Em Portugal, um partido que mantém fielmente a linha da velha esquerda é o Partido Comunista. Ao passo que a Nova Esquerda é liderada pelo Bloco de Esquerda (BE) seguido do Partido dos Animais e Natureza (PAN). O Partido Comunista Português (PCP) é, de fato, um dos últimos bastiões da velha esquerda tradicional, permanecendo fiel à defesa de uma agenda centrada na luta de classes, na proteção dos direitos da classe trabalhadora e na rejeição de agendas que considera secundárias ou "desviantes" da questão central do salário. O PCP é caracterizado por um discurso ainda enraizado no marxismo-leninismo clássico, o que, em muitos sentidos, o coloca em contradição com a Esquerda actual.
Para o PCP, questões como as causas do feminismo interseccional, a teoria queer ou o ambientalismo extremo são frequentemente vistas como distrações que fragmentam a luta contra o capitalismo. O PCP tem uma base histórica sólida em setores como a indústria e os sindicatos, especialmente entre operários e trabalhadores rurais. No entanto, essa fidelidade à linha tradicional tem levado o partido a perder relevância junto das gerações mais jovens e urbanas, que tendem a se identificar mais com as preocupações identitárias da Nova Esquerda. O BE tem uma forte preocupação ambiental, frequentemente ligada à crítica do modelo capitalista de consumo e exploração. No entanto, essa ampla agenda identitária, por vezes, enfraquece a sua capacidade de se comprometer com a classe trabalhadora, que se sente desamparada em questões materiais, como salários, habitação ou segurança no trabalho. O PAN é um caso peculiar dentro da política portuguesa. Embora não seja explicitamente um partido de esquerda em termos clássicos, muitas de suas posições se alinham com a Nova Esquerda. Diferentemente do PCP e, até certo ponto, do BE, o PAN tem pouca ou nenhuma preocupação com questões económicas estruturais ou com a luta de classes, preferindo focar-se em mudanças de estilo de vida, consumo sustentável e bem-estar animal.
Em Portugal, como em muitos outros países, a tensão entre a velha e a Nova Esquerda reflete uma mudança geracional e cultural. Se a velha esquerda, representada pelo PCP, enfrenta um declínio devido à incapacidade de se renovar e de dialogar com as novas gerações, a Nova Esquerda, liderada pelo BE e pelo PAN, enfrenta o desafio de entender as verdadeiras preocupações materiais da maioria da população. O futuro da esquerda em Portugal dependerá, em grande parte, da capacidade de conciliar as questões identitárias e ambientais com as necessidades materiais e económicas. Construir uma narrativa que não apenas critique o neoliberalismo, mas que apresente soluções concretas para as desigualdades estruturais. Essa conciliação, no entanto, não será fácil, pois o fosso cultural entre a velha e a nova esquerda parece, a cada dia, mais profundo.
Por outro lado, em relação ao tema da imigração, a esquerda portuguesa não tem sabido fazer a leitura correta dos 50 deputados do CHEGA, um partido xenófobo de extrema direita. Ou seja, a leitura do pulsar das preocupações da maioria do cidadão comum tem passado ao lado da atenção da Nova Esquerda. Ora, o fenómeno migratório destes últimos anos, que não é exclusivo de Portugal, ou até que Portugal não é dos países mais atingidos, como países europeus onde partidos de extrema-direita mais a sério conseguem canalizar os medos e as ansiedades da população, muitas vezes em torno da imigração e da identidade nacional.
A falha de leitura da esquerda sobre o CHEGA e a imigração tem a ver com o tradicional irrealismo dos setores da sociedade mais intelectualizados. A Nova Esquerda, particularmente representada pelo BE, tende a adotar um discurso pró-imigração incondicional, enraizado em princípios de solidariedade internacional e direitos humanos. Embora esses valores sejam louváveis, muitas vezes há uma desconexão entre esse discurso e as preocupações do cidadão comum, que sente os impactos diretos da imigração em termos de competição por empregos, pressão sobre os serviços públicos e integração cultural. É uma negligência crónica em relação às preocupações mais profundas das pessoas . Em vez de abordar pragmaticamente os impactos sociais, envereda pela retórica das fobias, como a xenofobia.
Foi a alienação do "pulsar popular" por parte da esquerda que empurrou essa grande fatia da população, que nas últimas eleições legislativas contabilizou 1.2 milhões para o CHEGA. A esquerda, por outro lado, parece relutante em lidar com essas questões de maneira direta, preferindo discursos moralistas que alienam o eleitorado mais conservador ou inseguro. Seja como for, não pode ser a esquerda a culpada de tudo, mas tem dado o seu contributo para que tanta gente tenha depositado o seu voto num partido tão medíocre. O CHEGA tem explorado a narrativa de que as elites políticas e intelectuais estão desconectadas das necessidades do "português comum". A defesa incondicional da imigração pela esquerda é frequentemente retratada como uma imposição dessas elites.
Para muitos, a imigração em grande escala é entendida como uma ameaça à cultura e aos valores nacionais. Essa preocupação é frequentemente explorada pela extrema-direita para reforçar o medo de uma "substituição cultural". Mas a Esquerda devia começar por reconhecer que esses medos são legítimos, e não rotulá-los imediatamente como xenófobos. Em vez de desqualificar as preocupações dos cidadãos como xenofobia, a Esquerda precisa reconhecer que há receios legítimos associados à imigração, como a pressão sobre a habitação, saúde e segurança. Um discurso que acolha essas preocupações demonstra empatia e disposição para encontrar soluções equilibradas. O que se deve fazer é defender uma imigração regulada e sustentável. A Esquerda pode propor políticas de imigração baseadas em critérios claros e justos, que garantam que os migrantes possam ser integrados de forma digna e que não sobrecarreguem os recursos locais. Por exemplo, criar programas de formação e integração no mercado de trabalho para os migrantes. Ao invés de insistir numa retórica demagógica, quais treinadores de bancada que ignoram as dificuldades práticas do terreno da governação, a esquerda deveria adotar um tom mais pragmático e próximo da realidade vivida pelos eleitores, demonstrando como a imigração pode ser benéfica, mas também como será gerida para minimizar os impactos negativos.
Em conclusão. A esquerda está metida numa encruzilhada. Se a Esquerda portuguesa, especialmente os partidos da Nova Esquerda, não ajustarem o seu discurso para refletir as preocupações reais do eleitorado, correm o risco de continuar a perder terreno para o CHEGA. O desafio não é apenas combater a extrema-direita, mas oferecer uma alternativa credível e empática que equilibre solidariedade internacional com responsabilidade nacional. Essa mudança exigiria coragem para romper com alguns dogmas e adotar uma abordagem mais matizada e realista sobre a imigração, que tem relutado em abordar.
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