quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Eutrapelia


Hoje já pouca gente sabe o que é eutrapelia, uma palavra antiga de origem grega. Era uma das verdadeiras virtudes, para Aristóteles: alguém que sabe ter uma conversa bem equilibrada entre o bom senso e o chocarreiro; alguém que para ser agradável é hiperbólico, mas a seguir diz com um sorriso: “estava a brincar”. É como Cristina Ferreira dizer naquele anúncio, a sorrir: “Porque Você Merece”



Ou então uma amiga de Cinha Jardim, como Castelo Branco, que já não a via desde as últimas operações plásticas ao pescoço e diz: “Você agora parecia-me uma daquelas criaturas do Frankenstein”. Mas a seguir diz em tom de gracejo: "Estava a brincar minha querida".



Por um tempo, a eutrapelia passou a significar piadas obscenas e grosseiras. A palavra aparece apenas uma vez no Novo Testamento em Efésios 5:4, onde é traduzida como "gracejo grosseiro".

O influente filósofo medieval Tomás de Aquino viu a eutrapelia sob uma luz positiva, novamente, favorecendo a antiga noção aristotélica de que ela é uma boa atitude para relaxamento mental, e constitui uma diversão honrosa. Em Summa Theologica, Tomás de Aquino considera a eutrapelia como um gracejo virtuoso e moderado. Na segunda metade do século XIII, o conceito foi considerado um estado de prazer judicioso - isto é, lícito e bom - e voltou a ser considerado uma virtude.

Alberto Magno, mestre de São Tomás de Aquino, que morreu em 1280, e que com efeito havia lido a Ética a Nicómaco de Aristóteles, tratou de explicar ao seu pupilo que a eutrapelia, termo que não quis traduzir para não retirar o seu sentido próprio, mas que se podia resumir a atividade lúdica, se podia incluir no elenco das virtudes cristãs. Filha da temperança, necessária ao pleno exercício da vida humana, o brincar traz boa disposição, e como tal constitui uma forma de recreação, ou seja, de reparação do espírito.

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