quarta-feira, 31 de julho de 2019

O fim dos Impérios



Henrique Raposo, colunista do Expresso, alinhado com a direita conservadora, escreve há dias, a dado passo na sua crónica habitual, o seguinte:
Há cem anos, o fim dos impérios, sobretudo do grande Império Austro Húngaro, foi “a” tragédia. Grandes espaços conservadores e cosmopolitas como o Império de Viena deram lugar a nações tribalistas, pequenas, inseguras e, por isso, agressivas. Agora, a roda da História deu a volta. A corrosão dos nossos “impérios” é o tema do futuro próximo: a república americana está num processo de fragmentação que faz lembrar as décadas pré-1861, e a confederação europeia, UE, está a ser consumida pelas tribos nacionais, tal como o grande e cosmopolita império Habsburgo. Parar este processo é vital para a paz que conhecemos desde 45. Isto não é um pormenor no estuque ou pintura, é o pilar. O fim dos impérios foi a causa da I e da II Guerra. Antes de 1914, os nacionalismos corroeram os impérios, criando a I Guerra; depois de 1918, a I Guerra e a imbecilidade de W. Wilson determinaram a fragmentação dos impérios e a própria validade do termo “império”, abrindo assim espaço para o apocalipse.
Muito bem. Em 1900, na maioria dos países da Europa Ocidental, a social-democracia era um movimento aceite dentro do Estado, que agia num determinado quadro constitucional, o que, em diferentes graus, dava oportunidade aos partidos socialistas de espalharem as suas ideias e de influírem no desenvolvimento político, social e económico dos respetivos países. Mas no que respeita a liberdades constitucionais e políticas Espanha e Rússia mantiveram-se à margem das linhas gerais do desenvolvimento europeu. O caso da Espanha tem interesse porque foi ali que a tradição anarquista lançou raízes mais fundas e exerceu mais larga influência, ao passo que na Rússia a história dos movimentos revolucionários anteriores à Primeira Guerra levou à Revolução de 1917 e ao subsequente desenvolvimento do comunismo.

A Espanha com a monarquia Bourbon estava ingovernável desde o fracasso da República proclamada a seguir à revolução de 1868. Entretanto a década de 1870 trouxe para Espanha as ideias de Bakunine, o que acabou por dividir o movimento da classe trabalhadora espanhola em contraponto com a ortodoxia marxista das secções espanholas da Internacional. A Espanha foi realmente o único país da Europa onde as ideias de Bakunine lançaram raízes profundas e continuaram a dominar um vasto e importante setor da classe trabalhadora. O movimento anarquista, por seu lado, conseguia unir os trabalhadores industriais mais adiantados e o proletariado rural mais recuado numa crença comum, a de que só uma transformação radical e total da sociedade poderia resolver os seus problemas e melhorar a sua situação. E então na Andaluzia, mercê do singular fanatismo anticlerical que vinha desde os tempos da Inquisição, a violência anarquista foi bem recebida por parte dos trabalhadores rurais andaluzes que estavam condenados a morrer de fome por maus anos agrícolas.

E a situação ainda se agravou em 1898 com a derrota face aos Estados Unidos que culminou com a perda das colónias das Antilhas e do Pacífico. A Catalunha, região mais avançada e mais industrializada, lutava pela autonomia. Por isso era fácil dar ouvidos à exigência anarquista. E no País Basco uma classe de camponeses fortemente conservadora agarrava-se às suas esperanças de que os direitos tradicionais daquelas províncias viessem a ser restabelecidas.

Já na Rússia, a década de 1890 foi difícil para os adeptos socialistas mercê de uma polícia secreta eficiente e vigilante. Até que um dia o socialismo marxista atingiu o jovem Lenine. Vladimir Ilitch Uljanov, que adotou na clandestinidade pseudónimo Lenine quando o seu irmão mais velho foi executado por ter tomado parte numa conspiração para assassinar o czar Alexandre III. Não tardou a ver-se metido e complicações com as autoridades, e após um período de exílio na Sibéria, deixou a Rússia em 1900. Voltou alguns meses a seguir à Revolução de 1905, e depois finalmente em ombros, em abril de 1917.

Lenine criou a sua reputação como polemista através dos seus ataques àqueles membros dos partidos socialistas que acreditavam que os seus esforços deveriam concentrar-se na obtenção de vantagens práticas imediatas para as classes trabalhadoras. Mas Lenine foi bem-sucedido em cindir o Partido Social-Democrata russo em dois: mencheviques e bolcheviques. Os mencheviques representavam a social-democracia ortodoxa. Ao passo que os bolcheviques, os preferidos de Lenine, estavam decididos a utilizar qualquer meio revolucionário para transformarem imediatamente a revolução burguesa numa revolução proletária.

Recorde-se a desastrosa derrota dos russos em 1905 no Extremo Oriente com os Japoneses. Esta situação provocou uma agitação proletária nas cidades, que veio acordar os sociais-democratas para o debate parlamentar. O movimento socialista europeu acompanhava o que se estava a passar na Rússia com grande atenção, dado que a Revolução Russa de 1905 tinha sido a mais violenta explosão revolucionária desde a Comuna de Paris em 1871. Rosa Luxemburgo – uma filósofa e economista marxista polaco-alemã, que se tornou mundialmente conhecida pela militância revolucionária ligada à Social-Democracia da Polónia, ao Partido Social-Democrata da Alemanha e ao Partido Social-Democrata Independente da Alemanha – estando na Alemanha, regressa apressadamente à sua Polónia natal para aí se lançar na atividade revolucionária e, bem assim, numa controvérsia sobre se a revolução nacional da Polónia, para se tornar independente da Rússia, deveria ter prioridade sobre a revolução social.

Desde 1870 que se estava a criar um movimento socialista internacional que parecia oferecer a possibilidade de uma sociedade inteiramente nova. Embora nenhuma teoria geral explique por si só cada caso específico da expansão imperialista, os grupos económicos de pressão influíram consideravelmente na decisão dos governos europeus de se lançarem na expansão colonial.

A acrescentar às novas aquisições coloniais da última parte do século XIX, havia ainda na posse de muitos países europeus os territórios ultramarinos adquiridos em séculos anteriores. Era o caso de Portugal, império outrora grandioso, mas que agora se estava a apagar lenta e progressivamente. Portugal, um país que na Europa era pequeno de mais para competir com outros impérios, conservava territórios extensos de mais em África, tanto na África Ocidental como Oriental, ao ponto de se ter metido numa guerra diplomática com a sua grande aliada Inglaterra, por causa do tão polémico “mapa cor de rosa”. No entanto a Alemanha também estava à espreita, porque tinha esperança de vir a adquirir bons nacos de terra como pagamento de dívidas contraídas na década de 1890, e que não estava em condições de pagar porque o descalabro financeiro era de tal forma grande que o mais certo era que se viesse a afundar.

Por outro lado, a Espanha aqui ao lado também não podia ajudar, pois apesar de manter ainda uma boa parte de Marrocos, perdia a maior parte do que restava do seu colossal império: Cuba tornava-se independente, e as Filipinas passavam a ficar sob administração americana.

Restava a Grã-Bretanha, a única que tinha conseguido manter a maior parte do império adquirido em épocas anteriores. A Inglaterra era, de facto, um grande império na última parte do século XIX: Canadá, Austrália, Nova Zelândia … uma vez que a Índia era um império dentro de outro império, variado e densamente povoado, cujos habitantes, que ao contrário dos outros países com população maioritária europeia, diferiam uns dos outros na religião, na língua e nas tradições culturais, e diferiam mais ainda dos seus dirigentes britânicos.

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