sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Armínio era o inimigo das tropas romanas comandadas por Germânico





A avalanche germânica liderada por Armínio (Hermann) contra três legiões romanas nas densas florestas de Teutoburgo.
Pintura: Hermann Knackfuss.

Armínio era o inimigo principal de Roma, mas o sucesso dos queruscos tinha estimulado muitos outros povos a se tornarem abertamente hostis. O poder dos chefes entre as tribos não era de modo algum absoluto, e dependia de seu prestígio. A maioria dos guerreiros costumava escolher um líder bem-sucedido, porém ele não podia obrigá-los a fazer isso. Armínio não era a única figura proeminente entre os queruscos, e alguns dos outros príncipes ressentiam seu domínio. Dessa forma, o esforço de guerra das tribos era normalmente descoordenado, e alguns grupos não reconheciam a preponderância dos queruscos. Roma fez guerra, portanto, contra muitos inimigos diferentes simultaneamente, e cada qual precisava ser persuadido de que a alternativa era fazer aliança e firmar a paz com o império.

Depois de 16 d.C. os romanos não terão planeado a reocupação física da província perdida a oeste do Elba. Em nenhum momento guarnições de tamanho significativo eram deixadas para trás. Na Germânia, grandes povoamentos equivalentes aos da Gália eram extremamente raros. A maior parte da população vivia em aldeias dispersas, longe umas das outras. Há algum exagero retórico no retrato que Tácito faz da Germânia como sendo inteiramente coberta de florestas e pântanos. Porém é verdade que boa parte do terreno era difícil para um grande exército em marcha. 

Os exércitos romanos tinham tendência a pensar em termos de rotas para determinado lugar. Mas na Germânia havia muito menos opções de caminhos alternativos. Os dois lados sabiam disso, e os germânicos quase sempre eram capazes de antever a direção que o inimigo iria tomar, e por isso reuniam um exército a tempo de colocá-lo numa posição de emboscada. Germânico, como todos os outros comandantes romanos que lideraram ou liderariam exércitos nesse teatro de operações, tinha de ser muito cuidadoso para equilibrar as forças que conduzia nas expedições punitivas. Se as enviasse em número insuficiente, havia o risco de serem derrotadas, em especial se penetrassem demais no território hostil. Grandes colunas exigiam um comboio de bagagem de tamanho considerável, com animais de carga e carroças para transportar os suprimentos, por isso moviam-se inevitavelmente com lentidão. Por esse motivo Tibério dispensara tanta atenção ao carregamento das carroças de bagagem durante suas expedições ao outro lado do Reno. 

Germânico, como qualquer bom comandante romano, sabia sempre lançar mão da diplomacia a par da força quando parecia possível obter vantagem. Enviados de Segestes, um líder mais velho dos queruscos cuja influência fora desgastada pela ascensão de Armínio, procuraram Germânico pedindo proteção contra o rival. A mensagem do chefe germânico enfatizava a lealdade que tivera para com Roma, em particular quando tentara sem sucesso avisar Varo da revolta planeada por Armínio e da sua traição. Ainda no início das negociações, o exército de Germânico recebeu Segestes e seus homens durante a marcha. Muitos daqueles guerreiros, inclusive o próprio filho de Segestes, haviam lutado contra Roma em 9 d.C. Os ressentimentos passados foram ignorados por conta da vantagem política que a deserção de um chefe tão famoso oferecia. Tibério concedeu perdão a todos, dando aos exilados um lugar para viver no império e uma pensão vitalícia. A filha de Segestes não tinha, porém, tanta boa vontade na medida em que estava casada com Armínio. Tinha sido sequestrada e levada de volta, à força, para junto de seu pai. Grávida de Armínio, o filho iria nascer no exílio.

Armínio, enfurecido, logo começou a reunir um grande exército, recebendo o apoio de seu tio, Inguiomero, outra figura poderosa da tribo que, no passado, fora considerado a favor dos romanos. O prestígio dos dois era tal, que muitos bandos de guerreiros de tribos vizinhas uniram-se aos queruscos. Quando relatos dessa movimentação chegaram a Germânico, juntamente com Cecina atacaram as tribos consideradas simpáticas ao inimigo, devastando o território dos brúcteros em particular. Durante as operações, o estandarte da águia da Legio XIX foi recuperado. Como não estava longe do local do desastre sofrido por Varo, Germânico resolveu marchar até Teutoberg Wald e enterrar os mortos. Cecina foi à frente para reconhecer o terreno, construir pontes onde fosse necessário e pavimentar as áreas pantanosas. Por algum tempo, eles seguiram o mesmo caminho do exército derrotado.

Seis anos depois do desastre de 
Teutoberg Wald um exército romano chegava ao local e enterrava os ossos de três legiões, sem que nenhum homem soubesse se eram os restos de um estranho ou de um parente que depositava para descansar. A raiva pelo inimigo ia aumentando à medida que inumavam os os ossos e o ódio aumentava.



Monumento a Armínio na Floresta de Teutoburgo

Uma pira funerária foi erguida como memorial sobre o túmulo coletivo. O próprio Germânico colocou o primeiro torrão de turfa para demonstrar seu respeito pelos mortos, embora tal ato não fosse realmente apropriado, uma vez que ele era membro do colégio áugures, e os romanos não gostavam que esses sacerdotes tivessem contacto físico com os mortos. Tendo completado sua triste tarefa, o exército avançou contra Armínio. No primeiro momento, os germânicos retiraram-se à sua passagem, mas, quando os soldados da cavalaria auxiliar seguiram um pouco mais à frente que o costume da coluna principal, foram emboscados e massacrados. A infantaria auxiliar enviada como apoio foi contaminada pelo pânico e rechaçada. A perseguição dos germânicos só foi interrompida quando Germânico chegou com as legiões e as colocou em formação. Armínio não estava pronto para se arriscar numa batalha campal e retirou-se satisfeito com o sucesso conquistado. 

Germânico dividiu seus homens em duas frentes. Enquanto uns construíam um acampamento fortificado e reparavam os caminhos sobre os pântanos, outros mantinham-se em formação prontos para cobrir os grupos de trabalho. Durante todo um dia, foram atacados pelos germânicos, que combatiam à distância, mas que ocasionalmente faziam carga quando percebiam um ponto vulnerável nas linhas romanas. O terreno não era adequado às operações de um exército treinado e disciplinado, pois havia poucos trechos de terreno aberto e seco onde as unidades pudessem operar em formação. A situação piorou ainda mais quando alguns guerreiros de Armínio fizeram uma barragem num riacho, dirigindo o fluxo de água à planície já meio encharcada. 

Os germânicos estavam mais acostumados com o terreno pantanoso e lutaram muito melhor do que os legionários romanos. Todos estes dados são recolhidos de Tácito. As legiões estiveram prestes a ceder sob a pressão dos homens de Armínio, mas entretanto caiu a noite. Havia um contraste entre o silêncio nervoso dos romanos, que não conseguiam dormir, e a algazarra típica dos germanos nos seus acampamentos completamente embriagados.

Mas na manhã seguinte Armínio ordenou que seus guerreiros atacassem em massa. O combate foi confuso, com os germanos caindo em grandes números sobre as carroças e a coluna em marcha. O cavalo de Cecina foi ferido quando ele tentava dar alguma ordem àquele caos. Ora, Cecina, com 60 anos de idade, era para todos os efeitos um velho, e o seu estado não era famoso depois de cair do cavalo. A sua sorte foi a rápida ação de alguns soldados da Legião nº 1, que evitou a sua captura, e eventualmente a sua morte.




Finalmente, o núcleo do exército romano conseguiu chegar ao terreno aberto, já ocupado pelas duas legiões que deveriam ter coberto os flancos. Uma vez lá, os homens exauridos foram forçados a trabalhar por várias horas para construir uma trincheira básica e um baluarte ao redor do acampamento. Grande parte da bagagem fora tomada pelo inimigo, cuja preocupação com o espólio contribuíra muito para a fuga da força principal. Naquela noite, poucos dos feridos tinham curativos ou remédios para tratar os ferimentos, e quase nenhum dos homens possuía uma tenda onde dormir. Quando um cavalo fugiu, rompendo as correntes que o prendiam, galopando através do acampamento e causando confusão, um grupo de homens em pânico correu até aos portões acreditando que estavam sendo atacados pelo inimigo. Cecina só conseguiu detê-los porque se colocou à frente do portão aberto e os desafiou a passar sobre ele. Em seguida, os tribunos e os centuriões explicaram em detalhe o que tinha acontecido. E tudo ficou mais calmo.

Armínio parecia ter à sua mercê o exército romano, encurralado num terreno difícil e exausto depois de dias de emboscadas. Repetia-se aqui o que tinha acontecido com Varo em 9 d.C. e que o conduziu à catástrofe em Teutoberg Wald. 
A sugestão de que os bandos de guerreiros deveriam cercar o acampamento romano e lançar um ataque direto foi calorosamente recebida pelos outros chefes. Era isso que Cecina esperava que fizessem, e preparou-se para tanto. Seus homens entraram em formação de modo a prepararem-se para sair de cada um dos quatro portões do acampamento, liderados por um corpo selecionado entre os soldados mais valentes montados a cavalo, cedidos a eles pelo comandante, e seus oficiais mais graduados. Em tal situação desesperadora, Cecina queria deixar claro aos seus homens que não fugiria a galope abandonando-os, mas enfrentaria o destino que eles tivessem.

Os legionários foram mantidos sob rígido controle, quando o amanhecer revelou um denso círculo de guerreiros germânicos avançando para atacar. Cecina deixou que se aproximassem, esperando que a aparente relutância dos romanos em sair do acampamento e lutar aumentasse o desprezo que os bárbaros sentiam por eles. Só no último minuto ele ordenou às legiões que atacassem e saíssem dos portões, com as trombetas soando e os homens gritando. Quase que imediatamente, a inflada confiança do inimigo foi esmagada e o pânico logo se espalhou por entre as suas fileiras. Embora não tenham fugido instantaneamente, a planície aberta permitiu que os romanos tirassem vantagem do seu treino e equipamento superiores. As baixas dos germânicos foram pesadas. Diz-se que foi apenas devido à intervenção de Agripina, esposa de Germânico, que se evitou a destruição da ponte sobre o rio, em Vetera (hoje, Xanten). Ela também permaneceu lá para receber a coluna que retornava, agradecendo pessoalmente aos homens, distribuindo roupas àqueles que as tinham perdido e cuidando dos feridos.

A outra metade do exército comandada por Germânico, teve menos incidentes; no entanto, uma secção da sua força enfrentou dificuldades consideráveis e algumas perdas quando a planície costeira através da qual marchavam – mais ou menos ao longo da atual costa norte holandesa – foi inundada por uma maré incomumente alta. Esse incidente, aliado à problemática retirada da coluna de Cecina, reduziu o impacto do sucesso daquela estação de campanha, pois indicou que os romanos não eram invencíveis. Armínio pode não ter conseguido nenhuma vitória significativa, mas evitara ser derrotado de modo decisivo. Por isso o seu prestígio elevou-se. Germânico decidiu que no ano seguinte buscaria o confronto direto com o líder Armínio. Dessa vez, todas as oito legiões combateriam como uma força única. Para esse fim, passou os meses de inverno em preparativos, recompondo o exército. 

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