terça-feira, 10 de março de 2020

Ciência e realidade. O problema da indução


Será que a ciência nos dá um conhecimento da realidade nua e crua, ou acrescentará alguma coisa dada pela mente humana, em particular através da abstração matemática? Que as teorias sejam dedutivamente fechadas, ou que as teorias sejam sujeitas a experiências controladas, isso não gera grande confusão, ou desacordo, entre os cientistas. Contudo, confrontados com um par de teorias rivais (e, portanto, incompatíveis), uma das quais é mais precisa e a outra mais geral, os cientistas podem perfeitamente divergir no que respeita à teoria a aceitar.

O problema da indução – um dos problemas a que Karl Popper se dedicou, e a quem se deve a famosa metáfora do “cisne negro” – é o problema levantado pela pergunta: “Podem as hipóteses científicas ser verificadas?”. Muitas pessoas atribuem o enorme sucesso da ciência à sua capacidade para verificar as teorias que produz recorrendo à observação ou a provas experimentais. Uma resposta tentadora é dizer que as afirmações universais resultam da observação e do raciocínio indutivo. Mas como poderemos saber que as afirmações universais da ciência são verdadeiras? O problema desta resposta é que levanta outro problema: “como podemos justificar o raciocínio indutivo?” Ao contrário do que acontece na dedução, não há na indução regras simples que permitam distinguir os bons raciocínios dos maus.

Para Popper – em “A Lógica da Pesquisa Científica” (1935), a obra que o celebrizou e na qual apresentou uma forte crítica ao verificacionismo, defendido pelos filósofos positivistas do Círculo de Viena – testar uma teoria é tentar falsificar as suas conclusões. Uma teoria que não fosse suscetível de ser testada e de poder ser falsificada, para Popper, não merecia o estatuto de uma teoria científica. Era o caso da psicanálise, e das teorias de Freud, dado que o seu tipo era de tal ordem fechada que não abria espaço à falsificabilidade.

A filosofia da ciência é diferente de outras disciplinas que também estudam a ciência, como é o caso da epistemologia e da metafísica. Por exemplo, levantam problemas de natureza epistémica perguntas como: se a ciência é objetiva; de que modo se obtém o conhecimento científico; como se distingue a ciência do que não é ciência. Estas perguntas reportam-se direta ou indiretamente à questão da justificação do conhecimento científico. Por outro lado, levantamos problemas de natureza metafísica ao fazermos perguntas como: o que significa dizer que uma coisa é causa de outra; o que é uma explicação científica; de que tipo de objetos trata a ciência; o que é uma lei da natureza. Estas perguntas incidem sobre a natureza última das coisas. A filosofia da ciência tem mais a ver com os problemas de ordem empírica. Mas o filósofo da ciência, diferentemente do cientista, não se dedica à investigação científica (a não ser que seja ao mesmo tempo um filósofo e um cientista). Ele estuda sistematicamente os métodos usados pelos cientistas, e a natureza dos seus postulados.

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