domingo, 9 de agosto de 2020

Um passeio por Viena




Situada no centro da Europa, os romanos chamaram-lhe Vindobona. Marco Aurélio escolheu-a como residência, depois de a ter tomado aos Celtas. Depois de os romanos terem cedido o protagonismo da História àqueles povos a que chamaram bárbaros, Viena entra de novo na História em 1278 como a casa dos Habsburgos, que durou até 1918, com o fim do Império austro-húngaro. Foi o desfecho natural da Primeira Guerra Mundial, embora a morte do velho imperador Francisco José I, em 21 de novembro de 1916 tenha acelerado o desenrolar dos acontecimentos. 


Foi essa a marca que a cidade nos deixou em 1997, não sei se hoje seria a mesma coisa, um turista português freelancer deambular a pé nas calmas pela cidade, ou de táxi, o taxista a abrandar a marcha a pouco mais de cem metros do semáforo, ainda verde, à espera do sinal vermelho. Eu tinha-lhe dito que queria ir para Hofburg. Mas o taxista não me compreendia. Quando lhe apontei o nome no mapa, ele exclamou: “Ah! Oburgue!" À volta de Hofburg cheira a cavalo, e ouve-se um ruído misto de cascos e ferragens das rodas das carruagens a deslizar com velhos turistas de outros tempos "amaricanos".


De resto é uma cidade que se faz bem a pé enquanto andarmos no Innere Stadt (cidade interior), por dentro da Ringstrass, em ruas como Graben, Kärnter Strasse e Kohlmarkt, que se entrelaçam numa ampla zona reservada aos peões, pavimentada a pedras aparelhadas em bonitos desenhos. Nenhum ponto da Innere Stadt fica muito distante da reconfortante Catedral de Santo Estêvão, onde podemos repousar sentados nos bancos corridos, enquanto tiramos algumas fotografias de um interior deslumbrante, a uma luz filtrada que só as catedrais sabem fazer. E numa estreita ruela perto dali está a casa onde Mozart passou alguns dos seus anos mais felizes e produtivos. 


Na Graben entrámos num daqueles cafés típicos de Viena onde pedimos uma fatia de um bolo de chocolate e um kleiner brauner. Já cá fora não resistimos a uma hora de esplanada com um sumo e um tiramisu para mais tarde recordar. 


A visita ao Museu Kunsthistorisches ficou para o dia seguinte, um acervo impressionante de obras de arte desde as múmias egípcias até às pinturas de Brueghel, Rembrandt e Van Dyck, entre muitos outros. Enquanto nos deslumbrávamos com aquele quadro de Brueghel dos caçadores na neve, passa por nós um jovem levado pelo braço de um segurança, com a máquina fotográfica na mão, retirando-o da sala, porque estava a infringir uma regra sagrada naquele museu: não podia tirar fotografias aos quadros, e ele estava a tirar. Mas não tardou dali a pouco vermos, desta vez uma jovem, com uma coisa encostada ao peito e agarrada com as duas mãos, parecia um tablet, mas não devia ser porque naquela data ainda não havia tabletes. Mas o que é certo, com grande destreza e muito sorrateiramente ia passando pela frente dos quadros e filmando, com uma elegância que só visto. 


À tarde fomos visitar o Palácio de Belvedere, que em boa verdade são dois, um em frente do outro separados por um jardim em socalcos. O mais bonito é o que está mais alto, onde está o célebre quadro do beijo, de Klimt. 


Para o terceiro dia ficou o Palácio de Schönbrunn, para lá do Ringstrasse, pelo que naturalmente apanhamos um táxi. Um palácio imperial que vale pela beleza arquitetónica rococó e dos jardins, com um arco de triunfo no topo, no outro extremo do palácio, e um grande jardim no meio. Era o palácio de férias, ou a residência de verão dos Habsburgos, onde Sissi pendurava umas cordas de argolas, no vão de uma porta, para manter a sua forma física em linha. 


Não fomos ao Prater, o parque de diversões mais antigo do mundo, junto ao Danúbio, onde avulta aquela Roda-Gigante que Graan Green menciona no seu romance depois da Guerra – O Terceiro Homem. Inaugurado em 1895, e a Roda em 1897, ainda mantém alguns dos brinquedos originais. A Roda-Gigante de Viena é um dos emblemas da cidade. Trata-se de uma obra monumental, de 60 metros de altura, que foi inaugurada durante a celebração do 50º aniversário da coroação de Francisco José I. Ao longo da sua história, a Roda-Gigante sobreviveu a grandes catástrofes naturais e conflitos bélicos. Foi testemunha da I Guerra Mundial, quando deixou de funcionar durante dois anos.

Em dois filmes, precisamente "O Terceiro Homem", e um outro - "Antes do Amanhecer", lá aparece a Roda Gigante. Em O Terceiro Homem, a Roda Gigante é onde Holly Martins, o personagem principal, encontra o personagem de Orson Welles. Eles têm uma conversa memorável: «... Você sabe o que dizem – na Itália, por trinta anos sob os Borgia, eles tiveram guerra, terror, assassinato e derramamento de sangue, mas eles produziram Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci, e o Renascimento. Na Suíça, eles tiveram amor fraternal, quinhentos anos de democracia e paz e o que eles inventaram? O relógio cuco.”Orson Welles mais tarde confessou que numa viagem à Suíça, muito educadamente, foi informado que os verdadeiros relógios de cuco são alemães, inventados na Floresta Negra e produzidos desde o século XVIII. No segundo filme, Antes do Amanhecer, a Roda Gigante é a cena do primeiro beijo entre Jesse e Céline. A escolha não é coincidência, já que Linklater é um grande fã de Orson Welles. Eles também passam pela porta onde o grande diretor fez sua primeira aparição em O Terceiro Homem. 


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