quarta-feira, 13 de maio de 2020

A Opera dos abutres sem revolução


O abutre de extrema-direita atreve-se a apresentar um voto de pesar “pela morte da pequena Valentina Fonseca, às mãos de quem a deveria amar e proteger” com o único intuito de o ver chumbado e fazer disso alarido mediático, já que nos considerandos do voto apela à consagração da pena de prisão perpétua através de revisão constitucional, mais uma vez fazendo da criança uma bandeira.© Isabel Moreira
São abutres todos os que tratam a morte de uma criança como uma oportunidade eleitoral ou comercial. Mas os suspeitos estão presos e a justiça não será feita pela CMTV, pelos linchadores das redes sociais, por alcoviteiros sedentos do seu bocadinho de fama, por políticos para quem a morte é um momento de campanha ou por magistradas que fazem julgamentos em comentários de Facebook. Será feita por juízes a sério, em tribunais legítimos e usando a lei que impede a arbitrariedade e o caos. Tudo o que nos faz ser diferentes dos assassinos de Valentina. Como sempre, a civilização contra a barbárie. A justiça contra criminosos e linchadores, que sempre se assemelharam.© Daniel Oliveira
Rossini [1792-1868], nas suas grandes óperas cómicas, tenta ressuscitar a inocência do mundo pré-revolucionário. Rossini não odiava ou combatia ativamente o Novo Mundo. Compunha simplesmente como se os anos de 1789 a 1815 não tivessem existido – dado que a partir da Revolução Francesa, o "Acontecimento da História Moderna", nada ficou como dantes – Rossini teve, portanto, razão em deixar de compor de 1830 em diante e em adotar a atitude satisfeita de um bom vivant, ocupando-se da preparação do seu tornedós – tal era eticamente o que de mais acertado podia fazer. O seu longo silêncio é compatível ao de Jean Sibelius [1865-1957], e na literatura, aos de Arthur Rimbaud [1854-1891] e Dashiell Hamett [1894-1961]. Não é de admirar que os anos dourados de Rossini tenham decorrido entre 1815 e 1830: os anos da reação, os anos durante os quais os poderes da Europa assumiram a tarefa impossível de fazer de conta que nada tivesse acontecido nas décadas revolucionárias anteriores.

Mozart [1756-1791] é outra coisa: Em Mozart, o potencial político emancipatório da peça Beaumarchais sobrevive à pressão da censura: basta pensarmos no seu final, quando o Conde tem de ajoelhar e pedir perdão aos seus súbditos. No Don Giovanni, no final, há uma explosão coletiva de “Viva la libertà”.

Quando o exército soviético, em 1956, entrou em Budapeste para esmagar a insurreição anticomunista, a mensagem repetidamente enviada pelos angustiados líderes húngaros ao Ocidente foi: “Estamos aqui a defender a Europa”. Hoje, depois da derrocada do comunismo, o governo cristão-conservador vai a caminho de uma ditadura em plena União Europeia Democrática. A Europa é o seu principal inimigo. 
Viktor Orban exprime a sua simpatia pelo sistema chinês, vendo no autoritarismo, “asiático” evidentemente, a solução contra a ameaça dos ex-comunistas. Esta ironia seria uma opera bufa, não se tratasse de uma coisa muito séria.

No verão de 2012, Viktor Orban afirmou que na Europa Central, é necessário construir um novo sistema económico: “E esperemos que Deus nos ajude e que não tenhamos de inventar um novo tipo de sistema político em vez desta democracia, que seja necessário introduzir para assegurar a sobrevivência económica … A cooperação é uma questão de força, e não de intenção. Talvez haja países onde as coisas não funcionem assim – os países escandinavos, por exemplo – mas um povo andrajoso e semiasiático como nós somos, só pela força pode manter-se unido”. 

Em abril de 2020 Viktor Orban aproveita o estado de emergência sanitário da pandemia para reforçar poderes. O Parlamento estende estado de emergência indefinidamente e reforça poderes do primeiro-ministro. Oposição critica: "Hoje começa a ditadura sem máscara de Orban". O governo de Viktor Orban, no poder desde 2010, tem posto em prática uma série de reformas de controlo da liberdade de imprensa, domínio sobre o sistema judicial e limitação dos direitos humanos, particularmente de minorias como judeus e ciganos, que levaram a União Europeia a abrir um processo interno contra o governo húngaro, em 2018, por preocupações com a integridade do Estado de direito no país.

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