segunda-feira, 18 de maio de 2020

Ao pequeno-almoço com Confúcio


Tal como: nós no Ocidente em relação a Jesus e a Sócrates; os Hindus em relação a Buda; e os Iranianos em relação a Zaratustra - os Chineses também não possuem uma única linha que tenha sido escrita por Confúcio. Tudo terá sido passado a escrito por outros, quer por fonte directa, quer por se ouvir dizer. Portanto, tudo o que se diz, pode ser encarado como do domínio da lenda e do mito.

Diz-se que aos cinquenta e um anos de idade foi ministro da justiça em Lu e, por fim, governador. Mas ao fim de quatro anos partiu, não se sabe para onde, algures pela China a divulgar a sua doutrina política. Quando por fim, já envelhecido, com 68 anos e e sem nenhum sucesso, regressou a Lu, confessando que após a sua longa peregrinação através de nove províncias, não havia logrado qualquer benefício. "Os homens são destituídos de compreensão, os anos correm velozes". E passou os seus últimos dias de vida tranquilamente em Lu, um ancião que havia desistido. Uma manhã, Confúcio sentiu a morte aproximar-se. Foi para o pátio e disse: "Chegou a hora da minha morte. Não se perfila nenhum governante sábio, e ninguém no império quer fazer de mim o seu mestre." Deitou-se e morreu após oito dias, aos setenta e três anos de idade, decorria o ano de 479 a.C., para os ocidentais é claro. Enquanto nós, ocidentais, estamos no ano 2020, em 25 de janeiro deste ano os chineses entraram no ano 4718 do seu calendário, o ano do rato. Os chineses seguiram uma outra astronomia. Ora, se ele morreu há 2.499 anos, logo, no calendário chinês, morreu decorria o ano 2219.

Confúcio sabe que os sábios nem sempre se conseguem impor no mundo. O relacionamento com os seres humanos é vital para Confúcio. O nobre não despreza o seu próximo, e os amigos devem ser leais. Dar-se-ão conselhos leais e levar-se-ão as coisas a bom termo. Do nosso relacionamento só nós próprios somos responsáveis. Falsas são as palavras lisonjeiras, as expressões obsequiosas, a cortesia exagerada. Os amigos são dignos de confiança, mas cuidado com os falsos amigos. O comportamento correto para com os pais é servi-los em vida, oferecer-lhes sossego quando anciãos, e sepultá-los condignamente. O filho encobre as faltas do pai, mas no erro deve adverti-lo com deferência. 

Sem educação: a sinceridade converte-se em grosseria; a valentia em desobediência; a firmeza em capricho; a humanidade em em estupidez; a sabedoria em confusão; a verdade em ruína. O sentido de toda a aprendizagem é a praxis e a modelação interior: "Se alguém conseguir recitar de cor todas as trezentas peças do Livro das Odes e não as compreender, e, sendo encarregado pelo governo, não conseguir cumprir as suas funções ou responder com autonomia, no caso de ser enviado como embaixador ao estrangeiro, para que servirá toda a erudição de uma tal pessoa? AS trezentas peças do Livro das Odes estão sintetizadas numa frase: não nutrir quaisquer maus pensamentos."

Face à autoridade, se o funcionário não puder servir de acordo com a rectidão, deve demitir-se. Se o país se encontrar no caminho certo, poderá ser ousado no comentário. Mas se não, então deverá ser cauteloso nas suas palavras. Um governo justo deverá cuidar do sustento suficiente, da segurança suficiente, e da confiança do povo. Em estado de necessidade, nunca poderá prescindir da confiança, ainda que alivie as outras duas. Se o povo não tiver confiança no governo, então este não tem qualquer hipótese. É claro que, no início, existe o estado de graça para que a confiança seja levada a um crescimento espontâneo, com o povo a tornar-se mais próspero e mais educado. A confiança não se pode adquirir de início sem nutrir e defender o povo.

Na juventude, quando as forças vitais ainda não estão consolidadas, devemos ser temperados na fornicação; na idade adulta, quando as forças vitais se encontram em pleno vigor, devemo-nos acautelar com a mania das discussões; e na velhice, quando as forças definham, devemos livrar-nos da avareza. As más acções retribuem-se com justiça, e as boas acções retribuem-se com boas acções.

Desde sempre que as pessoas sabem que têm de morrer: “Morte e vida estão determinadas” – tais frases enunciam o desprendimento de Confúcio face à morte. “Morrer ao anoitecer não é mau”. As coisas últimas nunca se tornaram num tema principal para Confúcio. Ele tem pudor em falar dos limites. Os seus discípulos dizem que o Mestre raramente fala da felicidade, do destino, do puro bem. Quando tinha de falar da morte, da natureza e da ordem do mundo, dava respostas que ficavam em aberto. Confúcio partilhava das ideias religiosas tradicionais. Mas não possuía qualquer experiência religiosa primordial, não conhecia nenhuma revelação, não realizava nenhuma reencarnação do seu ser, em suma, não era um místico. A sua paixão era a ordem do mundo e a verdade. 

Mas as suas doutrinas não interessaram ao povo. Confúcio seria incapaz de uma administração racional e de um trabalho prático. Levaria o Estado à ruína com as suas pomposas celebrações funerárias, como quando desempenhou funções públicas. Tal como o Cristianismo e o Budismo, o Confucionismo foi-se distanciando das origens. Apenas em períodos de refluxo o Confucionismo voltava de novo.

Todos os grandes impulsos têm os seus perigos inerentes. O facto de ao longo dos séculos terem predominado os desvirtuamentos não significa que tal poderia ser evitado desde logo na origem. Os seus opositores dizem que o seu pensamento é reaccionário absolutizando o passado, um pensamento sem futuro. Ele terá situado no passado o ideal do seu povo.

Ele não duvidava da existência de espíritos ou de augúrios. O culto dos antepassados e o sacrifício em honra deles, eram para ele uma realidade fundamental. Mas mantinha uma distância singular em relação à superstição: “O Mestre nunca falou de poderes mágicos e de demónios antinaturais”. 

Confúcio nunca pretendeu possuir um saber acabado, nem sequer considerou que tal fosse possível. A insanidade do mundo é evidente para Confúcio. Lamenta que o homem tenha sido um fracasso. Que não tenha estado disponível para corrigir as suas imperfeições. Olhando à sua volta, buscando um homem que pudesse ser um governante, não encontra nenhum.

Há várias razões para Confúcio estar preocupado. Este novo vírus veio provocar danos na reputação mundial que a China vinha granjeando nos últimos anos. Enquanto a sua ascensão te estado imparável, os EUA continuam a dar tiros nos pés a caminho do declínio com o América First de Donald Trump. A pandemia está a ter sérias consequências económicas. Na China, a taxa de desemprego já está perto dos 20%.

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