terça-feira, 29 de outubro de 2024
Avanços e percalços da História – Finale com brio opus nº 3
A possibilidade de uma convulsão social, marcada por conflitos entre identidades culturais e étnicas, é uma preocupação crescente em várias partes do mundo, especialmente em sociedades ocidentais onde a polarização parece estar a intensificar-se. A combinação de descontentamento económico, tensões raciais e culturais, e a fragmentação da coesão social pode, de facto, criar um terreno fértil para conflitos abertos. A ascensão de movimentos identitários reflete um desejo de proteção e valorização de identidades específicas, mas também pode levar a reações hostis por parte de outros grupos que se sentem ameaçados. Isso cria um círculo vicioso onde a retórica de "nós contra eles" se torna predominante, alimentando uma atmosfera de desconfiança e hostilidade.
Além disso: por um lado a deriva dos órgãos de comunicação para a espectacularização por causa das audiências, por causa da rendibilidade; a radicalização e a desinformação, exacerbadas pelas redes sociais, por outro lado – podem intensificar esses conflitos, criando "câmaras de ressonância" onde as visões extremas são reforçadas, tornando o diálogo construtivo ainda mais difícil. O que poderia ser um debate saudável sobre diversidade e inclusão pode rapidamente transformar-se em batalhas de palavras e, potencialmente, em ações violentas.
Embora a metáfora de uma "guerra civil" possa parecer exagerada, o que está em jogo são as narrativas em disputa sobre a identidade, a cidadania e o futuro das sociedades. Os riscos de violência ou de desestabilização social são reais, especialmente em um contexto onde as instituições políticas e sociais já estão sob pressão. A história nos mostra que conflitos sociais não são inevitáveis, mas também nos alerta sobre a fragilidade da paz social em tempos de mudança rápida que gera inevitavelmente descontentamento. Portanto, a necessidade de diálogo e compreensão mútua, mesmo em meio a diferenças profundas, é mais crucial do que nunca para evitar que essa tensão escale para conflitos mais graves.
Até agora o establishment político-mediático não quis acreditar, ou não quis ver, o que agora está a entrar peles seus olhos dentro. O establishment político e mediático frequentemente se mostrou relutante em reconhecer ou abordar as tensões sociais emergentes e a crescente polarização. Essa hesitação pode ser atribuída a várias razões, incluindo uma visão otimista ou idealista da sociedade, um apego a narrativas consolidadas e a crença de que as forças progressistas prevaleceriam sem a necessidade de uma reavaliação profunda das realidades culturais e sociais.
Muitos no establishment, tanto na política como nos Média, podem ter subestimado as preocupações legítimas de uma parte significativa da população que se sente deixada de lado, ignorada ou até ameaçada por políticas e discursos considerados progressistas ou globalistas. Em vez de abordar esses sentimentos de forma aberta e construtiva, muitas vezes a resposta tem sido a rotulação ou a desqualificação dos que expressam tais preocupações, o que pode ter contribuído para a crescente alienação e ressentimento. Além disso, a dinâmica das redes sociais e a rápida disseminação de informações tornaram mais difícil para os políticos controlarem o discurso público. Em vez de discutir os problemas de forma abrangente, o foco muitas vezes se voltou para narrativas polarizadoras que geram trincheiras, mas que não necessariamente refletem a complexidade das questões em jogo.
Essa desconexão entre o establishment e as experiências vividas de muitas pessoas alimenta uma crise de confiança nas instituições. À medida que as tensões sociais se intensificam, a necessidade de uma abordagem mais empática e consciente por parte das elites políticas e mediáticas se torna essencial para restaurar o diálogo e a coesão social. Ignorar ou minimizar essas realidades só tende a exacerbar a situação, potencialmente conduzindo a consequências mais graves.
E quando assim é, é sempre tarde demais para repor o status quo tal como costumava ser o desejo dos que cá estão, conforme epigrafado numa velha metáfora: “Para cá do Marão sobrevivem os que cá estão”. Pode ser tarde demais para restaurar o status quo anterior. Uma vez que as fissuras na sociedade se tornam profundas e as divisões ideológicas se acentuam, a capacidade de voltar à normalidade ou de implementar reformas significativas é significativamente comprometida. Essa dificuldade em retornar ao estado anterior pode ser atribuída a vários fatores, entre os quais avulta a Desconfiança. A desconfiança nas instituições tende a aumentar, dificultando a aceitação de soluções propostas por aqueles que antes eram vistos como legítimos representantes da sociedade.
Com o aumento da polarização, as partes em conflito podem tornar-se mais radicais em suas posições, tornando o diálogo e a negociação quase impossíveis. A sociedade fica cada vez mais fragmentada, com grupos identificando-se mais intensamente com suas próprias comunidades, em vez de buscar um entendimento comum. À medida que as crises se aprofundam, as demandas da população ficam mais urgentes e radicais, buscando transformações que vão além das soluções que os líderes de opinião consideram viáveis. A insistência em soluções que funcionavam no passado pode não ser suficiente para lidar com as novas realidades sociais e económicas. O que era aceitável antes pode não ser mais viável no contexto atual.
Esses fatores criam um ambiente em que as tentativas de restaurar o status quo são frequentemente recebidas com ceticismo e resistência, levando a um círculo vicioso de frustração e conflito. Assim, a capacidade do poder instituído e das instituições sociais de se adaptarem e responderem às realidades emergentes é crucial. Se não houver uma disposição para ouvir e comprometer a população, a distância entre elite e cidadãos continuará a crescer, dificultando ainda mais a recuperação de uma ordem social estável.
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