sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Os amigos de Putin


O procurador federal belga abriu uma investigação para averiguar sobre informações de que uma rede de influência russa terá pagado a eurodeputados para divulgarem a sua propaganda. Os serviços de informação belgas confirmaram a "existência de uma rede de ingerência pró-russa com atividades em vários países europeus", disse o primeiro-ministro da Bélgica, Alexander De Croo, à imprensa. Uma investigação recente conduzida pelos serviços secretos da Chéquia revelou que alguns eurodeputados terão recebido dinheiro de uma rede de influência política apoiada pelo regime de Moscovo para "promover" a sua propaganda no bloco europeu. "Como a Bélgica é a sede das instituições da UE, temos a responsabilidade de defender o direito de todos os cidadãos a um voto livre e seguro", acrescentou o primeiro-ministro.

De Croo disse ter discutido a investigação com a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, e com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e pediu à Eurojust, a agência do bloco para a cooperação em matéria de justiça criminal, para "convocar e discutir este assunto com urgência". As autoridades belgas estão, ainda, a investigar um escândalo de corrupção que envolve eurodeputados e outros funcionários do Parlamento, acusados de receberem dinheiro em troca de exercerem a sua influência política a favor de funcionários do Qatar, Marrocos e Mauritânia (caso que eclodiu no final de 2022).

Robert Steuckers, um teórico belga conhecido por suas ideias geopolíticas e influências na Nova Direita Europeia, argumenta que a Rússia está disposta a ajudar a Europa a se libertar da influência americana a que chama "americanização". Segundo Steuckers, a Rússia oferece uma alternativa ao modelo liberal ocidental, que ele e outros críticos veem como dominado pela hegemonia cultural, económica e militar dos Estados Unidos. Steuckers e seus seguidores defendem que a Europa deveria se reorientar geopoliticamente em direção à Rússia, aproveitando a afinidade cultural e histórica entre os dois para construir um bloco euroasiático independente. Este bloco seria caracterizado por: Fortalecimento dos Estados-Nação europeus e a preservação de suas identidades culturais e tradições históricas; Criação de um mundo multipolar onde diferentes civilizações e blocos geopolíticos coexistem e colaboram, em oposição à unipolaridade dominada pelos Estados Unidos; Oposição ao que é percebido como a homogeneização cultural e política imposta pela globalização ocidental, que eles associam à perda de identidade nacional e autonomia política; Promoção de valores tradicionais e conservadores, muitas vezes enraizados na herança cristã comum de muitas nações europeias e da Rússia.



Steuckers sugere que a Rússia, sob a liderança de Vladimir Putin, se posiciona como uma defensora desses princípios, oferecendo um modelo alternativo ao neoliberalismo ocidental. Ele acredita que a cooperação entre a Europa e a Rússia poderia permitir que a Europa recupere sua autonomia e se distancie da influência americana. Contudo, a visão de Steuckers enfrenta obstáculos significativos, incluindo as tensões políticas e económicas entre a União Europeia e a Rússia, as diferenças internas dentro da Europa sobre a direção geopolítica e os receios sobre as políticas autoritárias do governo russo. A complexidade dessas relações faz com que a ideia de uma aliança estreita entre a Europa e a Rússia, promovida por Steuckers, seja um desafio de grande magnitude.

Viktor Orbán, o primeiro-ministro da Hungria, tem de facto tentado promover uma política externa que se alinha parcialmente com as ideias de uma cooperação mais estreita entre a Europa e a Rússia. Orbán é conhecido por suas críticas à União Europeia e aos Estados Unidos, bem como por sua defesa de uma política de "soberania nacional" e "democracia iliberal". Orbán tem buscado fortalecer os laços com a Rússia, especialmente em termos de cooperação energética. Um exemplo notável é o acordo com a Rússia para a expansão da central nuclear de Paks, financiada por um empréstimo russo. Esse projeto tem sido uma peça central na estratégia de Orbán para reduzir a dependência energética da Hungria em relação à Europa Ocidental.

Orbán frequentemente critica a União Europeia por sua política de imigração, seu liberalismo económico e cultural, e sua interferência na soberania nacional dos Estados membros. Ele apresenta a Hungria como um bastião de valores tradicionais e cristãos, em oposição ao que ele vê como uma agenda progressista da UE. Embora a Hungria seja membro da UE e da OTAN, Orbán tem adotado uma política de equilíbrio, tentando manter boas relações com potências não ocidentais, como a Rússia e a China. Isso inclui a participação em iniciativas como a Iniciativa dos Três Mares, que busca fortalecer a cooperação regional na Europa Central e Oriental, mas também abrir portas para investimentos e parcerias fora do bloco ocidental tradicional.

A retórica de Orbán frequentemente enfatiza a defesa da soberania nacional e a preservação da identidade cultural húngara, posicionando-se contra o que ele vê como a imposição de valores liberais ocidentais pela UE e pelos EUA. No entanto, a estratégia de Orbán tem gerado controvérsias e tensões dentro da Hungria e na arena internacional. Muitos críticos veem suas políticas como autoritárias e acusam seu governo de minar a democracia e o estado de direito na Hungria. Além disso, a aproximação com a Rússia é vista com ceticismo por muitos na Europa, especialmente à luz das tensões geopolíticas entre a UE e a Rússia, exacerbadas por questões como a anexação da Crimeia e o conflito na Ucrânia. Assim, enquanto Orbán tenta promover uma política externa que desafia a hegemonia ocidental, e busca uma maior independência para a Hungria, ele enfrenta um equilíbrio delicado e uma resistência considerável tanto interna como externamente.

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