quinta-feira, 27 de março de 2025

A Europa e os paralelos históricos


Há quem já esteja a fazer um paralelo entre o atual fluxo migratório para a Europa de gente vinda de terras do credo islâmico e a invasão árabe da Península Ibérica no século VIII. Se as tensões entre populações nativas e comunidades muçulmanas aumentarem num contexto de fragmentação, a Europa pode ver-se num impasse civilizacional. Já estão a decorrer alguns sinais preocupantes. Há bairros em grandes cidades europeias onde a lei do Estado de Direito já tem dificuldade de se impor nas comunidades que se regem pela Sharia. Por outro lado, a baixa taxa de natalidade dos europeus contrasta com a alta natalidade de algumas comunidades muçulmanas, o que pode alterar a dinâmica demográfica a longo prazo. O medo de um europeu autóctone ser acusado de islamofobia é um problema diário nas capitais europeias. 

Assim como em 711, os islâmicos na Europa já são num número suficientemente grande para pedirem ajuda aos seus irmãos do outro lado do Mediterrâneo. Assim como em 711, quando os visigodos estavam enfraquecidos por divisões internas, um pequeno grupo dentro do próprio reino visigótico facilitou a invasão muçulmana. Hoje a Europa está sem uma liderança forte e sem um projeto de defesa comum. A diferença é que, desta vez, a "invasão" não precisa acontecer pela via militar tradicional; a mudança pode ser gradual, através da demografia, da propaganda política, e da incapacidade europeia de reagir. Se os Estados do Norte de África e Levante usarem a migração como arma política (como já fez a Turquia ao liberar refugiados sírios em direção à Europa), isso pode acelerar uma mudança demográfica irreversível. Em um contexto de crise, células radicais podem-se organizar para criar zonas onde a lei islâmica se sobrepõe à lei do Estado, como já ocorre em algumas áreas urbanas europeias. O desafio para os europeus, ao contrário dos cristãos da Reconquista, é não haver hoje uma semelhante identidade forte para mobilizar uma reação. Além disso, qualquer tentativa de resistência cultural pode ser imediatamente taxada como de "extrema-direita" xenófoba e racista. Ora este anátema paralisa as lideranças políticas.

Os mais ricos já se isolam em condomínios fechados. Isso significa que perderam a confiança na capacidade do Estado de manter a ordem. O terrorismo pode ser a ferramenta mais avassaladora nesse processo. Não será preciso uma grande guerra aberta; ataques sistemáticos contra alvos estratégicos (infraestruturas, transportes, áreas de alta densidade populacional) podem tornar a vida nas cidades europeias insustentável. Isso acelerará ainda mais a fuga dos mais ricos para zonas protegidas, enquanto as populações mais vulneráveis ficam à mercê da sua sorte presas no caos das áreas devastadas. O ano de 2025 pode ser o ano decisivo para testar até que ponto a União Europeia terá os seus dias contados. Os
 europeus ou tomam as rédeas do seu próprio destino investindo seriamente na sua segurança, ou então: lá se foi a Europa com a perda da sua autonomia estratégica. A grande incógnita é se a Europa ainda tem energia política e cultural suficiente para reagir.

A falta de coesão europeia e a indefinição cultural e política tornam o continente ainda mais vulnerável. Sem uma visão clara para o futuro, sem capacidade de se renovar culturalmente, os europeus correm o risco de perder não apenas a coesão territorial, mas a própria identidade histórica. Os "outros", com uma narrativa forte e objetivos bem definidos, podem, sim, aproveitar essa oportunidade. O desconforto material e psicológico gerado pela acomodação do Estado de bem-estar social está criando uma geração de europeus que não têm força ou vontade de lutar por uma renovação de suas condições. O comodismo gerado por décadas de estabilidade económica, apesar de seus problemas, tem tornado a sociedade europeia vulnerável à fragmentação. As elites políticas, distantes da realidade das pessoas comuns, temem mexer no sistema de proteção social ou adotar reformas impopulares, porque isso significaria perder o apoio popular. No entanto, ao escolherem a conformidade, deixam de responder de forma eficaz aos desafios que vêm de fora, como a migração em massa, o crescimento de influências externas e até mesmo a pressão climática.

Esse cenário lembra o colapso de impérios antigos, onde as elites se tornaram corruptas e enfraquecidas. Quando perceberam as mudanças e os sinais de decadência já era tarde demais. A fragilidade climática apenas acelera esse processo, tornando a sociedade mais vulnerável a choques externos e internos. A seca, as inundações, a escassez de recursos e a crescente instabilidade política estão a forçar migrações em massa em direção à Europa. E isso está a criar um cenário de crescente instabilidade dentro da própria Europa. A História é implacável e não perdoa a falta de visão e coragem política. As gerações que viveram o auge da civilização europeia estão deixando um legado que, em muitos casos, não consegue mais responder à magnitude dos desafios contemporâneos.

Uma reconstrução radical exigiria algo equivalente a um prémio tipo "Euromilhões" gigantesco, algo que pudesse galvanizar a sociedade a olhar para o futuro com renovado vigor. Esse tipo de evento poderia ser o suficiente para quebrar a inércia e impulsionar uma onda de inovação social e económica, onde novos modelos políticos fossem discutidos e, quem sabe, implementados. No entanto, o problema é que o dinheiro e os recursos financeiros raramente são usados de maneira eficaz para transformar profundamente uma sociedade, especialmente quando há tanta resistência à mudança e um sistema tão acostumado ao bem-estar social. A necessidade de mudança, ou mesmo o desejo de algo novo, depende muito de uma revolução de mentalidades, mais do que uma revolução financeira. Mesmo com grandes recursos, se a mentalidade não mudar, o dinheiro vai acabar por ser usado para reforçar a velha estrutura. Assim, a verdadeira questão talvez seja perguntar se dentro da Europa existe uma vontade coletiva para abrir mão de uma parte do que foi construído para fazer algo diferente.

As fábricas de automóveis europeias estão enfrentando enormes dificuldades devido à concorrência da China e à transição para veículos elétricos, o que põe ainda mais em evidência a fragilidade do modelo de produção industrial europeu. A China não só domina a produção de veículos elétricos, mas também tem um controlo crescente sobre as tecnologias e matérias-primas essenciais para a indústria. Enquanto isso, os fabricantes europeus, que ainda dependem em grande parte de modelos mais tradicionais, lutam para se adaptar a um mercado global em transformação. É a perda de competitividade diante de potências emergentes como a China, que não só possui uma força de trabalho massiva e eficiente, mas também uma capacidade de inovação tecnológica que supera os modelos ocidentais. Além disso as indústrias europeias atrasaram-se na mudança, tendo sustentado tempo demais as velhas estruturas. Enquanto a China adotou uma abordagem mais radical e acelerada. Esse declínio das indústrias tradicionais europeias é um sinal claro de que a região não está conseguindo se adaptar rapidamente às novas realidades económicas e tecnológicas, e a falta de inovação pode ser fatal a longo prazo. Se a indústria automobilística, que é uma das mais emblemáticas do continente, está à beira da falência, o que isso significa para o restante da economia europeia? Isso reforça o pessimismo sobre o futuro europeu, uma vez que a velha ordem industrial e comercial da Europa parece estar perdendo a batalha para as novas dinâmicas globais.

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