O que fazer com estes partidos populistas e nacionalistas? A vaga de extrema-direita não dá sinais de regredir e não há uma fórmula bem-sucedida, pelo menos até agora, para a travar. Muitos partidos de centro-direita tentaram seguir a via da "imitação" de algumas das bandeiras da extrema-direita e, em primeiro lugar, da bandeira contra a imigração. Foi assim em França ou, em parte, na Alemanha e na Áustria. O resultado não tem sido o de enfraquecer esses partidos, mas antes fortalecê-los, ao "normalizar" o seu discurso.
Em países como a Alemanha ou a França, a fórmula do "cordão sanitário" permite conclusões diversas. Na Alemanha, que não pode seguir outro caminho em face do seu passado, a AfD, que nasceu como um partido que se mobilizava apenas contra o euro, é hoje a segunda força política no Bundestag, com um discurso extremista, xenófobo, putinista e trumpista. Mesmo assim, a sua força eleitoral ainda vem significativamente dos antigos Lander da Alemanha de Leste. Na França, o sistema maioritário a duas voltas tem permitido manter a União Nacional de Marine Le Pen fora do Governo, mas não a impediu de se transformar no maior partido francês. A estratégia de Le Pen não foi a da radicalização, como a AfD, mas a da "normalização". Menos antieuropeísmo, mais "condições de vida", o mesmo discurso contra os imigrantes ilegais, sobretudo de origem islâmica.
A Áustria recebeu, proporcionalmente à sua população, mais refugiados sírios ou afegãos do que a própria Alemanha de Merkel ou a Suécia. Mas, tal como acontece, por exemplo, no Reino Unido, os apoiantes do partido de extrema-direita concentram-se mais nas regiões da província onde a imigração é menor e perdem em Viena, onde as populações migrantes se concentram. Viena continua a ser social-democracia. Desta vez, a resposta à vitória do partido de Herbert Kickl foi uma coligação entre os partidos do arco democrático, incluindo o centro-direita e o centro-esquerda. Na Suécia, Noruega e Finlândia, houve ou há governos de centro-direita que aceitam ou aceitaram o apoio parlamentar da extrema-direita. É o caso do Governo de Estocolmo, cujo primeiro-ministro, Ulf Kristersson, líder do Partido Moderado, que ficou em terceiro lugar nas últimas eleições, com os sociais-democratas em primeiro e o Partido dos Suecos, de direita nacionalista, em segundo, mas que conseguiu negociar com este último o seu apoio parlamentar a um Governo minoritário. Nos Países Baixos, o partido populista de Geert Wilders, profundamente xenófobo, venceu as últimas eleições, mas abdicou de liderar um Governo de coligação com outros partidos de direita e centro-direita a favor de um primeiro-ministro tecnocrata.
A queda do Muro de Berlim trouxe a promessa de um mundo racional guiado por consensos democráticos. No entanto, esse "fim da história" falhou em oferecer sentido, identidade ou transcendência. O neoliberalismo, ao reduzir o cidadão a consumidor, deixou um vazio que agora é ocupado por narrativas afetivas e simbólicas. Em Portugal, André Ventura, preenche esse espaço não com soluções, mas com mitos. O ressentimento é o combustível político do Chega que o faz crescer entre gente com raiva da globalização, a causa da sua decadência social por não se reconhecerem na linguagem da inclusão. Estão ressentidos com o seu país que consentiu que as elites lhes tivessem roubado estatuto em prol de minorias estranhas. Ventura não oferece um futuro melhor: oferece vingança simbólica. A sua força vem do ressentimento, não da esperança.
A política liberal e social-democrata trabalham com argumentos, compromissos, reformas. Ventura trabalha com espetáculo. Cada intervenção é um ato performativo, cada comício uma peça de teatro moral. O adversário não é um outro com quem se debate, mas um inimigo a abater. A sua figura é sempre central, carismática, muitas vezes messiânica.
A desconfiança generalizada nas instituições alimenta o discurso de Ventura. Ele apresenta-se como perseguido pelas elites, como vítima do sistema. A sua palavra não é apenas política: é performativa, purificadora. Onde há cinismo, ele oferece moralismo. Onde há complexidade, ele oferece dicotomias. O Chega torna-se uma seita em torno do seu corpo e da sua palavra. A democracia é esvaziada do seu conteúdo deliberativo e substituída por rituais de identificação e exclusão.
André Ventura não verbaliza o seu antieuropeísmo com demasiada energia porque sabe até que ponto os portugueses valorizam a pertença à União Europeia. Segue, aliás, a prudência de alguns dos seus amigos europeus, como Marine Le Pen, que adoçaram o seu antieuropeísmo e a sua proximidade política a Trump, mas também a Putin, para se poderem "normalizar" junto dos eleitores – ao lado do "povo" contra as elites; contra os imigrantes que são o novo inimigo "externo"; contra a chamada cultura "woke". Uma espécie de etnonacionalismo cristão, à moda de Victor Orbán, que combate o alegado declínio moral da Europa laica, liberal.
O seu sucesso vem do ressentimento de quem perdeu estatuto social de classe média. Mas também de quem pensa que os imigrantes prejudicam as escolas que os seus filhos frequentam ou o acesso aos serviços públicos de saúde ou até à habitação condigna. De quem é a culpa? Das elites. As camadas mais modestas e menos educadas estão furiosas. Tudo começou com a queda do Muro de Berlim. Basta olhar para o mapa dos resultados – zonas tradicionalmente do PCP e, depois, do PS, todas agora do Chega. Na margem sul, antigo bastião comunista e depois socialista, a única excepção foi Almada. No Alentejo, foi Évora.
O seu sucesso vem do ressentimento de quem perdeu estatuto social de classe média. Mas também de quem pensa que os imigrantes prejudicam as escolas que os seus filhos frequentam ou o acesso aos serviços públicos de saúde ou até à habitação condigna. De quem é a culpa? Das elites. As camadas mais modestas e menos educadas estão furiosas. Tudo começou com a queda do Muro de Berlim. Basta olhar para o mapa dos resultados – zonas tradicionalmente do PCP e, depois, do PS, todas agora do Chega. Na margem sul, antigo bastião comunista e depois socialista, a única excepção foi Almada. No Alentejo, foi Évora.
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