terça-feira, 22 de setembro de 2020

Risco Moral


Em Economia, o Risco Moral ocorre quando uma entidade tem um incentivo para aumentar a sua exposição ao risco porque não acarreta com a totalidade dos custos correspondentes a esse risco.

O que se passa em Portugal – no que diz respeito a estratégias face à pandemia covid-19, e de uma forma semelhante nos países do Sul da Europa, que contrasta com os países do Norte da Europa, de que a Suécia é o exemplo máximo – é que os jovens enfrentam um Risco Moral na pandemia, porque os custos da pandemia são na sua maior parte suportados pelos mais velhos. E os mais velhos estão também numa situação de Risco Moral ao estarem dispostos a sacrificar os mais jovens com as medidas de restrição da sua liberdade, o que ao longo prazo pode comprometer o seu futuro, numa altura em que os mais velhos já cá não estão.

E é nesse sentido que Daniel Oliveira diz na sua crónica de hoje (22/09/2020) –
https://expresso.pt/opiniao/2020-09-22-Obrigado-aos-jovens

– Que devemos, mais do que tudo, os mais velhos, sentirmo-nos gratos pela disponibilidade manifestada pela grande maioria dos jovens para nos proteger, colocando-a em destaque, em paralelo com a dos outros heróis da pandemia.

O Risco Moral dos jovens tem sido muito divulgado nos media, quando são muito criticados por estarem a colocar em risco os mais velhos com as suas “festas ilegais” e como tal, parecem valorizar mais a diversão do que a saúde dos pais e avós. Defeitos de caráter… Assim são os jovens desde o princípio do mundo.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a nível mundial, a letalidade do COVID-19 (a percentagem de infetados que acabam por falecer) encontra-se para as idades nos intervalos entre os 10-19 e os 20-29 anos nos 0,2%. Entre os 60-69, a percentagem é de 3,6% (18 vezes maior) e a partir daí aumenta bastante até aos 14,8% (para os infetados com mais de 80 anos). Em Portugal os dados são semelhantes.

Assim se interrogou Daniel Oliveira em outra ocasião: “é justo sacrificar o futuro de uma geração, que corresponde à dos jovens, para que a geração dos mais velhos continue a desfrutar de uma vida com mais anos?” A pergunta – feita em linha com a mentalidade da gente da Suécia, que aos olhos da gente de Portugal, e de um modo geral da gente do Sul – parece ter implícita a aceitação de podermos descartar sem remorso pessoas que já viveram mais do que o tempo que seria expectável na ordem natural das coisas.

Ora, Daniel Oliveira faz questão de salientar que tem dado provas de estar a léguas desse tipo de raciocínio: “Esse é, aliás, um dos meus maiores choques culturais com o pragmatismo demolidor do norte da Europa. Mas se a pergunta tem, como têm todas as que lidam com a vida e com a morte para lá da comoção, qualquer coisa de insensível, não a fazer não terá menos”.

O que Daniel Oliveira faz é o papel do cientista imparcial à luz do que já se conhece acerca da sobrevivência da espécie. É o sacrifício milenar pela preservação e superação das nossas capacidades em prol das gerações que nos seguem. Só um egoísmo, que seria suicida para a espécie, nos poderia levar a abandonar esta quase instintiva pulsão.
««O dever moral que temos é, antes de tudo, o de não lhes mentir, levando-os a acreditar que fazem este sacrifício por eles e não por nós. Seria desonesto e sinal de ingratidão. E só lhes podemos pedir o indispensável para garantir a segurança dos mais velhos, mostrando-nos disponíveis para corrermos alguns riscos em nome do seu futuro. Uma sociedade que não se sacrifica pelos velhos é falha de empatia. Uma sociedade que não se sacrifica pelos novos está condenada. Isto não tem dois lados da barricada e não há nada tão inútil e repetitivamente e passageiro como guerras de gerações. Desde que não nos esqueçamos de uma coisa: é por nós, não por eles, que lhes pedimos sacrifícios. Temos de lhes agradecer e dar o nosso melhor para os compensar pelo esforço.»» 

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