sexta-feira, 21 de agosto de 2020

A decadência e as obrigações que ela nos impõe


No caso agora dos lares de velhos, que no tempo em que eu era criança se chamavam asilos, vem à superfície da espuma mediática a incúria induzida pela indigência do pensamento político. Que significa falta de preocupação. Logo, falta de cuidado.



Em abono da verdade é bom que se diga que o poder político não tem para onde se virar com tanta indigência, que não se esgota nos velhos. Vejam-se os artistas, não por agora os trolhas e biscateiros, mas os das artes lúdicas que temem a sua transformação em tralha definitiva de museu, caso o velho estique, e o vírus fique por cá de vez. Assim está a acontecer por todo o lado, e Portugal não ia ser uma exceção, tanto mais quando Ele se estava a preparar para capital mundial do turismo.



De facto, o que ainda não se compreendeu neste velho país com 900 anos, não 90 é preciso que se diga, é a unidade identitária dos portugueses, a sua singularidade cultural. E isto é, para o bem e para o mal, o que determina o imperativo do lúdico sobre o económico. Ou por outras palavras: economia sim, mas economia do espírito, libidinal.

A decadência da Europa umas vezes, a decadência do Ocidente outras vezes, já teve vários pré-anúncios. Valéry escreveu A Crise do Espírito, em que declarou a mortalidade das civilizações. Husserl publicou alguns anos depois A Crise das Ciências Europeias. Da Europa tudo de podia esperar e dizer: o melhor e o pior. O devir das sociedades humanas tem sido marcado por roturas tecnológicas que, tal como as globalizações, operam à margem da democracia. É nestes termos que a digitalização constitui a última rotura tecnológica. Portanto, a última estação da civilização.

Como as revoluções tecnológicas estão acima da vontade humana, os discursos políticos são na sua maioria fugas para a frente em jogos de linguagem instrumentalizados por interesses de grupos, desde os corporativos aos partidários. Ora, é assim que se preparam as catástrofes, com mercados de audiências e fóruns de discussão e opinião. É demos e demagogia, Médias e Capitais "murdoches". O princípio e o fim das decadências industriais do "big show".

De certa forma foi a Europa que se resignou à liquidação da sua própria cultura ao copiar os modelos económicos americanos, não compreendendo que a globalização não dignifica, de modo algum, o mimetismo generalizado. Está fora de questão desenvolver-se um novo eurocentrismo. O devir da Europa passa por um devir planetário, que é o processo de individuação universal.

A necessidade de consumo é uma espécie de adição, uma ansiedade fabricada pelo capitalismo. É por assim dizer um pathos do capitalismo. O trágico é que se normalizou na cabeça de toda a gente, consciente ou inconscientemente. Um processo aviltante, em que a consciência de cada um se tornou uma mercadoria.

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