Ara votiva, que se encontra no Museu Nacional de Arqueologia, Lisboa
Depois de pernoitarmos na Península de Tróia, concelho de Grândola, lá seguimos a estrada para Redondo e Vila Viçosa, à procura de um santuário proto-histórico de penedos escarpados que se encontra num local chamado Rocha da Mina, Alandroal. É um lugar mágico de forte magnetismo. Os povos célticos, da segunda idade do ferro, parece terem sido atraídos por este local. Ora, este santuário encontra-se junto à Ribeira de Lucefecit, onde os Lusitanos adoravam o deus Endovélico.
Os vestígios encontrados vão desde o tempo pré-romano até à idade média, com a construção de igrejas, algumas delas aproveitando estruturas de cultos pagãos. Existem várias igrejas, como a da Fonte Santa, São Miguel da Mota e o Santuário da Nossa Senhora da Boa Nova, esta, ainda local de peregrinação. Subindo os degraus do santuário da Rocha da Mina, deparamos de frente o ‘Sol Nascente’. As escadas e os pavimentos talhados na rocha são elementos recorrentes num número relativamente elevado de santuários pré-romanos, alguns dos quais romanizados, e são interpretados frequentemente como ‘altares de sacrifício’. Ir a este santuário é mais do que uma experiência visual, é uma experiência sensorial e poder-se-ia mesmo dizer, apesar do esoterismo implícito, que é uma experiência mística. O caminho em direcção ao santuário, por entre o bosque denso, mesmo em dias de sol parece ter uma escuridão própria, que acentua o som do curso da Ribeira de Lucefecit. Ainda a alguma distância do santuário, por entre a folhagem dos altos eucaliptos, começa-se a visualizar um elevadíssimo afloramento natural de xisto, uma visão imponente e poderosa que de imediato nos provoca uma sensação de respeito e solenidade. Apesar de se tratar de um afloramento natural, ao caminhar em direcção ao mesmo consegue-se ter a percepção de se estar perante alguma forma de templo, tal a atmosfera criada pelo afloramento, que parece engolir o sol em grande parte do dia, ficando os seus raios a reluzir nos contornos do imponente templo natural, em concordância com o carácter tanto ctónico como luminoso de Endovélico.
Para os Celtas, ou para os povos aparentados como devem ter sido os Lusitanos, os templos e santuários divinos encontram-se na própria Natureza, e não em construções por mão humana. Ao contrário do santuário romano, de génese posterior, no outeiro de São Miguel da Mota, já romanizado e como tal tendo sido um reduto de colunas de mármore e estátuas representativas de Endovélico, o Santuário de Rocha da Mina deverá ter sido o santuário primitivo a Endovélico, provavelmente Lusitano. Apesar do Santuário de São Miguel da Mota ser muito importante devido ao número de estelas com dedicações a Endovélico em latim e estátuas representativas, o carácter primitivo de Rocha da Mina também mereceu a atenção por parte de eminentes arqueólogos como Leite de Vasconcelos, e mais recentemente por arqueólogos contemporâneos como Manuel Calado ou Maria João Correia Santos, além de estudos mais ao nível do carácter esotérico e iniciático do santuário por parte de Paulo Alexandre Loução.
Deus Mithra é representado muitas vezes sacrificando um touro, com o gorro frígio e uma serpente associada. Esta divindade indo-iraniana, aparece mencionada como deus protetor dos juramentos, num tratado do século XV a.C. realizado entre os hititas e o reinado dos Mitani. Tornou-se muito importante na Pérsia antiga vindo a ganhar posteriormente um lugar de destaque no Império Romano. Tendo nascido a 25 de dezembro, está diretamente relacionado com o ciclo solar da mesma forma que o misterioso Abraxas gnóstico.Dezembro é o mês em que se marca o Solstício de Inverno, que, de algum modo, se comemorava em Roma com as Saturnália, um festival em honra de Saturno. Celebrava-se no dia 17 de dezembro, mas ao longo dos tempos, foi estendida a uma semana completa, terminando a 23 de dezembro. Também o deus Mitra, cujo nascimento era evocado a 25 de dezembro, tal como virá a acontecer com o Menino Jesus, tinha uma forte relação com o Sol. Este deus de origem oriental teve grande adesão junto dos soldados romanos, os legionários, e também entre os funcionários administrativos e comerciantes. No Ocidente, o seu culto acabou por confundir-se com o do Sol Invictus, ou Sol Invencível, pois verifica-se, em finais do século III, o sincretismo entre a religião de Mitra e outros cultos solares de procedência oriental.
Esta finisterra da Europa, que é Portugal, não foi por estar na extremidade do continente europeu que deixou os seus povos indígenas a salvo de sucessivas invasões a partir de há pelo menos dois mil anos. Antes dos romanos, que trouxeram para cá outros cultos, muitos povos deixaram por cá os seus vestígios arqueológicos. A partir de meados do segundo milénio e inícios do primeiro milénio a.C. muitos outros povos assentaram neste território. Quer dizer, se os povos de várias tribos dispersas a que se convencionou chamar “celtas” (englobando os povos de língua indo-europeia onde estão incluídos germanos e lusitanos) assentaram predominantemente no norte, os povos mediterrânicos - fenícios, cartagineses, gregos, romanos, anatólios e judeus sefarditas - ao longo de pelo menos o mesmo período dos primeiros fizeram-no no sul, de línguas predominantemente de origem semita.
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