Como eles só tardiamente aderiram à escrita, qual Sócrates, sabemos muito pouco dos séculos primordiais dos escandinavos. As sociedades escandinavas só tardiamente registaram a sua história em forma escrita. Assim como no caso de Sócrates, cuja vida e pensamentos dependem de fontes secundárias (Platão, Xenofonte e Aristófanes), o conhecimento sobre os primórdios escandinavos baseia-se em tradições orais, poemas épicos e relatos posteriores, muitas vezes escritos por estrangeiros. Os escandinavos pré-cristãos usavam as runas, mas elas serviam principalmente para inscrições curtas, como monumentos, marcas de propriedade ou registos memorialísticos. Os registros mais extensos e narrativos só surgiram após a cristianização da região, quando cronistas começaram a usar o alfabeto latino e a compilar as sagas, como as Sagas dos Reis e os Eddas.
Os gregos da Fócida (Grécia Central) sediados em Massalia (Marselha) que iam ao Norte buscar estanho para a sua civilização, eram navegadores e comerciantes tendo sido pioneiros em criar rotas marítimas e terrestres que conectavam o Mediterrâneo ao Atlântico Norte, desempenhando um papel importante na disseminação de ideias, tecnologias e materiais essenciais, como o estanho, indispensável para a produção de bronze. Fundada pelos gregos fócios por volta de 600 a.C., Massalia tornou-se um dos principais entrepostos comerciais do Mediterrâneo ocidental. De lá, os fócios empreendiam viagens ao Norte, alcançando regiões como a Bretanha e as Ilhas Britânicas, em busca de estanho e outros recursos. Esses contactos fortaleceram o comércio e estimularam o intercâmbio cultural entre as sociedades mediterrâneas e as populações celtas do Norte. Além do estanho, os fócios transportavam vinho, azeite e cerâmicas gregas para o Norte e traziam de volta metais preciosos, âmbar e outros recursos. Essa rede de comércio contribuiu para a circulação de ideias e tecnologias, influenciando as culturas locais e, indiretamente, a futura integração europeia.
Massalia era um centro de helenização, e sua influência foi sentida tanto no sul da Gália quanto nas regiões mais distantes alcançadas por seus comerciantes. A filosofia, a escrita e a organização política gregas foram gradualmente introduzidas em áreas que antes tinham pouco contacto com essas ideias. Os fócios serviram como uma ponte entre mundos diferentes. Ao integrar os recursos do Norte à economia do Mediterrâneo, eles ajudaram a preparar o terreno para as interações mais profundas que viriam durante o período romano. Esse esforço pioneiro dos gregos fócios é uma demonstração de como a globalização já existia em sua forma arcaica. Eles não apenas supriram as necessidades de sua própria civilização, mas também criaram uma rede de conexões que, de certo modo, antecipou os intercâmbios culturais e materiais que moldariam a Europa nos séculos seguintes. O cristianismo e os avanços posteriores só foram possíveis porque civilizações como a grega abriram os caminhos, literalmente, para o Norte e além dele.
Píteas de Massalia, navegante e geógrafo do século IV a.C., era oriundo da colónia grega de Massalia. Realizou uma expedição que alegadamente o levou a regiões até então desconhecidas pelos gregos, incluindo as Ilhas Britânicas, o Mar do Norte e possivelmente a Islândia ou a Noruega (que ele chamou de "Thule"). Contudo, os relatos sobre suas viagens, registados na obra perdida "Sobre o Oceano", chegaram até nós apenas por fragmentos citados por autores posteriores, como Estrabão e Plínio, que muitas vezes o criticavam por ser controverso. Muitos autores da Antiguidade, como Estrabão, consideraram as descrições de Píteas exageradas ou fantasiosas. Eles duvidavam, por exemplo, das suas descrições de "dias sem noite", e mares congelados, fenómenos reais em regiões árticas, mas desconhecidos pelos gregos da época. Píteas viajou sozinho e suas narrativas não foram corroboradas por outros exploradores gregos ou romanos de sua época. Isso contribuiu para a percepção de que ele poderia ter inventado ou embelezado seus relatos. Algumas passagens parecem míticas, como a descrição de "Thule" como um lugar onde a terra, o mar e o ar formavam uma substância única e pastosa. Tais descrições levantaram suspeitas de que ele misturava observação com especulação.
Fosse como fosse, Píteas foi um Descobridor, descreveu fenómenos reais, como os solstícios árticos e a extração de âmbar e estanho em regiões do Norte, muito antes de essas áreas serem plenamente exploradas por outras culturas mediterrâneas. Estudos arqueológicos confirmam que, na época de Píteas, já havia comércio entre o Mediterrâneo e a Europa do Norte, com o estanho da Cornualha, por exemplo, sendo exportado para o Sul. Mesmo que não possamos verificar todas as suas alegações, ele foi o primeiro a oferecer aos gregos uma ideia do que existia além das Colunas de Hércules, o limite para um Oceano desconhecido e perigoso, ampliando significativamente os horizontes do mundo helénico.
Embora seja prudente tratar os relatos de Píteas com alguma reserva, especialmente porque foram transmitidos indiretamente e muitas vezes por críticos, também não podemos descartá-los completamente. Sua obra reflete um esforço genuíno de ampliar os limites do conhecimento grego e, paradoxalmente, muitos dos fenómenos que ele descreveu, ridicularizados na época, foram confirmados por estudos modernos. Píteas, assim, permanece uma figura ambígua: um explorador ousado que desafiou os limites do imaginável, mas cuja credibilidade é ofuscada pela falta de evidências diretas e pelo filtro das tradições clássicas. Só por preconceito cultural, ou ingenuidade, um sujeito do sul da Europa se espante com o facto de os escandinavos ou nórdicos terem tido antepassados, tão violentos e rapaces, identificados por Vikings
Os Vikings, conhecidos por suas incursões violentas e saques, eram produto de seu tempo, marcado por escassez de recursos e pela ausência de Estados centralizados na Escandinávia. A violência era um meio de sobrevivência, expansão e enriquecimento num contexto de rivalidades tribais e oportunidades comerciais. Hoje, as sociedades nórdicas são frequentemente vistas como modelos de progresso, igualdade e pacifismo, o que contrasta radicalmente com a imagem popular dos vikings. Esse contraste pode gerar espanto, mas ele desaparece quando se reconhece que todas as sociedades humanas têm histórias de violência e exploração. O que reflete mais a condição humana do que características intrínsecas a qualquer povo.
Dessa forma, os "séculos primordiais" dos escandinavos permanecem envoltos em mistério. O que sabemos provém de fontes arqueológicas, como tumbas, armas e objetos cerimoniais, e de interpretações posteriores, feitas à luz de suas mitologias e tradições, que foram registadas já num período de transição cultural. Esses relatos, no entanto, são filtrados pela ótica de quem os registou que eram cristãos, padres ou monges, influenciados pelas suas crenças que moldavam as interpretações que faziam do seu passado que era pagão. Na verdade o cristianismo nesse aspecto foi muito importante. Os europeus colocaram-se na dianteira do conhecimento e da ciência graças ao cristianismo. A ele os europeus devem a base intelectual e institucional que permitiu à Europa liderar o avanço do conhecimento e da ciência. Embora frequentemente associado a um período de censura ou atraso em algumas áreas, o cristianismo também teve um impacto profundamente positivo em outros aspectos, como a Preservação do Conhecimento Clássico - durante a Idade Média, os mosteiros e catedrais tornaram-se centros de aprendizagem, onde monges copiaram e preservaram manuscritos da Antiguidade Clássica. Sem esse esforço, muito do conhecimento grego e romano teria se perdido.
A Igreja foi pioneira na criação das universidades medievais, que se tornaram centros de debate intelectual. Universidades como Bolonha, Oxford e Paris foram fundadas sob auspícios eclesiásticos, incentivando a sistematização do pensamento. A teologia cristã promoveu a ideia de um universo ordenado, criado por um Deus racional, que poderia ser compreendido pela razão humana. Essa visão foi fundamental para o desenvolvimento do método científico. Muitos cientistas da Revolução Científica, como Copérnico, Kepler, e Newton, eram profundamente religiosos e viam o seu trabalho como uma forma de compreender a criação divina. A cristianização da Europa trouxe a alfabetização em larga escala, incentivando a disseminação de ideias. A invenção da imprensa por Gutenberg (também profundamente influenciado pelo cristianismo) ampliou essa tendência, democratizando o acesso ao conhecimento.
Esse avanço intelectual, entretanto, não foi linear. O cristianismo também teve momentos de tensão com o progresso científico, como no caso de Galileu. No entanto, ao longo dos séculos, a base fornecida pelas instituições cristãs foi essencial para o florescimento de uma Europa que, mais tarde, lideraria o mundo em ciência e tecnologia. De Vico foi um grande visionário nesse aspecto, de perceber o que se estava a passar. Giambattista Vico (1668-1744) foi um visionário ao captar as profundas dinâmicas históricas e culturais que moldaram a civilização europeia. Ele percebeu que a ascensão do cristianismo e suas instituições estavam intimamente ligadas ao desenvolvimento de uma nova consciência histórica, moral e científica. Sua obra-prima, "A Ciência Nova", é uma tentativa audaciosa de entender os padrões recorrentes no desenvolvimento das sociedades humanas, unificando história, filosofia e filologia.
Vico propôs que as civilizações passam por ciclos (a idade dos deuses, dos heróis e dos homens), cada um moldado por mudanças na cultura, religião e linguagem. Ele reconheceu que o cristianismo inaugurou a "idade dos homens", marcada pela racionalidade e pela busca de um entendimento mais humano e científico do mundo. Para Vico, o cristianismo foi essencial para consolidar a civilização europeia. Ele viu no cristianismo uma força moralizadora e civilizadora que harmonizou o barbarismo das eras anteriores, estabelecendo fundamentos para instituições sociais mais equilibradas e progressistas. Vico percebeu que a transição da oralidade para a escrita (facilitada pela Igreja e suas escolas) e, mais tarde, para o pensamento crítico, foi central para o desenvolvimento europeu. Ele também destacou como a recuperação dos textos clássicos durante o Renascimento só foi possível devido aos esforços de preservação por parte dos monges nos mosteiros. Vico antecipou muitas ideias modernas sobre a evolução cultural e os ciclos históricos. Ele mostrou que as conquistas europeias no conhecimento e na ciência não surgiram do nada, mas de um longo processo de síntese cultural, no qual o cristianismo desempenhou um papel central. Sua visão interdisciplinar e suas reflexões sobre as conexões entre história, cultura e ciência continuam a ser uma fonte de inspiração para os estudiosos que buscam compreender as origens da modernidade europeia.
O desenvolvimento da Escandinávia moderna também mostra que as sociedades podem superar heranças violentas, transformando-se por meio de instituições fortes, educação e valores humanistas. Logo, o espanto é mais uma questão de desconhecimento. Tal facto também se podia colocar ao contrário, do espanto dos nórdicos em relação aos ibéricos, romanos e gregos, também com histórias igualmente marcadas pela violência e dominação.
De qualquer modo, o que causava admiração nos homens do Sul era também a sua sabedoria, apesar de pagã, sobretudo quando punham à frente das preocupações da morte, sem a temerem, a sua reputação que perduraria depois de partirem para o Valhala. Para eles, a vida era efémera, mas a memória de seus feitos, imortalizada nas sagas ou na tradição oral, conferia uma espécie de eternidade simbólica. Era como se a imortalidade não residisse na permanência do corpo ou da alma, mas na perpetuação do nome e das ações. Essa postura está bem expressa na Hávamál, parte dos Eddas: "Cattle die, kinsmen die, you yourself must die; but one thing never dies — the fame of a dead man's deeds."
Esse avanço intelectual, entretanto, não foi linear. O cristianismo também teve momentos de tensão com o progresso científico, como no caso de Galileu. No entanto, ao longo dos séculos, a base fornecida pelas instituições cristãs foi essencial para o florescimento de uma Europa que, mais tarde, lideraria o mundo em ciência e tecnologia. De Vico foi um grande visionário nesse aspecto, de perceber o que se estava a passar. Giambattista Vico (1668-1744) foi um visionário ao captar as profundas dinâmicas históricas e culturais que moldaram a civilização europeia. Ele percebeu que a ascensão do cristianismo e suas instituições estavam intimamente ligadas ao desenvolvimento de uma nova consciência histórica, moral e científica. Sua obra-prima, "A Ciência Nova", é uma tentativa audaciosa de entender os padrões recorrentes no desenvolvimento das sociedades humanas, unificando história, filosofia e filologia.
Vico propôs que as civilizações passam por ciclos (a idade dos deuses, dos heróis e dos homens), cada um moldado por mudanças na cultura, religião e linguagem. Ele reconheceu que o cristianismo inaugurou a "idade dos homens", marcada pela racionalidade e pela busca de um entendimento mais humano e científico do mundo. Para Vico, o cristianismo foi essencial para consolidar a civilização europeia. Ele viu no cristianismo uma força moralizadora e civilizadora que harmonizou o barbarismo das eras anteriores, estabelecendo fundamentos para instituições sociais mais equilibradas e progressistas. Vico percebeu que a transição da oralidade para a escrita (facilitada pela Igreja e suas escolas) e, mais tarde, para o pensamento crítico, foi central para o desenvolvimento europeu. Ele também destacou como a recuperação dos textos clássicos durante o Renascimento só foi possível devido aos esforços de preservação por parte dos monges nos mosteiros. Vico antecipou muitas ideias modernas sobre a evolução cultural e os ciclos históricos. Ele mostrou que as conquistas europeias no conhecimento e na ciência não surgiram do nada, mas de um longo processo de síntese cultural, no qual o cristianismo desempenhou um papel central. Sua visão interdisciplinar e suas reflexões sobre as conexões entre história, cultura e ciência continuam a ser uma fonte de inspiração para os estudiosos que buscam compreender as origens da modernidade europeia.
O desenvolvimento da Escandinávia moderna também mostra que as sociedades podem superar heranças violentas, transformando-se por meio de instituições fortes, educação e valores humanistas. Logo, o espanto é mais uma questão de desconhecimento. Tal facto também se podia colocar ao contrário, do espanto dos nórdicos em relação aos ibéricos, romanos e gregos, também com histórias igualmente marcadas pela violência e dominação.
De qualquer modo, o que causava admiração nos homens do Sul era também a sua sabedoria, apesar de pagã, sobretudo quando punham à frente das preocupações da morte, sem a temerem, a sua reputação que perduraria depois de partirem para o Valhala. Para eles, a vida era efémera, mas a memória de seus feitos, imortalizada nas sagas ou na tradição oral, conferia uma espécie de eternidade simbólica. Era como se a imortalidade não residisse na permanência do corpo ou da alma, mas na perpetuação do nome e das ações. Essa postura está bem expressa na Hávamál, parte dos Eddas: "Cattle die, kinsmen die, you yourself must die; but one thing never dies — the fame of a dead man's deeds."
Sem comentários:
Enviar um comentário