sábado, 31 de agosto de 2024

O Médio Oriente no século VI a.C.


A primeira metade do século VI a.C. é um período crucial na história do povo judeu devido ao Cativeiro de Babilónia Esse evento ocorreu em um contexto de grande instabilidade na região do Médio Oriente, durante o qual o Império Babilónico, sob o reinado de Nabucodonosor II, conquistou o reino de Judá. Entre 597 a.C. e 586 a.C., os babilónios sitiaram Jerusalém e, após a conquista definitiva, destruíram o Templo de Salomão e deportaram uma parte significativa da elite judaica para a Babilónia. Esse exílio marcou profundamente a história religiosa e cultural dos judeus, influenciando o desenvolvimento de sua identidade, tradições e escritos religiosos.

Os efeitos do exílio foram amplos e duradouros, afetando desde as práticas religiosas até à formação dos textos que compõem a Bíblia Hebraica. Muitos dos profetas bíblicos, como Ezequiel e Jeremias, viveram e escreveram durante ou em resposta a esse período, abordando temas como a justiça divina, a esperança de retorno e a renovação espiritual do povo de Israel. O cativeiro terminou oficialmente em 539 a.C., quando Ciro, o Grande, da Pérsia, conquistou a Babilónia e permitiu que os judeus voltassem a Judá, embora muitos tenham optado por permanecer na diáspora.

A devastação provocada pelos babilónios no Levante, especialmente a destruição de Jerusalém em 586 a.C., é um dos eventos mais trágicos da história judaica. Este evento é amplamente registado na literatura bíblica, e o Livro das Lamentações é uma obra central que reflete o sofrimento e a dor daquele período.

O Livro das Lamentações é tradicionalmente atribuído ao profeta Jeremias, embora a sua autoria não seja unanimemente aceite. Ele é composto por cinco poemas que expressam a profunda tristeza e desespero do povo judeu após a destruição de Jerusalém e do Templo de Salomão pelos babilónios. Cada capítulo do livro é uma elegia à cidade arruinada, descrevendo com detalhes vívidos a miséria dos habitantes, a desolação do Templo e o sentido de abandono divino.

O tom geral das Lamentações é de luto e penitência, com o autor e o povo reconhecendo que o sofrimento é uma consequência dos pecados de Israel. Há também uma súplica constante por misericórdia e um pedido de restauração, embora o sentimento predominante seja de dor e desolação. Além da sua importância religiosa, as Lamentações também têm valor histórico, pois fornecem uma visão vívida do impacto emocional e espiritual da queda de Jerusalém sobre os sobreviventes, documentando as consequências dessa catástrofe nacional que marcou profundamente a identidade e a memória coletiva do povo judeu.

O profeta Ezequiel havia sido levado para Babilónia. Assim como o rei Joaquim (ou Jeconias). Ambos foram levados para o exílio durante a primeira deportação de judeus para a Babilónia em 597 a.C. Foi aquando da conquista de Jerusalém pela primeira vez por Nabucodonosor II. Joaquim, rei de Judá, foi deposto e levado para o exílio. E Zedequias foi colocado como rei fantoche em seu lugar. Ezequiel, que era sacerdote, foi exilado juntamente com muitos outros membros da elite de Judá e viveu em Tel-Abibe, uma colónia judaica perto do rio Quebar, na Babilónia.

Enquanto estava no exílio, Ezequiel teve as suas visões proféticas, que foram posteriormente registadas no Livro de Ezequiel. Ele profetizou tanto sobre o julgamento que viria sobre Jerusalém e Judá, quanto sobre a futura restauração do povo de Israel. Apesar de estar fisicamente distante de Jerusalém, Ezequiel manteve uma conexão espiritual profunda com a cidade e com o destino de seu povo.

Entretanto no Médio Oriente Ciro, o Grande, se destacava no Médio Oriente ao fundar e expandir o Império Aquemênida, que se tornaria o maior império do mundo até então. Ciro II, conhecido como Ciro, o Grande, começou a reinar como rei dos persas por volta de 559 a.C. Em pouco tempo, ele conquistou vastos territórios, incluindo o Império Medo, o Império Lídio e o Novo Império Babilónio, unificando boa parte do Médio Oriente sob seu domínio. Por volta de 550 a.C., Ciro derrotou Astíages, rei dos medos, consolidando o domínio persa sobre a Média. Essa vitória marcou o início da expansão Aquemênida.

Ciro foi um líder militar brilhante, mas a sua fama também se deve à sua política de tolerância e administração justa dos povos conquistados. Ele é especialmente lembrado por permitir que os judeus exilados na Babilónia retornassem à sua terra natal e reconstruíssem o Templo de Jerusalém, como registado na Bíblia Hebraica. Sob o governo de Ciro, o Império Aquemênida se estendeu desde a Ásia Central até o Mediterrâneo e o Egito, tornando-se o maior império que o mundo havia visto até aquele momento. Seu governo estabeleceu padrões de administração imperial, como o uso de satrapias (províncias) governadas por sátrapas (governadores), que permitiram uma gestão eficiente e a manutenção da ordem em um território vasto e diversificado. Ficou conhecido como um governante sábio e benevolente, cujas políticas de respeito às culturas e religiões dos povos subjugados o tornaram uma figura reverenciada na história antiga. Sua morte ocorreu em 530 a.C., mas seu legado perdurou e foi continuado por seus sucessores, que expandiram ainda mais o Império Aquemênida.

Com a tomada de Babilónia por parte de Ciro dá-se a tal reviravolta na vida dos judeus, como profetizava o Segundo Isaías. 
O Segundo Isaías (capítulos 40-55 do Livro de Isaías) é conhecido por suas profecias de conforto e esperança para os israelitas exilados, anunciando que Deus havia escolhido Ciro como seu instrumento para libertar seu povo. Ciro foi visto como um "ungido" (mashiach, termo que em hebraico significa "messias"), enviado por Deus para trazer a libertação aos judeus. Após a conquista, Ciro emitiu um decreto permitindo que os exilados retornassem a Jerusalém e reconstruíssem o Templo, o que foi um momento decisivo para o povo judeu. Esse retorno marcou o fim do Exílio Babilónico e o início de uma nova era para Israel, onde a restauração de sua identidade e religião foi possível.

Na realidade, os judeus retornados a Jerusalém devem ter sido poucos, a maioria terá ficado em Babilónia. A maioria dos judeus exilados em Babilónia não retornou a Jerusalém após o decreto de Ciro, apesar da permissão para fazê-lo. Diversos fatores contribuíram para isso. Durante os cerca de 50 anos de exílio, muitos judeus se estabeleceram em Babilónia e outras partes do Império Persa, onde conseguiram construir vidas relativamente estáveis, integrando-se nas comunidades locais. Eles formaram negócios, adquiriram propriedades e estabeleceram laços sociais e familiares. Para muitos, abandonar essa estabilidade para enfrentar as incertezas de um retorno a uma terra devastada parecia uma opção menos atraente. E Jerusalém, como toda a região de Judá, estavam em grande parte destruídas e desoladas após décadas de abandono. A cidade precisava ser reconstruída do zero, e a terra ao redor havia sido ocupada por outras populações. A perspectiva de retornar para enfrentar essas condições adversas certamente desmotivou muitos a deixarem Babilónia.

A diáspora judaica já era uma realidade antes do Exílio Babilónico, mas se intensificou com a permanência de muitos judeus na Babilónia. Esse grupo de judeus que escolheu não retornar ao antigo território de Israel ajudou a formar uma importante comunidade judaica na Mesopotâmia, que prosperou por séculos. Embora o Segundo Isaías e outros profetas incentivassem o retorno, muitos judeus começaram a ver Babilónia como seu novo lar, continuando suas práticas religiosas e culturais ali, em vez de retornar à terra ancestral. O conceito de sionismo, ou seja, o retorno à terra de Israel, não era universalmente compartilhado por todos os judeus da época.

De facto, apenas uma pequena fração dos exilados voltou para Jerusalém e Judá. Este grupo, liderado por figuras como Zorobabel e, mais tarde, Esdras e Neemias, foi fundamental para a reconstrução do Templo e o restabelecimento da comunidade judaica em Jerusalém. No entanto, a maioria dos judeus continuou a viver fora da terra de Israel, contribuindo para a formação de uma vibrante e duradoura diáspora judaica. Passados 70 anos, a confusão  era total. 

Setenta anos passados, a confusão 
no meio de filisteus, moabitas, amonitas, edomitas, árabes e fenícios, deve ter sido grande quando regressaram. Quando os judeus exilados voltaram, encontraram uma região drasticamente transformada em termos políticos, sociais e demográficos. Vários fatores contribuíram para essa situação difícil. Durante o exílio babilónico, a região de Judá não ficou desocupada. Outros povos, como filisteus, moabitas, amonitas, edomitas, árabes e fenícios, continuaram a habitar ou migraram para a área. Estes grupos estabeleceram suas próprias comunidades e economias na região, ocupando terras que antes pertenciam aos judeus. O retorno dos exilados criou tensões com essas populações, que viam os recém-chegados como intrusos ou concorrentes. Os retornados precisavam reclamar e reassentar as terras que uma vez foram suas. Contudo, essas terras já estavam sendo utilizadas por outros grupos, o que levou a conflitos territoriais. Os judeus retornados enfrentaram resistência desses grupos que agora consideravam Judá como seu lar.

A Jerusalém que os exilados encontraram estava em ruínas, incluindo o Templo, que era o centro religioso e cultural do povo judeu. A tarefa de reconstruir a cidade e o Templo foi monumental e cercada de dificuldades, tanto material quanto política. A liderança dos judeus retornados, como Zorobabel, Esdras e Neemias, teve que lidar com a falta de recursos e mão de obra, além das constantes ameaças de ataques ou sabotagens por parte de vizinhos hostis. Havia também divisões entre os próprios judeus. Aqueles que permaneceram na terra durante o exílio, muitas vezes chamados de "povo da terra", podem ter desenvolvido práticas religiosas ou sociais diferentes dos exilados que retornaram. Isso gerou conflitos internos, especialmente quando os retornados tentaram impor suas visões sobre a pureza religiosa e as tradições, como a proibição de casamentos com pessoas de outros povos, o que criou atritos dentro da própria comunidade judaica.

Portanto, o retorno não foi uma simples voltar à "normalidade", mas sim um período de complexidade e adaptação. As dificuldades de reintegração e reconstrução foram enormes, mas também ajudaram a moldar a identidade e as práticas religiosas dos judeus naqueles tempos, o que teve um impacto duradouro na história de Israel e do judaísmo. No entanto, lá acabaram por reconstruir o Templo, o Segundo Templo. Apesar dos desafios significativos, os judeus retornados conseguiram reconstruir o Templo de Jerusalém, conhecido como o Segundo Templo. Este processo ocorreu em várias etapas e envolveu a colaboração de várias figuras chave e o apoio de autoridades persas. A reconstrução do Segundo Templo começou em 536 a.C., logo após o decreto de Ciro a permitir o retorno dos exilados. O início da construção do Templo é atribuído a Zorobabel, um líder da tribo de Judá, e a Jesua (ou Josué), o sumo sacerdote. O trabalho começou com a construção do altar e da fundação do Templo.

A reconstrução enfrentou várias interrupções devido a oposições de povos vizinhos, como os samaritanos, e questões políticas. Houve períodos em que o trabalho quase parado fez arrastar a reconstrução por alguns anos. A situação mudou com o apoio dos governantes persas subsequentes. Em 520 a.C., o rei persa Dario I deu apoio renovado à reconstrução, o que acelerou o progresso. Os profetas Ageu e Zacarias também desempenharam papéis importantes em encorajar o povo a continuar o trabalho. A construção do Segundo Templo foi finalmente concluída em 515 a.C., aproximadamente 70 anos após a destruição do Primeiro Templo, conforme relatado no Livro de Esdras. O Segundo Templo era um esboço, em comparação com o Primeiro Templo, mas representou a restauração da adoração a Deus em Jerusalém e teve um papel central na vida religiosa e cultural dos judeus. Como a reconstrução do Templo original havia sido modesta, o rei Herodes, no final do século I a.C., iniciou um grande projeto de expansão e renovação, tornando o Segundo Templo novamente grandioso e imponente.

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