Depois da música dos
“New Order” no Festival de Paredes de Coura, e uns mergulhos no rio Coura, eis-nos
em Viana do Castelo para assistir às Festas da Senhora da Agonia.
Enquanto no
Festival de Paredes de Coura cem mil jovens caem num tal estado de encantamento,
que se esquecem do seu laço misterioso com a Mãe-Terra, tornando-se indefesos
face à terrível alienação sem transcendência que é a da nossa época. A Romaria
da Senhora da Agonia segue o padrão medieval: as autoridades eclesiásticas
superintendem o programa religioso e as autoridades pagãs o programa profano.
Esta festa, que dura cinco dias, atrai milhares de pessoas vindas de todo o
lado.
Em Viana ainda se
faz a comunicação mágica entre o Céu e a Terra, vivenciando o tempo mítico das
origens e sacralizando o espaço da sua terra. Veneram-se os antepassados que
adoravam as árvores e os penedos numa emoção cósmica e transcendente. Ao passo
que em Paredes de Coura ouve-se a música que nos transporta às esferas sublimes
do sentimento, mas que no dia seguinte, pode-se ouvir a mesma melodia, mas não
com o mesmo sentimento.
Em Viana a função
simbólica é vital para o relacionamento humano com o divino. Em Paredes de Coura
ignoram-se tais influências do Sagrado, que também são desprezadas pelos intelectuais
positivistas reducionistas e pelas elites mediáticas com fome de futuro. Esta festa, em
grande medida, é uma exaltação da mulher vianense, bem refletida no conhecido
cortejo da mordomia e nos trajes míticos que enverga, de um colorido
deslumbrante. E o ouro que trazem consigo recorda os antigos cultos solares do
povo celta. Mas também existe a contraparte guerreira, representada pelos
Zés-Pereiras que percorrendo a cidade ao som dos bombos acompanhados pelos
Gigantones e Cabeçudos pontuam o momento mágico desta festividade. No dia 20, a
padroeira dos pescadores é solenizada nas águas do mar. Daí que não seja de
estranhar o facto de a padroeira ter o nome de Agonia, a quem os pescadores
recorrem quando no mar, agonizantes, sentem o perigo de vida iminente. Mas
depois se transmuta num hino à cor e alegria.
Muito do que hoje
fazemos e comemoramos, sem que disso tenhamos consciência, provém de um tempo
mais longínquo do que queremos admitir. É essa a questão das origens. O estudo
da História serve para mostrar como o presente é solidário com o passado. Não
apenas o geral dos nossos costumes e dos objetos de que nos servimos
diariamente, mas também os sentimentos de que se compõe a nossa existência. Por
baixo deste progressismo vazio e superficial ainda vive um património milenar.
Mas apesar de uma boa parte do “povo” ainda o vivenciar, a verdade é que a
elite desta Europa envelhecida governa-a totalmente esquecida e alheada dessa
realidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário