sábado, 12 de outubro de 2024

Cenário de pesadelo no Sudão





É uma das guerras esquecidas, o conflito armado que decorre no Sudão desde abril de 2023. Uma guerra entre dois generais que já causou milhares de mortos e milhões de deslocados e refugiados. A Fundação AIS tem procurado auxiliar a Igreja do Sudão do Sul, o país vizinho que tenta acolher, como pode, as pessoas que atravessam a fronteira em desespero fugindo da guerra e da fome. Dramaticamente para estas populações, uma das guerras esquecidas no mundo. Trata-se de um conflito entre o exército do general Abdel Fattah al-Burhane e as forças paramilitares de Suporte Rápido (RSF), sob o comando do general Mohamed Hamdane Daglo. No entanto, contrariando o silêncio do mundo sobre esta guerra, o Papa Francisco tem procurado alertar para a situação devastadora que se vive na região.

A guerra está a provocar uma crise humanitária sem precedentes, obrigando milhares de pessoas a fugir. Estas famílias, despojadas de tudo, procuram agora refúgio e esperança no Sudão do Sul, país onde falta quase tudo. E é aqui que a Igreja e a Fundação AIS entram em ação. O Sudão, oficialmente República do Sudão, é um país africano, limitado a norte pelo Egito, a leste pelo Mar Vermelho, por onde faz fronteira com a Arábia Saudita, pela Eritreia e pela Etiópia, a sul pelo Sudão do Sul e a Oeste pela República Centro-Africana, Chade e Líbia. O Rio Nilo divide o país em duas metades. Quase um quinto da população do Sudão vive abaixo da linha internacional de pobreza, vivendo com menos de US$ 1,25 por dia. Até 2011, o Sudão era o maior país islâmico da África, quando o Sudão do Sul, predominantemente cristão, se separou num país independente após referendo. O Sudão é hoje o terceiro maior país da África (após a Argélia e a República Democrática do Congo) e também o terceiro maior país islâmico depois da Argélia e da Arábia Saudita.

Cartum, o centro político, cultural e comercial da nação, é a capital. O Sudão é uma República federal presidencial democrática e representativa; e as políticas do Sudão são reguladas pela Assembleia Nacional, sendo que o sistema legal sudanês é baseado na lei islâmica. Grande parte da história do Sudão é marcada por conflitos étnicos e duas guerras civis, entre 1955 e 1972 e 1983 e 2005. Existem inúmeros casos de limpeza étnica e escravidão no país. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), de 0,510 (dados de 2019), o classifica como um dos mais baixos níveis de desenvolvimento humano no mundo. E o seu Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade (IDHAD) (dados referentes ao ano de 2019) é de 0,333.

Como grande parte dos países desta região do globo, a história do Sudão é muito rica. O Reino de Cuxe foi um Estado antigo da Núbia centrado nas afluências do Nilo Azul, Nilo Branco e Rio Atbara. Surgiu após o colapso da Idade do Bronze e a desintegração do Império Novo do Egito Antigo. Inicialmente centrado em Napata, quando o rei Cáchita ("o cuxita") invadiu o Egito no século VIII a.C., um rei faraó da vigésima quinta dinastia do Egito. Um século depois os cuxitas foram derrotados e expulsos pelos assírios no tempo do rei Sargão II.



Reino de Cuxe - 700 a.C.

A guerra que ocorreu entre o rei Taraca e o rei assírio Senaqueribe foi um acontecimento decisivo. 
O sucessor de Senaqueribe, Assaradão, foi mais longe e invadiu o próprio Egito, depondo Taraca e liderando os núbios do Egito. O Egito tornou-se uma colónia assíria. Tantamani fez uma tentativa final para recuperar a soberania do Egito. Entretanto Assaradão morria enquanto se preparava para deixar a capital assíria de Nínive, a fim de expulsá-lo. No entanto, seu sucessor, Assurbanípal, enviou um grande exército para o sul do Egito terminando com todas as esperanças de um renascimento do império núbio.




Durante a Antiguidade Clássica, a capital núbia foi em Méroe. Na geografia grega antiga esse reino foi conhecido como "Etiópia" (termo também usado anteriormente pelos assírios quando se depararam com os núbios). A civilização de Cuxe foi uma das primeiras no mundo a usar a tecnologia de fundição de ferro. O reino núbio em Méroe persistiu até ao século IV. Com o colapso do império cuxita, vários Estados surgiram em seus antigos territórios, entre eles a Núbia. Apresentando vestígios de ocupação humana datados em cerca de 7000 a.C., os núbios inicialmente eram caçadores recoletores. Com o assentamento e posterior criação de ovelhas, cabras e bois, por volta de 4000 a.C. surge o Reino de Cuxe, que existiu entre o III milênio a.C. e o século IV d.C. Este reino foi então dominado pelo Reino de Axum. Na época do Egito faraónico, a Núbia era uma região que separava o Egito da África subsaariana. Atualmente, esse território está dividido entre o Egito e o Sudão.

Habitada por povos negros, a Núbia constituiu ao longo de milénios um ponto de encontro entre as civilizações egípcias - e, por conseguinte, o mundo mediterrâneo - e os povos negros da África. Cercada, porém, pelo deserto, num trecho mais estreito do vale, jamais apresentou produção agrícola e população comparáveis às do baixo Nilo. Por volta de 3.100 a.C., a I dinastia se apoderou de parte da Núbia, que passou a abastecer o império de ouro, pedras preciosas e diorito. A partir de então, a história da Núbia permaneceu ligada à do Egito, algumas vezes sob o poder dos faraós, outras na forma de um ou vários reinos independentes. Durante nove séculos, a Núbia permaneceu isolada até que, no século IV da era cristã, após a destruição de Meroé, os nabateus se estabeleceram na região e, por volta do ano 540, se converteram ao cristianismo. Embora a partir do século VII o país tenha sido obrigado a pagar tributo aos novos governantes muçulmanos do Egito, permaneceu independente e fiel ao cristianismo até ao século XIV, quando sucumbiu ante os exércitos mamelucos.

Durante seis séculos o Egito Muçulmano e a Núbia cristã viveram em uma espécie de harmonia, apesar dos ocasionais ataques de pequena escala e represálias, essa harmonia criada em um acordo silencioso era respeitada por causa do comércio que circulava entre os reinos, criando assim uma relação de boa vizinhança. Mas esse período de paz durou pouco pois em meados do século XIII, o Egito dos mamelucos com um tratado com Xacanda investiram em uma abordagem que reduziu o Reino da Núbia para condições de reino vassalo. "Os núbios que não se decidissem a abraçar o Islão, deveriam pagar um imposto anual per capita (a jizia).

No século XIV, as pressões do mundo islâmico aumentaram e, eventualmente, a Núbia foi gradualmente absorvida pelo Islão, marcando uma mudança significativa na composição religiosa e cultural da região. Dulcert refere-se ao Sudão na sua famosa carta náutica de 1339, conhecida como "Carta Pisana". Neste documento, ele menciona as terras costeiras da África Oriental, descrevendo a região que inclui partes do que é hoje o Sudão. Esta carta é valiosa não só pelo seu conteúdo geográfico, mas também por oferecer insights sobre as percepções europeias da África e do mundo islâmico na época medieval. A figura lendária conhecida como Preste João foi uma mistura de mito e realidade na Europa medieval. Era frequentemente associado a um rei cristão poderoso e rico na África ou na Ásia, supostamente combatendo contra o Islão. No contexto da Núbia e do Sudão, algumas interpretações identificam os reis cristãos da Núbia, especialmente durante os períodos em que resistiam à expansão islâmica, como possíveis inspirações para a lenda do Preste João. Historicamente, os reis da Núbia cristã (como os do Reino de Makúria) enfrentaram pressões significativas do mundo islâmico ao longo dos séculos, especialmente a partir do século VII em diante. Suas lutas para manter sua identidade cristã em face dessas pressões contribuíram para a percepção de resistência contra o Islão, o que poderia ter sido interpretado e amplificado na Europa medieval através das lendas do Preste João.

O mito da riqueza da Núbia está ligado principalmente à sua fama histórica como uma região rica em recursos naturais, especialmente ouro. Desde os tempos dos faraós do Egito Antigo, a Núbia era conhecida como uma importante fonte de ouro. Os egípcios realizaram expedições frequentes para extrair ouro das minas núbias, que eram vitais para a economia e a riqueza do Antigo Egito. Essa reputação de abundância de ouro na Núbia persistiu ao longo dos séculos e contribuiu para a percepção europeia durante a Idade Média de que a região poderia ser incrivelmente rica. O mito do Preste João, por exemplo, frequentemente associava o reino desse suposto monarca cristão com a abundância de ouro e outras riquezas exóticas. Embora baseado em lendas e interpretações, esse mito reflete a percepção histórica da Núbia como uma terra de recursos valiosos, especialmente ouro.

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