quarta-feira, 14 de maio de 2025

Ética


Para Aristóteles, a virtude não é algo do puramente teórico, mas da prática vivida que resulta da ação que se adapta às circunstâncias concretas da vida. A virtude - phronesis (prudência) - é uma das mais altas formas de sabedoria prática e é fundamental para a justiça e o equilíbrio moral. Ela nos permite tomar decisões sábias e apropriadas, ponderando não apenas os bons objetivos, mas também as condições reais em que vivemos.

Phronesis - sabedoria na ação - Aristóteles distingue entre saber o que é bom (teoria ética) e agir de maneira boa (prática). Enquanto os filósofos podem discorrer sobre a justiça, o bom e o justo, o verdadeiro desafio é agir de forma justa em circunstâncias variadas. Phronesis - no caso da bonomia ingénua, das boas intenções - diz que é necessário questionar: quais são as consequências dessa bondade sem limites? A verdadeira virtude não está em ser bonzinho sem mais nem menos, mas sim em encontrar o equilíbrio entre ser compassivo e entender os efeitos potencialmente desastrosos de uma ação sem reflexão.

Aristóteles acreditava que a virtude verdadeira reside no meio termo entre os extremos. A excessiva compaixão pode transformar-se em insensatez, da mesma forma que a falta de compaixão pode cair no desprezo cruel. A prudência é a chave para encontrar um ponto de equilíbrio entre a ajuda genuína e o respeito pela ordem natural e pela justiça. No contexto dos movimentos woke, a preocupação para não ofender ninguém até ao limie levou à irracionalidade sem limites. Phronesis nos diria que, embora seja importante ser respeitador e inclusivo, também é preciso ter sensatez e criterioso discernimento sobre o que está realmente em jogo.

As consequências da falta de Phronesis - acção sem prudência, sem a devida reflexão sobre as consequências práticas - pode levar ao desastre. A modernidade woke perdeu a prudência ao levar a luta ao extremo em nome da compaixão. Enquanto intenção, sendo boa, a falta de reflexão crítica sobre as consequências práticas levou à criação de um caos normativo. A moralidade exige contexto com a realidade. Virtude em contexto leva à solidariedade e justiça. Não podemos simplesmente ceder à bondade automática sem uma avaliação cuidadosa dos efeitos no longo prazo.

A moral de Kant reserva-nos algumas surpresas com o Imperativo Categórico e a VerdadeKant, com o seu Imperativo Categórico diz-nos que devemos agir de acordo com as regras que podem ser universalizadas. Isso implica dizer sempre a verdade, sem exceção, porque mentir contradiz o próprio princípio de universalidade da moralidade. Ou seja, se todos mentissem em situações semelhantes, isso destruiria a confiança, tornando a sociedade impossível. No entanto, a aplicabilidade rigorosa dessa regra entra em contradição com a nossa obrigação moral de proteger as vidas. Por essa ordem de ideias, no caso de eu saber onde está escondida uma pessoa que um assassino quer matar, eu não lhe podia mentir se ele me perguntasse. Ora, eu não devia fazer isso. Devia proteger uma vida.

O dever de ser honesto e verdadeiro (segundo o imperativo categórico) colide com o dever de proteger a vida humana e impedir um mal maior. Aqui, Kant parece ter tropeçado nas próprias pedrinhas que vai colocando no seu caminho filosófico da ética. O seu sistema moral não oferece uma solução clara para dilemas como esse, onde os princípios universais colidem com as consequências imediatas de uma ação. Para Kant, os princípios morais abstratos, e a obediência à regra moral desses princípios, são sempre mais importantes do que as consequências. Mas a obediência a essa regra é impraticável porque é perigosa em casos de vidas em risco iminente. 

Kant, em nome da moral, é absurdamente inflexível ao não atender às más consequências dos atos como quando deles resultam a perda de uma vida de forma fútil. Isso significa que, no seu sistema, não há exceção. Você não deve mentir porque vai comprometer a moralidade universal que deve prevalecer em todas as situações? A rigidez da moralidade de Kant entra em choque com a realidade e a necessidade prática da vida. John Stuart Mill é lúcido nessa matéria. Kant perdeu-se no seu caminho ao não ver que certas exceções podem ser moralmente justificáveis quando o objetivo é evitar o mal maior. Mentir aos terroristas para salvar vidas, por exemplo, é de uma legitimidade moral a qualquer prova. Ainda que viole uma regra universal. Mill e outros utilitaristas dizem que, para avaliar a moralidade de uma ação, devemos considerar as consequências. O bem maior, como salvar vidas, justifica uma mentira, porque daí resulta um benefício maior do que o mero seguimento de uma ideia abstrata.

Depois de termos entendido o logro de Kant, voltemos a Aristóteles. A ética da virtude é centrada no desenvolvimento do caráter moral ao longo da vida. Em vez de seguir regras rígidas ou calcular consequências, a ética da virtude ensina que a moralidade deve ser cultivada por meio de hábitos, focando a ação de acordo com a virtude em situações específicas. Sabedoria prática é melhor do que sabedoria teórica. Que é a capacidade de discernir a melhor ação em circunstâncias concretas. Não se trata apenas de seguir regras, mas de agir sabiamente e em harmonia com os valores humanos. O moralmente correto depende do contexto, da pessoa e das circunstâncias. No caso da mentira, a ética da virtude permite a mentira para salvar vidas. É a virtude da coragem para proteger vítima inocentes. É a prudência, que serve para discernir a melhor ação num determinado contexto.

Entretanto surgiram William James e John Dewey com o seu Pragmatismo. É uma corrente filosófica que também defende que a verdade e a moralidade devem ser avaliadas pelas consequências práticas das ações e das ideias. Ou seja, o que importa não é tanto a teoria ou a regra em si, mas os resultados das melhores práticas na vida real. No pragmatismo, a moralidade não é estática, mas um processo de adaptação contínua, sempre em busca de soluções eficazes para os problemas humanos. Em relação à mentira para salvar vidas, um pragmatista avaliaria a situação em termos de qual ação gera mais benefícios concretos, considerando as circunstâncias específicas. Há, contudo, uma crítica que tem sido feita ao Pragmatismo: o excesso de pragmatismo, por vezes, torna-se relativista. Que significa que em algumas situações o pragmatismo tem em vista apenas o princípio da eficácia. 


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