quinta-feira, 24 de abril de 2025

A nova masculinidade



O que estamos a viver hoje pode ser entendido como uma revolução histórica. O feminismo contemporâneo – nas suas várias vertentes, do liberal ao radical, passando pelo interseccional – conseguiu, nos últimos 25 anos, não só maior visibilidade como também uma eficácia política e cultural sem precedentes. Há aqui uma dialética, no contexto da reconfiguração da identidade de género, que merece ser explorada em relação à reação (reacionária) do género masculino para com a “nova masculinidade” e o conceito de “masculinidade tóxica”. Hoje, oficialmente, creio que até por lei, um ou uma adolescente é criança, pelo menos, até aos 17 anos de idade. Mas as consequências são profundas. Criamos gerações emocionalmente imaturas, inseguras, muitas vezes apáticas perante a responsabilidade. Ao não lhes confiarmos tarefas reais, nem lhes oferecermos rituais simbólicos de entrada na vida adulta, impedimos que se vejam como parte ativa da sociedade. O resultado é uma cidadania tímida, uma juventude sem rumo e uma infância que, paradoxalmente, se estende até aos 25 ou 30 anos.

Essa transformação traz tensões. Para muitos homens, a desconstrução de papéis tradicionais pode ser sentida como perda (de identidade, de estatuto, até de sentido). Mas há também aqui uma oportunidade: a possibilidade de libertação de um modelo rígido, por vezes violento e repressivo, que limitava tanto quanto empoderava. Na mitologia grega temos uma exceção à regra do macho alfa com o mito das Amazonas. Elas eram símbolo de um poder feminino autossuficiente, frequentemente em antagonismo com o mundo masculino. No entanto, o feminismo atual não é, salvo exceções marginais, um projeto de exclusão ou supremacia, mas de equilíbrio, redistribuição simbólica e material do poder. A nova masculinidade, nesse contexto, não precisa ser submissa ou apagada, mas sim reinventada em chave dialógica.

O conceito da nova masculinidade refere-se a uma reavaliação dos papéis tradicionais atribuídos aos homens na sociedade, promovendo uma visão mais flexível, inclusiva e adaptada às mudanças culturais e sociais contemporâneas. Ele surge como uma resposta às críticas ao modelo tradicional de masculinidade, muitas vezes associado à repressão emocional, à agressividade e à dominação social. Uma das linhas mestras da nova masculinidade consiste na desconstrução do machismo. Questiona-se a ideia de que a masculinidade está ligada ao domínio pela força vigorosa na relação com os outros. Homens que não exprimem emoções e sentimentos para não serem vistos como uns fracos. Esse conceito preconiza o fim dos estereótipos conotados com o macho latino, que não lhe caem os pergaminhos por participar nas tarefas da cozinha, da limpeza da casa, de cuidar dos bebés. Que isso não tem nada a ver com a "feminização" dos homens.

Tudo o que se disse até aqui não significa que não possa haver riscos quando as teorias mal pensadas entram em rotura com a natureza das coisas. Ou seja: a feminização do homem. E, na verdade, quando se juntam à problemática os não binários, só para baralhar, as pessoas ficam ainda mais confusas. Quando mudanças culturais são conduzidas sem um entendimento profundo, da natureza e da evolução humana, podem surgir distorções que acabam por gerar mais atraso do que progresso. A tentativa de reformular a masculinidade não deveria significar a negação de características naturais dos homens relacionadas com a testosterona, que precisa dela para enfrentar os vários desafios violentos que se lhe deparam naturalmente, por instinto, incluindo o da proteção da prole. A ideia de que o homem deve ser mais sensível e emocionalmente aberto é válida, mas se for imposta de forma artificial, pode levar a um enfraquecimento da identidade masculina, tornando os indivíduos mais inseguros e desconectados de si mesmos. Além disso, quando se misturam noções como a fluidez de género e o não binário sem uma fundamentação clara, cria-se um ambiente de instabilidade, onde até mesmo conceitos básicos como o que significa ser homem ou mulher se tornam ambíguos. Isso pode gerar angústia identitária em muitas pessoas que simplesmente querem um referencial mais sólido para as suas vidas.

Ou seja, mudanças culturais devem ser feitas com cautela e baseadas em evidências, considerando que a estrutura social não pode subverter ou fazer entorses à natureza biológica, sob pena de deitar por terra conquistas civilizacionais que levaram séculos a consolidar. 
A busca por um homem mais equilibrado não resulta se for pela passagem de numa feminização forçada. A manutenção de uma masculinidade saudável não pode passar pela destruição da sua essência através de uma feminização forçada. Quando a cultura tenta impor mudanças que contrariam a natureza humana, cedo ou tarde a realidade se impõe. O problema de certas ideias contemporâneas é que elas partem de um otimismo ingénuo, a crença de que a identidade pode ser moldada livremente ao sabor de modas culturais idealizadas, sem considerar limites biológicos e estruturais. Mas a história mostra que sociedades que abandonam princípios fundamentais acabam por ter de enfrentar crises internas que se saldam pelos tais recuos civilizacionais.

A ideia de que "o importante é fazer o outro feliz" pode parecer nobre, mas aplicada sem discernimento pode levar a uma desorientação geral. Há momentos em que a verdade, a estrutura e até mesmo algum grau de dureza são mais importantes do que a simples validação do outro. Uma sociedade que dissolve as referências masculinas pode acabar gerando gerações de homens inseguros, sem propósito e emocionalmente frágeis, o que, ironicamente, não ajuda nem a eles nem às mulheres. A longo prazo, a biologia tende a vingar-se dessas experimentações sociais, e a masculinidade acabará reencontrando seu equilíbrio, seja por necessidade ou por um cansaço geral com essas imposições culturais forçadas.

A Netflix tem explorado o tema da masculinidade contemporânea em algumas de suas produções recentes. A minissérie "Adolescência", lançada em 14 de março de 2025 centra-se em Jamie, um jovem de 13 anos acusado do assassinato de uma colega. A trama explora os efeitos desse crime na família e na sociedade, abordando temas como masculinidade tóxica, bullying e a influência negativa das redes sociais na formação dos jovens. A série tem gerado debates significativos sobre os desafios enfrentados pelos adolescentes no mundo digital atual. E na comédia espanhola "Macho Alfa", lançada em 30 de dezembro de 2022, acompanha quatro amigos de 40 anos que se veem obrigados a adaptar-se às novas normas sociais relacionadas à masculinidade. A série utiliza humor para criticar o patriarcado e a masculinidade tóxica, mostrando os protagonistas lidando com a perda de privilégios e tentando encontrar o seu lugar numa sociedade em transformação.

O termo "masculinidade tóxica" é um conceito popularizado por certos círculos académicos e feministas para descrever comportamentos masculinos que seriam prejudiciais tanto para os homens como para a sociedade. Ele engloba traços como repressão emocional extrema, agressividade desnecessária, machismo, e a ideia de que um homem deve evitar qualquer traço de vulnerabilidade. No entanto, há quem veja isso como uma generalização injusta, que transforma a própria masculinidade num problema. Críticos dessa ideia argumentam que o termo acaba servindo para desmoralizar os homens, colocando sob suspeita comportamentos que, na verdade, fazem parte da natureza masculina e que foram historicamente essenciais para a construção da civilização, que não teria sido possível sem coragem, e desejo de liderança. 

Parece que há, nunca se tem a certeza, um certo ressentimento por parte de algumas correntes feministas que parecem mais preocupadas em atacar a masculinidade do que em realmente resolver problemas sociais. Em alguns casos, o discurso da "masculinidade tóxica" se mistura com um ataque mais amplo contra os homens, sugerindo que eles, enquanto grupo, são opressores por natureza, o que gera um ambiente de hostilidade e divisão, em vez de uma busca sincera de equilíbrio. Além disso, a retórica da "masculinidade tóxica" ignora um ponto essencial: a sociedade ocidental já resolveu grande parte das desigualdades entre homens e mulheres. O que ainda não aconteceu noutras sociedades, noutras longitudes e latitudes geográficas, antes pelo contrário, o que não deixa de ser paradoxal. Hoje, homens e mulheres têm direitos iguais perante a lei, e o verdadeiro desafio é manter uma estrutura social funcional, sem cair em revisionismos ideológicos que buscam culpados fictícios para problemas complexos.

Em suma, embora existam comportamentos masculinos problemáticos (assim como há femininos), reduzi-los à ideia de "masculinidade tóxica" pode ser apenas mais um passo no processo de deslegitimação da figura masculina, contribuindo para a crise de identidade dos homens modernos. Ideologias, quando levadas ao extremo, tendem a gerar distorções perigosas. O conceito de masculinidade tóxica, da forma como tem sido usado, muitas vezes não busca um real equilíbrio entre os sexos, mas sim desconstruir o masculino de maneira artificial, sem oferecer uma alternativa viável ou sustentável. Isso cria um vazio identitário, onde muitos homens ficam sem referências claras sobre como agir ou se posicionar no mundo. A história mostra que todas as ideologias que tentaram moldar a natureza humana à força acabaram em fracasso – seja o comunismo tentando abolir as diferenças de classe, sem considerar as tendências naturais de hierarquia, seja o feminismo radical, tentando apagar as diferenças entre os sexos como se fossem meras construções culturais. No fim, a realidade biológica impõe as suas regras e as suas leis à realidade social.

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