quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Esperança de vida


A Esperança de Vida à Nascença – é um indicador que, segundo os dados mais recentes do INE, se fixou nos 80,93 anos no período de 2017 a 2019. E a Esperança de Vida aos 65 anos - é o número médio de anos que uma pessoa ainda tem para viver ao fazer 65 anos. Entre 2017 e 2019 estava fixada nos 19,61 anos.

No número de mortes de 2020, em Portugal, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), há mais 12.220 do que a média dos cinco anos imediatamente anteriores. Do total de óbitos de 2020, 71,8% foram de cidadãos com 75 anos ou mais, sendo que quase 60% tinham 85 anos ou mais. Em relação à média de 2015-2019, morreram mais 10.206 pessoas com 75 anos ou mais, das quais 8.032 tinham 85 anos ou mais. A esperança de vida aos 65 anos vai diminuir já em 2020, e a pandemia pode marcar uma inversão da tendência crescente deste indicador que estávamos habituados a ver aumentar consecutivamente há vários anos. A esperança de vida aos 65 anos pode descer já no triénio 2018-2020. A tendência de aumento da esperança de vida que existia no passado, e que já era dada quase como certa, poderá não vir a acontecer, fruto da mortalidade extremamente acentuada nas idades superiores. Já a descida da esperança de vida aos 65 anos é certa. A Covid-19 vai inverter esta realidade, tanto no triénio 2018-2020 como no seguinte 2019-2021. Os peritos ainda não quantificam as quedas.

Até ao aparecimento deste coronavírus e desatar a matar gente como já não se via há muito tempo, tirando casos pontuais de tragédias regionais, as pessoas recusavam falar na morte, talvez para se defenderem da angústia niilista. As pessoas não gostavam de dizer, e ainda não gostam: morreu; preferem dizer partiu ou faleceu. Dizem que é para serem elegantes, bem-educadas; ou então fogem para a frente com gracinhas de gíria popular como: bateu-a-bota. Mas esta avalanche diária de mortes é impossível que não mude a perspetiva das pessoas perante ela. É um facto que as sociedades atuais tentam cada vez mais prolongar a vida, recorrendo a fórmulas que lhes permitam não envelhecer, ou então tentarem adiar o mais possível para uma bonita idade centenária.

"É preciso aprender a morrer, reaprender a viver, a fim de melhor saber morrer". Palavras de Freud noutros tempos em que se lidava com a morte de outra maneira. A partir do momento em que um risco grave ameaça um membro da família, os familiares querem privá-lo da informação, escondendo o seu verdadeiro estado de saúde. Mas com esta infeção, quando dá sintomas, não há como fugir ao conhecimento da verdade, que é estar infetado e poder morrer. É difícil enganar um velho com Covid, a menos que queira ser enganado, ou nos engane ao simular estar enganado.


Heidegger disse que o ser humano é um ser-para-a-morte. Mantém a angústia a fim de procurar nela a verdade da vida e da morte. Para Heidegger, a angústia é a nossa experiência do Nada, revelando a estrutura fundamental da morte na existência humana; isto é, na antecipação da morte, experiencia-se a existência como finitude. A morte é a estrutura da vida humana, que é ser-para-a-morte. Assim, a angústia, e, por consequência, a própria morte, é o fundamento mais certo da individualidade. Essa inadaptação é o que se chama o ser-para-a-morte: a vida autêntica é a que, a todo o instante, se sabe condenada à morte e se aceita, corajosa e honestamente.

Trata-se de estar "livre para a morte", aceitá-la como um acontecimento de liberdade. É aceitando a morte que aceitamos a vida como ela é, na sua totalidade, e não o contrário. A nossa existência integra a morte desde o início. Sendo a morte inevitável, para que servem as afirmações religiosas de imortalidade senão para mergulhar um pouco mais na angústia o homem que não pode acreditar nessas promessas? Esta questão é colocada por Sartre, discípulo de Heidegger nesta matéria, para quem a morte é um absurdo e algo exterior, um facto que não se diferencia do nascimento.

O facto é que, quem recusa ou não admite a possibilidade de apenas só ter uma vida, de desaparecer, de Ser e Nada, não aguenta a representação da ideia de morte. Estamos perante a relação do homem com o seu próprio corpo e a imagem de uma horrenda degradação, de um desgaste funcional, substituindo o "ser-para-a-vida"

Antero de Quental, poeta para quem a ideia de morte se assumia numa dupla face, pessimista e negativa, mas, também, como aspiração positiva, renovadora e libertadora, suicidou-se. Falar da morte é sempre um desafio ao real, uma tentativa para objetivar o Nada, ou seja, fazê-lo existir pela negaçãoIsto é: só se pode falar da Morte por representações, por sinais e signos que a representam ou que tentam representar a imagem da Morte que os povos foram criando. As culturas são diversas, mas a Morte é igual em toda a parte: uma libertação.

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