sábado, 31 de agosto de 2024

Primogenitura e o sistema de linhagem agnática



Primogenitura é a tradição comum de herança de toda a riqueza, estado ou função dos pais pelo primeiro filho; ou, na falta de uma criança, por parentes próximos, de forma a manter o status da linhagem familiar. Entre irmãos, o filho de um irmão mais velho falecido tem prioridade sobre um irmão mais novo. Na falta de filhos, o sucessor é o segundo irmão mais velho. Na falta de descendentes do sexo masculino, há variações de primogenitura que entregam a herança a uma filha, ou um outro parente, seguindo uma ordem específica de preferência. Na primogenitura agnática, o grau de parentesco é determinado observando descendência comum do ancestral mais próximo pelos ancestrais do sexo masculino. Pessoas com parentesco de sanguinidade masculina são denominados agnáticos, e têm preferência sobre cognáticos, que têm parentesco exclusivamente pelo lado das mulheres, ou por ambos.

Houve diferentes tipos de sucessão baseados na primogenitura agnática, todos partilhando do princípio de que herança é relativa a antiguidade do nascimento e antiguidade da linhagem entre parentes agnáticos, primeiramente, entre os filhos do monarca ou chefe da casa dinástica, sendo os filhos e seus descendentes masculinos herdeiros antes de irmãos e seus descendentes. Mulheres e descendentes do sexo feminino são excluídas da linhagem sucessória. Nesse tipo de primogenitura, um descendente do sexo feminino pode ascender ao trono somente na ausência de irmãos vivos ou seus descendentes legítimos do sexo masculino. Os filhos varões e seus descendentes todos possuem direito ao trono antes das filhas mulheres e seus descendentes. Filhos mais velhos e seus descendentes possuem preferência com relação a filhos mais novos e seus descendentes. De igual maneira, filhas mais velhas possuem preferência em relação a irmãs mais jovens e seus descendentes.

Para percebermos os ainda preconceitos na relação masculino/feminino temos de remontar à época das antigas linhagens a que os antropólogos chamaram agnáticas. A linhagem agnática refere-se a sistemas sociais e familiares patriarcais em que a descendência e a herança são transmitidas através da linha masculina, que o mesmo é dizer paterna. Essas estruturas muitas vezes estabeleciam normas rígidas sobre os papéis e estatutos dos géneros, reforçando desigualdades que ainda podem influenciar as atitudes contemporâneas. A análise desses sistemas ajuda a compreender como as normas históricas moldaram as relações de género e como essas influências continuam a afetar as perceções e comportamentos atuais. Nessas tradições ancestrais, pelo casamento, era a mulher a abandonar a sua família original para se ir juntar à família do marido. Esse é o perfil de muitos sistemas patriarcais históricos. O casamento era visto como uma transferência de propriedade. 

O sistema de linhagem agnática ainda pode ser encontrado em algumas sociedades contemporâneas. Ele reflete a forma como as normas sociais e os preconceitos de género moldaram as expectativas e relações familiares. Hoje, muitas sociedades estão questionando e reavaliando essas tradições, promovendo mais igualdade e escolhas mais equilibradas no casamento e na família. A mulher só ganhava o devido estatuto quando desse à luz um descendente masculino. Em muitas sociedades patriarcais antigas, o nascimento de um "filho homem" era crucial para garantir a continuidade da linha familiar, e para assegurar a herança e o estatuto social da família. Essa prática refletia a crença de que os homens eram os principais herdeiros e responsáveis pela perpetuação do nome e da riqueza familiar. Como resultado, as mulheres eram frequentemente valorizadas principalmente por sua capacidade de gerar filhos homens, o que podia impactar profundamente o seu prestígio e papel social. Embora essas práticas tenham sido desafiadas e mudado ao longo do tempo, o legado dessas normas pode ainda influenciar algumas perceções e expectativas sobre o papel das mulheres na sociedade moderna.

Convém recordar que sociedades matrilineares não são a mesma coisa que sociedades matriarcais, 
embora ambos os termos se relacionem com a estrutura e organização das sociedades. Nas sociedades matrilineares a descendência e a herança são transmitidas através da linha materna. Isso significa que a linhagem e a propriedade são passadas de mãe para filho(a). Em uma sociedade matrilinear, o estatuto e a identidade de uma pessoa são determinados pela família da mãe, mas isso não necessariamente implica que as mulheres detenham o poder político ou social predominante. Estas são as sociedades matriarcais. São aquelas em que as mulheres exercem a autoridade e o poder dominante nas esferas política, social e/ou económica. Nesses sistemas, as mulheres ocupam posições de liderança e têm um papel central na tomada de decisões. Portanto, enquanto uma sociedade matrilinear se concentra na transmissão de identidade e propriedade através da linha materna, uma sociedade matriarcal se caracteriza pela liderança e influência predominantes das mulheres. 

No entanto, famílias matriarcais é possível que existam, mas sociedades verdadeiramente matriarcais não parece que tenham existido. O conceito de sociedades verdadeiramente matriarcais é amplamente debatido. Existem algumas evidências de estruturas sociais onde as mulheres têm um papel proeminente e significativo, como em algumas comunidades indígenas ou em sociedades matrilineares, mas um sistema matriarcal completo, onde as mulheres exercem o poder predominante em todos os aspetos da vida social e política, é raro e, até agora, não foi amplamente documentado em termos históricos ou antropológicos.

Famílias matriarcais, onde a mulher tem um papel central na gestão e organização do lar e da descendência, podem existir, mas essas estruturas muitas vezes coexistem com sistemas sociais mais amplos onde o poder pode ser mais equilibrado ou predominantemente masculino. A ausência de sociedades matriarcais amplamente reconhecidas não nega a importância e a influência das mulheres em várias culturas, mas destaca a complexidade dos sistemas sociais e das dinâmicas de poder. E também sociedades matrilineares são mais raras do que as patrilineares. A maioria das sociedades ao longo da história tem adotado sistemas patrilineares, onde a linhagem e a herança são transmitidas através da linha paterna. Isso reflete uma tendência histórica mais ampla de estruturas patriarcais que privilegiam a linha masculina na sucessão e na transmissão de propriedades e de estatuto.

Sociedades matrilineares, onde a descendência e a herança são passadas através da linha materna, são menos comuns, mas não são inexistentes. Exemplos históricos e contemporâneos incluem algumas comunidades indígenas e sociedades de diferentes partes do mundo, como os Minangkabau da Indonésia e certos grupos na Índia e na Melanésia. Nessas sociedades, o estatuto e a propriedade passam através das mulheres, embora isso não implique necessariamente um sistema matriarcal ou que as mulheres exerçam controlo total em todas as esferas da vida social e política.

A prevalência de sistemas patrilineares pode estar relacionada a fatores históricos, culturais e económicos que moldaram a organização social ao longo dos milénios. Os cientistas sabem que é o instinto biológico que unifica as famílias, mas nos antigos era a crença religiosa dos seus antepassados mortos. A ideia de que o instinto biológico ou a crença religiosa desempenha um papel na formação e na coesão das famílias é, contudo, uma questão complexa. Do ponto de vista da biologia, o instinto de cuidar e proteger a prole é uma característica comum em muitas espécies, incluindo os seres humanos. Esse instinto pode influenciar a formação de laços familiares e a estrutura social, pois as pessoas tendem a formar e manter unidades familiares para garantir a sobrevivência e o bem-estar de seus descendentes.

Em muitas sociedades antigas, a crença na influência de ancestrais e de seres sobrenaturais era fundamental para a coesão familiar e social. As tradições e rituais relacionados aos antepassados frequentemente reforçavam laços familiares e sociais, criando um sentido de continuidade e pertença. Essas crenças ajudavam a estabelecer normas e práticas que unificavam os grupos e promoviam a coesão social. Portanto, enquanto os instintos biológicos e as necessidades práticas desempenham um papel significativo na formação das famílias, as crenças culturais e religiosas também desempenham uma função crucial na construção e manutenção dessas unidades sociais, especialmente em contextos históricos e em diversas culturas. Ambos os fatores — biológicos e culturais — contribuem para a complexidade das relações familiares e sociais.

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