domingo, 28 de julho de 2024

Populismo


Populismo é um termo que se refere a um estilo de política que visa mobilizar as massas e apelar diretamente aos interesses e sentimentos do "povo" contra uma elite percebida. Este conceito pode ser aplicado a uma variedade de contextos e ideologias políticas, tanto de esquerda quanto de direita. O populismo de direita enfatiza o nacionalismo, a identidade cultural e a segurança, em que Donald Trump ou Marine Le Pen são exemplos atuais. O populismo de esquerda foca em questões de justiça social, desigualdade económica e distribuição de riqueza exemplificado pela Venezuela de Nicolás Maduro.

Os líderes populistas geralmente se apresentam como defensores do povo comum, em contraste com uma elite corrupta e distante. O "povo" é frequentemente retratado como homogéneo e virtuoso. O alvo da crítica é a elite política, económica ou intelectual, acusada de ser responsável pelos problemas do país e de estar desconectada das necessidades e desejos do povo.

O populismo frequentemente se centra em torno de um líder carismático que é visto como a personificação dos interesses do povo e que promete resolver os problemas do país de maneira direta e eficaz. A comunicação populista tende a ser simplificada e direta, utilizando uma linguagem acessível e emocional para conectar-se com as massas. Populistas costumam acentuar a divisão entre o povo e a elite, criando uma narrativa de "nós contra eles" que polariza a sociedade. O populismo pode levar ao autoritarismo, já que líderes populistas frequentemente tentam concentrar poder em suas próprias mãos e enfraquecer os mecanismos de controlo e equilíbrio.




As eleições de hoje na Venezuela, 28 de julho de 2024, estão a destacar-se das anteriores pelo tom agressivo adotado recentemente pelo Presidente chavista. “Na semana passada, ouviam-se muitas propagandas na rádio, em que o tom dele era muito conciliador. Dizia que amava o seu país, o seu povo, que daria a vida por ele. Agora, nos últimos dias, realmente mudou”. Durante um comício, o chefe de Estado venezuelano avisou que se a população quiser evitar que “a Venezuela caia num banho de sangue, numa guerra civil fratricida, produto dos fascistas”, terá de garantir-lhe “a maior vitória da história eleitoral” do país. Maduro sucedeu a Hugo Chávez, de quem era vice-presidente, após a morte deste último, em 2013. Chávez governava desde 1999. “Já não gera o receio que gerava há uns anos. Algumas pessoas podem ficar coagidas por essas declarações, mas penso que estão tão fartas do regime que se perpetua já por mais de 25 anos, que não estão a ligar demasiado a estas ameaças”, afirma Andreina Pereira, a respeito das proclamações de Maduro.

Não é possível entender o populismo sem entender a soberania popular. Ou seja, a história do populismo está intimamente ligada à história da soberania popular e à ideia de que a soberania pertence ao povo. Mas também não se pode esquecer que é de onde provém a desordem e o caos nas revoluções, a partir de baixo. Por isso, é à elite que está reservado o papel do demagogo, que tem como papel controlar a turba a partir de cima.

Na Grécia Antiga o Demagogo, como guia do povo, era visto como perigoso para o “bom governo” e para os interesses das elites, sempre receosas da instabilidade das massas. Elas tinham de ser controladas a partir “de cima” e não manipuladas “por baixo”. A crítica aos demagogos era uma crítica aristocrática.

A democracia do pós-guerra, por causa da experiência totalitária, é uma democracia especial. É aquilo que se chama de “democracia constrangida”, com os poderes separados, com pesos e contrapesos, em que os tribunais escapam ao controlo popular. E é uma democracia que modera a excessiva soberania popular quando esta tem a ideia de governos populares. São democracias controladas por elites.

Os populistas são gente das elites enraizadas nos lugares em sintonia com o povo, que se opõem às atuais elites desenraizadas que são os agentes da globalização. A tendência de fundo dos populismos é a de sempre falar em nome do povo soberano. Em Portugal existe uma crise de confiança nas instituições – no parlamento e nos partidos políticos. Existe muito a ideia de que a democracia portuguesa é, sobretudo, um feudo de partidos – partidos-carteis que colonizam o Estado e a administração pública. No fundo, a ideia de que a partidocracia serve “os de cima” contra os interesses dos “de baixo”. E depois há casos sem fim de promiscuidade do mundo político e do mundo financeiro, e os casos de corrupção que envolvem políticos e até altas figuras do Estado. Episódios que só minam a confiança das pessoas nas elites que nos governam.

Mas para além das razões que alimentam os populismos de protesto existem os populismos identitários de defesa do povo numa vertente mais histórico-cultural e étnica. Essas razões estão ligadas às mudanças demográficas no país, com a adoção do multiculturalismo como modelo de sociedade, com o aumento quer de populações de origem imigrante quer de novos imigrantes, assim como mudanças profundas da lei da nacionalidade e o aumento exponencial do número de novos portugueses. Portugal tem longas filas de espera nos serviços de registo e notariado incapazes de gerir tantos pedidos de nacionalização. Sem surpresa, Portugal subiu ao topo dos países europeus que mais concedem a nacionalidade por naturalização.

Numa nação as comunidades são de cultura. Existe uma dimensão cultural, emocional, ontológica até, e mais ampla e profunda do que um simples papel. Essa dimensão tem a ver com a ligação passado-presente-futuro, com a transmissão geracional, com a memória coletiva e tradições. Enfim, com a ideia e o sentimento de que fazemos parte de uma corrente.

Ora, a consequência maior da liberalização acentuada da nossa lei da nacionalidade é esta: Portugal está a ir demasiado na direção legal (a ligação à nação apenas através de um documento) e a afastar-se demasiado da direção cultural. Seremos ingénuos se pensarmos que esta viragem, a médio e a longo prazo, não tem potenciais consequências negativas para a coesão social, comunitária e nacional. Sobretudo nos últimos anos, tem havido um claro desleixo e leviandade na abordagem deste tema por parte dos nossos dirigentes políticos. Repare-se como Portugal, ao contrário de outros países europeus, nem sequer testes de cidadania tem. A ligação efetiva à comunidade nacional tem sido cada vez mais descurada.

A menos que partamos do princípio de que Portugal é uma terra mágica imune a problemas que outros países europeus sentem, em termos de convivência entre diferentes populações dentro do seu território, teremos que admitir a possibilidade no futuro, numa sociedade cada vez mais tribalizada entre diferentes comunidades, com as suas identidades e reivindicações, do crescimento de populismos identitários de defesa do povo português como entidade física e enraizada. Não há em Portugal um debate sobre este assunto. Nos meios urbanos, políticos e mediáticos, os custos de se falar em assuntos desconfortáveis excedem os benefícios – e a maior parte das pessoas quer ter uma vida quieta. A maior parte das pessoas não quer ter uma vida de inquietações. Mas mais cedo ou mais tarde, a realidade impõe-se ao desconforto de se falar nela.

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