quarta-feira, 15 de julho de 2020

A Letter on Justice and Open Debate

https://harpers.org/a-letter-on-justice-and-open-debate/

https://en.wikipedia.org/wiki/A_Letter_on_Justice_and_Open_Debate

Trata-se de uma carta assinada por 153 intelectuais e académicos, e publicada numa das mais antigas revistas dos Estados Unidos - Harper’s Magazine. Entre os subscritores encontram-se figuras que vão da extrema-esquerda intelectual, como Noam Chomsky a liberais centristas como Anne Apllebaum ou Fareed Zakaria, cientistas políticos como Ian Buruma, Francis Fukuyama ou Yascha Mounk, activistas como Garry Kasparov, escritores com Margaret Atwood, Salman Rushdie,  J.K. Rowling ou académicos como Steven Pinker. A maior parte situa-se bem mais à esquerda do que à direita, mas a razão do seu sobressalto é relativa à onda que varre os Estados Unidos e que não tem apenas derrubado estátuas, tem também criado um clima de intimidação em muitas redações e universidades.

Tradução livre:

Uma Carta sobre Justiça e Debate Aberto
7 de julho de 2020

As nossas instituições culturais estão a enfrentar um momento de julgamento. Protestos poderosos pela justiça racial e social estão a pedir com atraso a reforma policial, juntamente com apelos mais amplos por maior igualdade e inclusão em toda a nossa sociedade, especialmente no ensino superior, jornalismo, filantropia e artes. Mas esse acerto de contas necessário também intensificou um novo conjunto de atitudes morais e compromissos políticos que tendem a enfraquecer as nossas normas de debate aberto e tolerância das diferenças, a favor da conformidade ideológica. À medida que aplaudimos o primeiro desenvolvimento, também levantamos as nossas vozes contra o segundo. As forças iliberais estão a ganhar força em todo o mundo e têm um poderoso aliado em Donald Trump, que representa uma ameaça real à democracia. Mas a resistência não deve ser utilizada em proveito de uma qualquer ideologia dogmática coerciva, que os demagogos de direita, por sua vez, já estão inteligentemente a explorar. A inclusão democrática que queremos só pode ser alcançada se falarmos contra o clima intolerante que se estabeleceu em todos os lados.

A livre troca de informações e ideias, a força vital de uma sociedade liberal e democrática, está a cada dia que passa a tornar-se asfixiada. Embora não seja coisa que não estivéssemos à espera da direita radical, a verdade é que se está a espalhar por todo o lado duma forma mais ampla a que a nossa cultura não estava habituada: uma intolerância a visões opostas, uma tendência para a vergonha pública e o ostracismo, e a dissolução de questões políticas complexas por uma certeza moral ofuscante. Defendemos o valor do contra-discurso robusto e até cáustico de todos os quadrantes. Mas agora é muito comum ouvir pedidos de desculpa, de uma forma ligeira, mas severa, por ofensas percebidas ao nível da linguagem e pensamento. Mais preocupantes ainda, os líderes institucionais, num espírito de controlo de danos, em pânico, estão a punir de forma desproporcionada em vez de acções de ordem pedagógica. Editores são demitidos por editar peças controversas; livros são retirados por suposta inautenticidade; jornalistas são impedidos de escrever sobre certos tópicos; professores são investigados por citar obras de literatura em sala de aula; um pesquisador é demitido por circular um estudo académico revisto por pares; e os chefes das organizações são expulsos por muitas vezes cometerem apenas erros de forma. Quaisquer que sejam os argumentos em torno de cada incidente em particular, o resultado tem sido estreitar constantemente os limites do que pode ser dito sem a ameaça de represálias. Já se está a pagar o preço por aqueles que não estão para arriscar o seu sustento e da família, acobardando-se com medo de afastarem do consenso, ou mesmo receio de não terem o zelo suficiente de agradar ao mainstream.

Esta atmosfera sufocante acabará por prejudicar as causas mais vitais do nosso tempo. A restrição do debate, seja por um governo repressivo ou por uma sociedade intolerante, invariavelmente fere aqueles que não têm poder e tornam todos menos capazes de participação democrática. A maneira de derrotar más ideias é por exposição, argumento e persuasão, não tentando silenciá-las ou rejeitá-las. Recusamos qualquer falsa escolha entre justiça e liberdade, que não pode existir uma sem a outra. Como escritores, precisamos de uma cultura que nos dê espaço para a liberdade de expressão, mesmo correndo o risco de dizer asneiras. Precisamos preservar a possibilidade de discordância de boa-fé sem consequências profissionais terríveis. Se não formos nós a defender aquilo de que o nosso trabalho depende, não será de esperar que seja o público ou o Estado a fazê-lo por nós. 

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