autonomia. Frase ilustrativa: “A sociedade não quer ser livre.”
Michel Foucault (1936–1984) (com reservas) – Crítica do poder – Pessimismo estrutural. Embora não se possa classificá-lo como "pessimista antropológico" no sentido clássico, Foucault mostrou como o poder está em toda a parte, infiltrado nas instituições, nas práticas e no discurso. A sua visão do sujeito como produzido por dispositivos de poder pode ser lida como um pessimismo estrutural sobre a liberdade humana. A confiança na razão, na ciência e no progresso é desmontada nas suas genealogias (prisão, loucura, sexualidade).
O Pessimismo antropológico na esquerda, embora menos comum ou menos explicitado, também existe na esquerda, muitas vezes relacionado à crítica das estruturas sociais e das formas de dominação. É a constatação da persistência do sofrimento e da opressão, apesar dos esforços revolucionários. Adorno, Horkheimer e outros pensadores da Escola de Frankfurt eram profundamente pessimistas quanto à natureza humana e à possibilidade de emancipação total. No "Dialética do Esclarecimento", Adorno e Horkheimer mostram como a racionalidade moderna, mesmo iluminista, tende à dominação e ao totalitarismo.

Embora frequentemente associado à esquerda democrática e ao socialismo, Orwell foi profundamente pessimista quanto à natureza humana. No seu livro "1984", o ser humano é retratado como manipulável, frágil e inclinado à traição. Orwell desconfiava tanto do poder concentrado da direita quanto das formas autoritárias do socialismo. Jean Améry –um intelectual judeu que sobreviveu a Auschwitz e se tornou um filósofo e ensaísta pessimista sobre a natureza humana, especialmente sobre a capacidade de perdoar ou aprender com o passado – embora vinculado à esquerda humanista, acreditava que a barbárie era uma possibilidade sempre presente no ser humano. Pier Paolo Pasolini, comunista italiano, era abertamente pessimista quanto à direção da modernidade e à natureza humana. Via no consumismo, e na sociedade de massas, uma degradação irreversível, mesmo em relação ao "bom povo" italiano que dizia defender. Bernard Stiegler – filósofo francês de tendência marxista ou pós-marxista, mostrava um pessimismo profundo sobre a cultura digital, a destruição da atenção, e a incapacidade do homem moderno de formar vínculos significativos.
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