sábado, 3 de agosto de 2019

De Akhenaton a Tutankamon



Para contextualizar a entrada na cena da História do povo hebreu, nem sempre coincidente com a tradição bíblica e outros mitos, vou-me socorrer das fontes com origem na história do Egito. Mas começo por um acontecimento que não tem propriamente relação com o Egito, mas que teve repercussões em todas as margens à volta do Mediterrâneo: a gigantesca erupção vulcânica na ilha de Tera, situada numa região perto onde hoje é Santorini, a cerca de 200 quilómetros a sudeste da Grécia continental, e as repercussões sísmicas que se fizeram sentir à distância. Esse acontecimento não tem uma data precisa, estando numa estimativa situado entre 1650 a.C. e 1450 a.C. A erupção foi um dos maiores eventos vulcânicos na Terra registados na história. A erupção devastou Santorini, incluindo o assentamento minoico Acrotíri, bem como as comunidades agrícolas em ilhas próximas e na costa de Creta. Tal acontecimento é encarado como a causa motora do fim das avançadas civilizações minoica e micénica, seguido do período histórico mais enigmático da Antiguidade Mediterrânica e de onde emergiram os denominados Povos do Mar.

Entre 1352 a.C. e 1336 a.C. Akhenaton reina no Egito e implanta um novo culto religioso como uma forma de monoteísmo cuja divindade é o Sol. Manda construir uma nova cidade com o mesmo nome na margem direita do Nilo. Atualmente as ruínas deste local são conhecidas como Amarna, o nome da aldeia egípcia próxima. As suas reformas religiosas apelidadas de “Revolução de Amarna” mergulham o país em conflitos. Quando Akhenaton chegou ao trono o domínio do Egito em Canaã estava a enfraquecer por causa das pressões provenientes dos hititas a norte. Nessa altura ainda não existia Israel a norte e Judá a sul. Pode-se dizer assim: durante o reinado de Akhenaton o império cananeu do Egito desmoronou-se. Mas Akhenaton estava mais preocupado com a revolução religiosa do que com a política, para além de não ter capacidades especiais para a administração. Assegurava que só existia uma única divindade, Ré-Herakhte, manifestada na forma de Áton, o disco solar. Compreensivamente, as reformas de Akhenaton destabilizaram profundamente as instituições de Tebas que até então controlavam o Egito. Para cimentar a sua rotura com a tradição de Tebas, Akhenaton pôs grande empenho na construção de uma nova capital.

Sucede-lhe Tutankhaton. Pouco se sabe sobre as políticas internas nos bastidores da sucessão. Manobras políticas certamente levaram a que subisse ao trono uma criança chamada Tutankhaton (1336-1327 a.C.). Após a sua subida ao trono, mudou o nome para Tutankamon, o que indicava o declínio do culto de Áton e o regresso ao poder das instituições de Tebas. Tutankamon morreu ao fim de nove anos sem deixar nenhum herdeiro. Quem se tornou rei foi o general Horemheb, que deu continuidade ao desmantelamento da heresia atoniana. Demoliu a cidade que Akhenaton tinha instituído como capital, e suprimiu toda as referências a Áton e a Akhenaton nos monumentos espalhados por todo o país e empreendeu uma campanha contra os elementos do culto com mais influência. Tal procedimento teve u enorme impacto nos seguidores de Akhenaton.

Horemeheb governou cerca de 27 anos. Moreu por volta de 1315 e nos seus dias finais nomeou Ramsés I para subir ao trono. Pouco tempo depois Ramsés I nomeou Seti I como seu corregente. Foi no reinado de Seti I, que terá ocorrido entre 1290 a 1279 a.C. que os egípcios terão procurado recuperar o controlo ao longo das rotas que vão do Egito a Canaã. Ramsés I, tal como Horemeheb, era um general sem sangue real. Todavia, provinha do Norte e não de Tebas. A subida ao trono de um faraó oriundo do Norte, não podia ter-se processado com facilidade em Tebas e noutros locais do Egito e do seu império.

O renascimento institucional de Tebas significava o imediato decréscimo da importância do culto de Áton. Assim, o chefe dos sacerdotes de Akhenaton representava a principal ameaça à continuidade da importância de Tebas. Portanto, a sua vida corria perigo, pois era preciso eliminá-lo. Ao estar ciente desse destino fugiu. Mas não fugiu para Canaã, porque a passagem para Canaã era mais difícil de atravessar. Fugiu para a Etiópia.

Ora, é aqui que entra em cena Moisés e o momento do episódio bíblico do Êxodo. Moisés devia ser um sacerdote atoniano. A Bíblia realmente refere que Moisés teve uma mulher etíope. E as suas relações com os etíopes seriam boas e convenientes, uma vez que os etíopes estavam desejosos de enfraquecer a autoridade egípcia. Essa nação tinha sido um território independente que foi dominado pelos egípcios durante séculos. No período hicso, a Etiópia parece ter-se aliado mais a estrangeiros do que a Tebas.

Moisés e os seus seguidores é possível que se tenham instalado no território associado à tribo de Ruben, já em território fazendo parte de Canaã, apesar de Canaã ter voltado a ser dominado pelo Egito no tempo Seti I, e depois Ramsés II. Seja como for, com o tempo os seguidores de Moisés foram-se espraiando para o Jordão Central, até que atravessaram o rio e dirigiram-se para os montes desabitados da parte central de Canaã, fragmentando-se por pequenas comunidades. Mas foi a partir destes montes que se espalharam para norte e para sul formando colonatos.

São contemporâneas do que acabei de descrever as ondas de invasão por parte da poderosa confederação dos Povos do Mar, neste caso denominados filisteus. Conduzidos por castas de guerreiros gregos, os Povos do mar estabeleceram fortes raízes neste novo território. Foi então que chegaram a lutar ferozmente contra o Egito no tempo de Ramsés III.

As pressões exercidas pelos Povos do Mar em Canaã e contra o Egito podem ter facilitado a formação do que veio a ser conhecido mais tarde como confederação tribal de Israel. E assim a travessia do Jordão por parte dos seguidores de Moisés que os levou a instalarem-se naquelas terras altas. É claro que as alegações bíblicas estão muito longe destas versões da História. Pouco depois a monarquia emergiu. Entre 1005 e 967 a.C. David da tribo de Judá é rei dos hebreus, e Jerusalém é fixada como capital.

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