terça-feira, 25 de agosto de 2020

Da presença portuguesa no Oriente


E se vós, emigrantes, tendes de vos fazer ao mar, aquilo que vos impedirá, também a vós, será ainda uma crença. 

Friedrich Nietzsche. 

Se não queres pagar hotel, apanha um autocarro noturno, e poupas o preço de um quarto. Dormes em andamento que fica mais barato. De manhã chegas a Malaca para veres os restos da Famosa. Se fores novo as dores nas costas passam num instante. Faz de conta que és Francisco Serrão, o capitão da expedição que Afonso de Albuquerque enviou pela Indonésia abaixo no maior dos secretismos em 1511. A razão? Obviamente os produtos locais, o sabor exaltante a especiarias dos pratos locais.




Malaca durante 130 anos (1511-1641) foi uma colónia Portuguesa. Afonso de Albuquerque procurou erguer fortificações permanentes, antecipando os contra-ataques do Sultão Mahmud. Uma fortaleza foi construída no sítio do palácio do Sultão, destruído durante a luta pela cidade. Para defender a cidade, os portugueses ergueram um forte, cuja porta, chamada Famosa, ainda existe, como se vê na fotografia acima. 
Fazendo parte da Fortaleza de Malaca, foi em tempos a Porta de Santiago. Esta era uma das antigas portas que se rasgavam na muralha da cidade, defendida pelo baluarte do mesmo nome, voltado para o mar, que ali chegava à época. 

Em 1521 o Capitão Duarte Coelho Pereira construiu a igreja de Nossa Senhora do Monte. Em 1526, uma grande força de navios portugueses comandada por Pedro Mascarenhas (c.1484-1555) foi enviada para destruir Bintan, onde estava Mahmud. O sultão fugiu com a família para Sumatra, do outro lado do estreito, onde veio a falecer dois anos depois.

O controlo português de Malaca não significava o controlo do comércio asiático que por ali passava. O domínio sobre o local sofria com dificuldades administrativas e económicas. Em vez de concretizar a sua ambição de controlar o comércio asiático, o que os portugueses lograram foi desorganizar a rede mercantil da região. Desaparecera o porto centralizador do comércio e, com ele, o Estado que policiava o Estreito de Malaca. O comércio espalhou-se por diversos portos a expensas de embates militares no estreito. Em 1641, já depois de Francisco Xavier, jesuíta, ter passado em Malaca de 1545 a 1550, os portugueses perderam o controlo de Malaca para as mãos dos holandeses - Companhia Neerlandesa das Índias Orientais. 




Em sua origem, "A Famosa" era o epíteto da primitiva torre, erguida por Afonso de Albuquerque aquando da conquista da cidade em 1511, mas que foi severamente danificada quando do cerco de 1640/41, e que culminou com a conquista da cidade pelos holandeses. 

Entre o final da década de 1560 até cerca de 1590, várias foram as alterações introduzidas na defesa. Na parte da cerca da cidade voltada ao mar, construiu-se o baluarte de São Pedro, também denominado como "Couraçada". A extremidade norte da cerca passou a terminar no baluarte de São Domingos e a extremidade sul no de Santiago, ligados por uma paliçada. No centro da paliçada pelo lado sul foi erguido o baluarte das Onze Mil Virgens. O perímetro murado da cidade totalizava então 1310 braças. Quatro portas davam acesso ao recinto fortificado, uma de cada lado. As mais usadas eram a Porta da Alfândega, que dava acesso à ponte sobre o rio de Malaca, e a Porta de Santo António, a leste do baluarte das Onze Mil Virgens. Nos últimos anos de domínio português, Malaca foi transformada numa Praça-forte quase inexpugnável, convicção que era partilhada pelos neerlandeses. 

A praça mudou de mãos uma vez mais em 1795, desta vez entregue de bandeja para as mãos dos ingleses. Era preferível ficar nas mãos dos ingleses do que dos franceses, que se encontravam num ímpeto expansionista imparável sob a batuta de Napoleão. Em 1807 o Governador inglês, William Farquar, ordenou a demolição da fortificação, a pretexto das elevadas despesas de manutenção e, afirma-se, para prevenir que ela fosse utilizada contra os interesses britânicos na região. Nesse momento as defesas foram mais uma vez testadas, uma vez que centenas de trabalhadores não conseguiriam partir nem remover as antigas pedras, tendo sido necessário recorrer a explosões consecutivas que, uma testemunha ocular, descreve deste modo: "...pedaços do forte tão grandes como elefantes, foram pelos ares e caíram ao mar". 



A missão de Francisco Serrão foi de uma importância fulcral para o futuro da presença portuguesa no Oriente era localizar a origem de duas das mais ambicionadas especiarias daquela época: o cravinho-da-índia e a noz-moscada. Naquela época a economia eram as especiarias. Na época que está para findar tem sido o petróleo. Naquele tempo as caravelas, hoje os petroleiros. Como chegar às míticas “Ilhas das Especiarias” era o ômega do início da Idade Moderna. Francisco Serão resolveu-o. Depois de localizar as Molucas, a armada de António de Abreu regressa a Malaca com as excelentes notícias. Mas o navio de Serrão naufragara. O português salva-se e consegue alcançar Ternate. Já não regressa, morre em Ternate em 1521.

Francisco Serrão, amigo de Fernão de Magalhães, na sua viagem de 1512, foi o primeiro europeu de que se tem notícia a navegar para o leste, além de Malaca, através da Indonésia, alcançando as lucrativas "Ilhas das Especiairias”, no arquipélago das Molucas. Aliou-se ao sultão Bayan Sirrullah, que governava Ternate, onde se fixou, tornando-se seu conselheiro pessoal. O navio de Serrão naufragou, mas conseguiu chegar à ilha de Luco-Pino. Com uma tripulação de nove portugueses e de nove indonésios, o navio foi arremessado por uma tempestade de encontro a um recife ao largo de uma pequena ilha. A sua tentativa de reunir-se a Abreu foi impedida pela tempestade e ele desembarcou na ilha de Ternate.

Quando os habitantes da ilha, conhecidos saqueadores de naufrágios, tomaram conhecimento do naufrágio do barco de Serrão, dirigiram-se para o local. A tripulação de Serrão encontrava-se desarmada, pelo que necessitava de auxílio. Quando os saqueadores se aproximaram os portugueses não estiveram com meias medidas, atacaram e capturaram tanto as embarcações como os seus tripulantes. Os seus salvadores involuntários foram então obrigados a conduzi-los a Amboino, onde desembarcaram em Hitu. A armada de Serrão, o mosquete, e a sua experiência náutica impressionaram os poderosos chefes de Hitu que se encontravam em guerra contra Luhu, o principal assentamento na península Hoamal na ilha de Ceram perto de Hitu. Os portugueses também foram bem recebidos na região como compradores de alimentos e de especiarias num momento de baixa naquele comércio, causado pela interrupção temporária das navegações Javanesas e Malaias para a região desde os conflitos de 1511 em Malaca. Os visitantes foram recrutados como aliados militares e as suas subsequentes explorações foram notadas pelos vizinhos rivais de Ternate e Tidore, tendo ambos enviado emissários para induzir os visitantes a ajudá-los.

Ao aliar-se de forma pessoal a Ternate, o poder mais forte na região, Serrão passou a servir como chefe de um bando de mercenários portugueses ao serviço do sultão Bayan Sirrullah, um dos dois senhores mais poderosos que controlavam o comércio de especiarias. Tendo-se tornado amigos íntimos, o Sultão nomeou Serrão como seu conselheiro pessoal para todas as questões, incluindo as militares. 
Tendo sido bem recebido pelo Sultão, Francisco Serrão decidiu permanecer ali, sem fazer qualquer esforço para retornar a Malaca.

As cartas de Serrão a Magalhães, levadas para Portugal via Malaca, e descrevendo as "Ilhas das Especiarias", ajudaram Magalhães a persuadir a Coroa Espanhola a financiar a sua viagem de circum-navegação. Ambos tinham feito planos para se encontrarem nas Molucas, o que não veio a acontecer. Serrão morreu em circunstâncias misteriosas na ilha de Ternate, e Magalhães morreria também mais ou menos na mesma altura, na ilha Mactán, nas Filipinas. António Pigafetta, 
o cronista da expedição de Magalhães, registrou, a  8 de novembro de 1521, que quando os sobreviventes da expedição aportaram a Tidore, foram informados que: 
[...] Ainda não havia oito meses tinha morrido em Ternate um Francisco Serrão, capitão general do rei de Ternate contra o rei de Tadore… depois, feita a paz entre eles, tendo ido um dia Francisco Serrão a Tadore contratar cravo, este rei mandou envenená-lo e não viveu mais que quatro dias,… o qual deixou um filho e uma filha pequenos de uma mulher que trouxe de Java Maior.

A herança deixada por Serrão foi uma diminuta quantidade de cravo avaliada em 200 bahares. Pigafetta, neste ponto da narrativa regista que Magalhães teria empreendido a viagem de circum-navegação baseado nas informações de Serrão e que este estaria a par das vicissitudes do seu amigo na Península. 

Veio a falecer na vizinha ilha de Tidore, em circunstâncias pouco esclarecidas, no mesmo momento em que Magalhães também falecia na ilha Mactán, em Cebu, nas Filipinas [...]

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